Teoria do véu e dupla consciência
Estamos a poucos dias de mais um ato eleitoral. Mais do que discutir lideranças partidárias, méritos de percurso ou dissecar programas eleitorais, há uma questão que merece ser refletida, em particular no caso da Região Autónoma da Madeira, para as eleições do próximo dia 30 de janeiro. É comumente aceite que a Autonomia Política foi a grande responsável pelo maior período de desenvolvimento da Madeira. Através dela pudemos construir as vias de acesso, os estabelecimentos de ensino e de saúde para dotar a nossa Região de gente mais preparada e com melhor qualidade de vida.
Porém, outra questão se coloca: saber se a velocidade das transformações que tivemos na Madeira, por via deste instrumento, foi a mesma que os decisores políticos nacionais assumiram os problemas das duas Regiões Autónomas desde o 25 de abril.
Na sua obra The Souls of Black Folk, o sociólogo W.E.B du Bois refere que, não obstante terem nascido e sido criados em solo americano, terem sido modelados pelas instituições dos Estados Unidos da América e doutrinados na mesma fé, sendo eles contribuintes ativos para a economia e a cultura do país, os negros dos Estados Unidos da América continuavam a ser vistos como o “outro” perpétuo que embora fossem iguais a tantos americanos caucasianos, eram sempre definidos de fora para dentro: nunca por aquilo que eram, mas sim por aquilo que nunca poderiam ser. Para o efeito, WEB referia que existia uma dupla consciência, por parte destes negros, em que eram norte-americanos na sua essência, mas nunca se sentiram ou foram sequer integrados na sua plenitude. Exista, segundo ele, um véu sobre os negros afro-americanos nascidos nos Estados Unidos que os impediam de ser vistos como eram, legitimando assim a exclusão social.
A referência a esta obra não é inocente. Mais do que se apelar aos méritos e qualidades de Rui Rio e aludir aos deméritos e mentiras, sistemáticas, de António Costa, aquilo que os madeirenses têm de escolher no próximo dia 30 é saber se legitimam, ou não, uma atitude de dupla consciência que o PS lhes tem tentado impor.
Quem acredita que é legítimo uma companhia aérea de bandeira nacional esquecer parte do seu território, abandonando-o, como a TAP faz com o Porto Santo, deve votar no PS. Quem julga legítimo os Estudantes Madeirenses pagarem 500/600/700 euros para virem a casa no Natal, esquecendo ou diminuindo os direitos a uma coesão territorial e social, deve votar no PS. Quem acredita que um instrumento como o CINM deve ser desmantelado, destruindo assim o emprego direto e indireto de 6000 madeirenses, deve votar no PS. E porquê? Porque, tal como no exemplo que acima referi, aceitam que são portugueses como todos os outros, estudando e frequentando as mesmas instituições religiosas, culturais e de ensino superior, mas que por via da sua diferença geográfica não têm direito a ser como são, com as contingências específicas de quem reside, por diversos fatores, num território insular. Aquilo que a Governação Socialista tem feito, em 21 dos últimos 27 anos, é fazer dos madeirenses o “outro” que está sempre a chatear, mas demitindo-se das responsabilidades que também neste território.
Quem considera que todos os exemplos que dei acima são ilegítimos e próprios de quem não tem a equidade e a igualdade como pilares da sua vida, o conselho é simples: no dia 30 de janeiro, pode ajudar a acabar com este conceito de “dupla consciência” de que os portugueses das Autonomias não têm os mesmos direitos que os outros só por serem das ilhas. Como é que o faz? Põe a Madeira Primeiro dando novos horizontes, não só à Madeira, mas também a Portugal. Tudo resto é manter tudo tal como está com véus dúbios e consciências atordoadas de que Portugal é muito mais do que Lisboa.