A memória dos carros de cesto
Lá no alto do Funchal, no Monte, existe um meio de transporte único no país, e mesmo no mundo inteiro! Não é preciso muito para saber do que estou a falar: o carro de cesto.
É um veículo de arrasto, feito de madeira e vime, que desliza pelas ruas íngremes do Funchal. Surgiu no século XIX, como meio de transporte alternativo e rápido que levava pessoas e mercadorias do Monte para a baixa do Funchal. São conduzidos e preservados pelos carreiros do Monte, que vestem calças e camisa branca e usam o típico chapéu de palha com uma fita preta. Não esquecendo, claro, os sapatos com sola de borracha de pneus, para ajudar na travagem. O dom da condução dos carros de cesto é transmitido a outros carreiros e aprendizes, assim perdurando esta tradição secular.
Com isto, toco num tema importante: a memória.
Popularmente, a memória pode ser entendida como a capacidade que as pessoas têm de conservar e relembrar acontecimentos, informações, experiências do passado. Além disso, a memória é uma peça importante para o que se chama de “identidade”, seja individual ou coletiva. Na memória, o passado é constantemente reconstruído e fortificado. Neste sentido, a memória, nomeadamente coletiva, é uma forma de história viva. A memória coletiva vive, sobretudo, na tradição.
A memória alimenta a história, procura salvar o passado, para que seja vivido no presente e no futuro.
Assim, preservar a memória de uma sociedade não significa amarrá-la ao passado e impedir que se desenvolva. Preservar a memória significa conservar os seus pilares... os seus valores de modo a não perder conhecimentos e identidades.
A memória dos madeirenses reside nos carreiros do Monte e nos carros de cesto. A memória coletiva madeirense reconstrói o passado e permite vivências presentes ao sabor do turismo neste século.
Contudo, não nos esqueçamos que devemos olhar para esta tradição como parte da nossa identidade. Da identidade portuguesa... da identidade madeirense. A meu ver, não devemos olhar para isto, apenas como carros de cesto ou como algo meramente turístico. Temos sim de olhar para esta tradição secular e valorizá-la pelo que ela é. Pela sua história, pela sua capacidade de unir pessoas, pela lembrança do que foi e pelo que é agora. Senti-la como parte de nós. Olhar para os carros de cesto e para os seus carreiros e vê-los como uma parte da cultura madeirense... como parte do património cultural da nossa pérola do Atlântico… da nossa Madeira.