Madeira abre amanhã primeira Unidade para doentes de Alzheimer da Região
A Unidade de Alzheimer ‘Dragoeiro’ é um projecto desenvolvido pelo Centro Social e Paroquial de São Bento da Ribeira Brava, em parceira com o Governo Regional. Demorou sete anos a tornar-se realidade, custou quase um milhão de euros – dos quais 800 mil foram financiados com fundo europeus – e tem capacidade para acolher 63 utentes (18 em internamento e 45 no centro de dia) de toda ilha. A equipa de reportagem do DIÁRIO foi visitá-la.
A nova unidade fica localizada no centro da vila da Ribeira Brava, num edifício requalificado onde antigamente funcionava a fábrica da Panriva, da qual hoje resta apenas chaminé, reconstruída para reavivar a memória de outros tempos.
À chegada, somos agradavelmente surpreendidos por uma equipa atarefada e sorridente, mas só depois de passar pelo pórtico de desinfecção e medição de temperatura. Está tudo pensado até ao mínimo detalhe para assegurar as medidas de higiene e segurança no contexto da pandemia de covid-19, mas sobretudo para transmitir conforto e bem-estar aos utentes.
O piso térreo, onde funcionará o centro de dia, é um espaço aberto – com cores neutras, “que apelam à calma também e à tranquilidade” – e onde os utentes podem circular à vontade.
A nível arquitectónico e de manuseamento de materiais foi tudo pensado para doentes de Alzheimer, no sentido de eliminar as barreiras físicas e facilitar estas pessoas
Bina Pereira, directora técnica da Unidade Dragoeiro
Nas casas de banho, as torneiras
automáticas termostáticas permitem regular a temperatura da água para prevenir
queimaduras.
Para evitar eventuais fugas do doente de Alzheimer, todas as portas que dão para a rua estão protegidas com códigos alfanuméricos.
É uma necessidade que nós já sentíamos, porque os doentes de Alzheimer nem sempre têm noção de onde estão e procuram muitas saídas para uma necessidade que sintam ou para realizar as tarefas que tinham, como ir trabalhar ou ir ao supermercado
Bina Pereira
A variedade de actividades e de terapias que são disponibilizadas aos doentes de Alzheimer consiste noutro aspecto diferenciador desta unidade.
Felizmente, o centro consegue adquirir alguns equipamentos diferentes e inovadores, que ajudam-nos a conseguir estimular os utentes de diferentes maneiras
Madalena Abreu, psicóloga
Há cerca de 40 jogos especificamente desenhados para estimular diferentes funções cognitivas (memória, linguagem, atenção, etc.)
Tentamos adaptar as actividades às necessidades de cada utente (...) Estes jogos são fruto de algumas experiências profissionais anteriores com utentes e também de algum estudo sobre a doença de Alzheimer
Diana Faria, gerontóloga
São sempre materiais que nós tentamos adaptar à realidade do dia-a-dia dos utentes. Nós sabemos que eles se identificam mais facilmente com todas as tarefas que possam assimilar aquilo que foi a vida deles. Não são trabalhos infantilizados e desenquadrados (...) Os pratos e as imagens, por exemplo, servem para o treino das actividades da vida diária, que as coisas básicas que nós queremos que fiquem preservadas Madalena Abreu
Outra novidade é a mesa interactiva, fruto de uma parceria com a Universidade da Madeira, através do MITI - Madeira Interactive Technologies Institute.
Nós adquirimos a mesa e eles vão disponibilizar-nos software que foi desenvolvido e trabalhado pelas suas equipas, com o intuito de promover a estimulação cognitiva e até a reabilitação motora (...) A mesa tem um ecrã gigante táctil e permite a calibração de objectos que podem ser usados em vários jogos interactivos, trabalhando aspectos como o espírito competitivo ou o espírito de equipa
Madalena Abreu
Numa sala contígua é-nos mostrada
uma mesa multifunções.
Serve para trabalhar a coordenação motora, a força
muscular e a motricidade fina
Sara Teixeira, psicomotricista
No centro de dia há também um espaço reservado para o descanso, onde os utentes podem assistir televisão ou simplesmente recostar-se nas poltronas.
A pequena zona de leitura resultou da doação de uma colecção privada, por parte de um antigo colaborador, entretanto já falecido.
Não falta também um espaço de oração.
O edifício conta ainda com um auditório, que permitirá a realização de eventos promovidos pelo Centro Social e Paroquial de São Bento, nomeadamente de formações e acções de sensibilização sobre a doença de Alzheimer.
No piso superior, onde funciona o lar, existem 10 quartos (8 duplos e dois individuais).
O andar possui cinco casas de banho que são partilhadas (um WC por cada dois quartos).
Há também uma sala de pequenos-almoços para os utentes em regime de internamento.
O centro de enfermagem – localizado no centro do andar, de modo a ter fácil visibilidade para todos os quartos – contará com cinco enfermeiros que darão assistência a toda a unidade.
O edifício possui ainda um vasto espaço exterior.
O jardim aromático evoca os aromas familiares das ervas de chá e tempero. Outra forma de estimular a memória.
Fizemos algumas pesquisas e sabemos que o aroma pode também acalmar e trazer sensações de bem-estar
Bina Pereira
Este jardim tem ligação ao segundo piso através de uma rampa, que visa incentivar a actividade física dos utentes que ainda conservem a sua mobilidade.
Aqui existem canteiros com árvores de fruta e vegetais, que pretendem preservar a ligação à terra partilhada pelos utentes com uma vivência mais rural, além de servirem para consumo interno.
Há também uma zona de alpendre, com mesas e uma casa de banho exterior, que permitirá receber a visita de familiares, sem comprometer a segurança no actual contexto pandémico.
O Centro de Dia funcionará em horário alargado – de segunda a sábado, entre as 8 e as 21 horas – a pensar nas famílias.
Vamos ter um horário alargado, que é completamente diferente das outras valências da Segurança Social, em que uma das maiores limitações era o facto de os centros de dia abrirem às nove fecharem às cinco e meia (normalmente o horário em que as pessoas entram e saem do trabalho). Iremos ter uma abertura muito mais cedo e um fecho mais tardio, que será depois adaptado consoante as necessidade da família. O utente poderá jantar cá, tomar o seu duche, mudar de roupa e vai pronto para casa
Bina Pereira
O objectivo é claro: ajudar a que os doentes permaneçam cada vez mais no seu domicílio, dando à família a oportunidade de manter uma vida profissional e social, sabendo que os seus entes queridos estão bem cuidados.
Em Setembro assinala-se o Mês Mundial da Pessoa com Doença de Alzheimer, que é a forma mais comum de demência, representando entre 50 - 70% dos casos. A demência pode acontecer a qualquer um, mas é mais comum após os 65 anos de idade. Estima-se que existam 2 a 3 mil pessoas com demência na Madeira, mas nem todos os casos estão diagnosticados.
Só no Lar de São Bento – uma das várias respostas sociais da IPSS homónima – existem presentemente 12 utentes com diagnóstico de doença de Alzheimer, com idades compreendidas entre os 73 e 95 anos.
Em 2018 o Instituto de Segurança Social da Madeira reconhecia que “as respostas actuais ao nível de lares estão mais vocacionadas para uma resposta generalista”. Algo que não correspondia às reais necessidades daqueles que se vêem obrigados a viver e conviver com a doença de Alzheimer.
Rapidamente percebi que era um tipo de patologia que exigia uma resposta e uma intervenção totalmente diferente. Não é criar espaços e segregar pessoas. É permitir-lhes e proporcionar-lhe um certo bem-estar (…) Foi daí que surgiu esta ideia de que o ideal seria a Região criar unidades específicas para este tipo de população
Maria Carlos Vilarim, mentora do projecto
Um “sonho” que agora vê tornado realidade.
A Unidade de Alzheimer Dragoeiro será inaugurada amanhã, dia 14 de Setembro, numa cerimónia que contará com a presença do presidente do Governo Regional, Miguel Albuquerque, e da secretária regional de Inclusão Social e Cidadania, Augusta Aguiar.
[O Centro Social e Paroquial de São Bento] tem sido uma instituição parceira do Governo Regional há largos anos, sempre disponível para ajudar e inovar nas respostas sociais prestadas. Exemplo deste dinamismo é o importante projecto que a instituição desenvolveu, em parceira com o Governo Regional, e que agora se materializa, de criação de uma Unidade de Alzheimer da Região, o ‘Dragoeiro’, uma estrutura inovadora, de apoio à população com esta doença degenerativa.O Governo Regional tem como um dos seus objectivos estratégicos a valorização e protecção da população idosa, em situação de maior vulnerabilidade, pelo que a melhoria da qualidade de vida das pessoas com patologia na área da demência, incluindo as pessoas com doença de Alzheimer, faz parte das prioridades do Governo Regional, que assegurará sempre os apoios necessários às instituições que desenvolvem este trabalho tão meritório. A nova unidade, que agora entra em funcionamento, tem todas as condições para trazer maior bem-estar aos utentes e às suas famílias. Augusta Aguiar