Resposta à variante Delta pode ser vacinação de crianças, mas reguladores aguardam dados
A vacinação de menores de 12 anos contra a covid-19 é considerada determinante para reduzir contágios e combater a variante Delta, mas os reguladores continuam à espera dos resultados de ensaios clínicos para tomarem uma decisão.
Para já, a Agência Europeia do Medicamento (EMA, na sigla em inglês) confirmou à Lusa que ainda não recebeu nenhum pedido das empresas farmacêuticas para aprovar a vacinação de crianças com menos de 12 anos.
"Até ao momento, não foi apresentada à EMA nenhuma solicitação de prorrogação da indicação para o uso de uma vacina covid-19 em menores de 12 anos", disse fonte do regulador europeu, ao adiantar que esta avaliação é sempre realizada de acordo com um plano de investigação pediátrica.
Os ensaios clínicos pediátricos são geralmente estruturados para que uma vacina seja estudada primeiro em adolescentes e, progressivamente, em crianças menores de 12 anos.
Assim que os dados de uma faixa etária mostram que a vacina é segura e que confere uma boa resposta imunitária, as farmacêuticas podem enviar os dados à EMA para a sua aprovação nessa faixa etária, adiantou a mesma fonte.
As duas vacinas de tecnologia RNA mensageiro (mRNA) aprovadas pela EMA e que estão a ser administradas na União Europeia (UE) podem ser utilizadas em crianças, mas, para já, apenas a partir dos 12 anos.
Em 28 de maio de 2021, a vacina do consórcio Pfizer/BioNTech foi aprovada para utilização em menores dos 12 aos 15 anos na UE e, em 27 de julho, a da farmacêutica Moderna recebeu a `luz verde´ da EMA para imunização de adolescentes entre os 12 e os 17 anos.
"Vamos continuar a acompanhar esta matéria e tentar compreender se estas vacinas podem ser usadas em crianças com menos de 12 anos", disse na quinta-feira o responsável pela estratégia de vacinação da EMA, Marco Cavaleri, admitindo que os primeiros dados podem chegar às mãos do regulador durante o outono.
O especialista da EMA alertou ainda que nos Estado Unidos, com a disseminação da variante Delta, verifica-se um "grande aumento de hospitalizações que afetam, maioritariamente, adolescentes que não estão vacinados", uma preocupação que a Academia Americana de Pediatras (AAP, na sigla em inglês) também partilha.
A organização, que junta cerca de 67 mil pediatras, escreveu em agosto ao regulador norte-americano (FDA) a pedir para que as "vacinas covid-19 para crianças possam ser autorizadas o mais rapidamente possível, para que as crianças de todas as idades possam beneficiar delas".
A propagação da variante Delta do coronavírus SARS-CoV-2, que é também a predominante nos Estados Unidos, está na base do repto lançado por esta associação de pediatria à FDA, tendo em conta que, segundo os seus dados, em agosto verificou-se o "maior aumento percentual por semana em casos pediátricos de covid-19 desde o início da pandemia".
"A variante Delta criou um risco novo e urgente para crianças e adolescentes em todo o país, assim como também para adultos não vacinados", alertou a associação, ao avançar que, desde o início da pandemia, as crianças representaram 14,3% do total de casos acumulados de infeção pelo novo coronavírus, percentagem que, recentemente, aumentou para 19% nos Estados Unidos.
Em Portugal, dados recentes da Direção-Geral da Saúde indicam que a incidência de novas infeções nos jovens por 100 mil habitantes acumulada a 14 dias está a baixar, apesar de continuar a apresentar valores bastante elevados.
Desde o início da pandemia, registaram-se cinco óbitos de crianças e jovens até aos 19 anos e um total de 117.281 infeções, o que representa cerca de 11% do total de mais de um milhão de casos positivos notificados em todo o país.
Nas últimas semanas, os menores têm sido o grande alvo da vacinação em Portugal, com mais de meio milhão de jovens entre os 12 e os 17 anos já com a primeira dose tomada -- o que representa mais de 80% desta faixa -- e quase 160 mil com a imunização completa (25%).
À questão se as crianças devem ser vacinadas contra o SARS-CoV-2, o virologista José Miguel Pereira responde que os benefícios dessa imunização superam os riscos, tendo em conta que "uma criança vacinada é menos uma que fica doente e é também uma fonte de contágio de menor importância".
O investigador da Unidade da Interação Hospedeiro-Patogeno do Instituto de Investigação de Medicamentos (iMed.ULisboa) da Universidade de Lisboa disse à Lusa que se as crianças forem vacinadas, a "infeção por SARS-CoV-2 será gradualmente menos transmitida com todos os benefícios que daí se podem antecipar".
De acordo com o especialista em virologia, apesar de uma criança infetada correr um menor risco de contrair uma forma grave de covid-19 do que um adulto, a vacinação permite que seja "menos capaz de transmitir a infeção" a terceiros, uma vez que a sua carga viral, se existir, será mais reduzida do que se não tivesse imunizada.
Além disso, devido aos seus hábitos e comportamentos, as "crianças da faixa etária de menos de 12 anos são sempre propensas a transmitirem infeções que tenham como fonte de contágio as secreções respiratórias", principalmente, em dois ambientes: em casa e na escola, alertou José Miguel Pereira.
"Em qualquer dos casos, a situação é mais importante quanto menos vacinados houver em cada um desses ambientes", alertou o virologista.
A covid-19 provocou pelo menos 4.602.565 mortes em todo o mundo, entre mais de 223,06 milhões de infeções pelo novo coronavírus registadas desde o início da pandemia, segundo o mais recente balanço da agência France-Presse.
Em Portugal, desde março de 2020, morreram 17.843 pessoas e foram contabilizados 1.053.450 casos de infeção confirmados, segundo dados da Direção-Geral da Saúde.
A doença respiratória é provocada pelo coronavírus SARS-CoV-2, detetado no final de 2019 em Wuhan, cidade do centro da China, e atualmente com variantes identificadas em países como o Reino Unido, Índia, África do Sul, Brasil ou Peru.