A filha da Roseirinha!
É numa rua sem saída, muito silenciosa à noitinha, que fica a casa da Roseirinha.
Os casalinhos de namorados, dentro dos seus carros, aproveitavam aquele local, para com mais ou menos fervor, viverem alguns momentos de amor.
Só que, Roseirinha desconhecia, mas lá veio o dia, (ou noite melhor dizendo) que vê um carro que lhe pareceu cinzento, com duas pessoas lá dentro em” conhecidos” movimentos.
No outro dia, já toda a vizinhança sabia.
Nem a pandemia, retirou à Roseirinha, a mania, de se intrometer na vida alheia e dizia mesmo às amigas que aquele vício já lhe corria nas veias.
À noite, após o jantar e ter visto a telenovela, Roseirinha corria para a janela. Coberta pelos cortinados, passava horas a ver (e a imaginar) o que faziam os namorados.
- Vizinha, se visse o que eu ontem à noite vi…mas eles não eram daqui!
Aquilo é que é viver em pecado, que por Deus sejam perdoados!
Só me lembrei daquela mãe que devia estar em casa, descansada, mal sabendo que a filha andava naquela vida airada.
- Oh, Roseirinha, não faça juízos de valor, se há coisas boas neste mundo, uma delas é o amor, respondeu-lhe a vizinha, que sabia que para a Roseirinha, mulher ajuizada e bela, só a filha dela.
- Acredite, vizinha, estou desejando de chegar à noite, jantar, ver a novela e ir para a janela.
E assim fez Roseirinha, longe, contudo, de prever, o que aquela noite lhe reservava para ver.
Assim que entreabriu os cortinados, já se deparou com um carrinho de namorados.
Na sua vista – nublada – até o carro embalançava. Coisa assim nunca vi, dizia de si para si!
Hoje fico até ao fim aqui, tenho curiosidade de ver se ela é mesmo daqui.
E ali ficou Roseirinha mais de duas horas, com calma, sem pressa, para satisfazer a sua curiosidade perversa.
Até que a porta do carro se abriu e a “namorada” saiu!
Roseirinha só no chão não caiu, quando a filha viu.
Correu desaustinada e na cama deitou-se, dos pés à cabeça abafada.
Quando a filha entrou em casa, fingiu que ressonava.
Daí em diante, porém, passou a ver mais novelas e deixou de ir para a janela.
Entretanto, interrogavam-se as vizinhas, porque nunca mais tinham visto a Roseirinha.
Olha, olha, ela vem ali.
- Roseirinha, que aconteceu consigo? Nunca mais a tínhamos visto.
- Oh, vizinhas, estive a pensar e achei que ir todas as noites para a janela tinha de acabar.
- Fez bem. Até que temos filhas também e nunca se sabe o que para cima da gente vem.
- Pois, pois, vizinhas, só que eu gostaria de conversar, mas agora não vai dar.
E lá fugiu Roseirinha daquela conversa que não lhe convinha.
As vizinhas, que de parvas nada tinham, continuaram a falar, chegando mesmo a murmurar:
- Vizinha, que Deus me perdoe, mas acho que foi a filha que desta vez Roseirinha viu, (talvez a sair do carro) depois de fazer aquilo que ela diz que é pecado.
- A vizinha está certa. Deus não castiga, nem com pau, nem com pedra.
- Ainda assim, foi pena ela a janela ter deixado, quando só se vê e ouve falar em doenças e calamidades, com a Roseirinha, entre mentiras e verdades, sempre ríamos um bocado.
- Não se rale. Aparecerá outra por aí. O que menos falta são “Roseirinhas” por aqui!
Juvenal Pereira