Obrigados a enterrar em terra alheia com dois cemitérios na freguesia
Mais que a falta de transportes públicos, a população do Porto da Cruz queixa-se "da pouca vergonha" de estarem obrigados a sepultar os entes queridos em Água de Pena mesmo com dois cemitérios na freguesia.
Ter dois cemitérios na freguesia e ver-se obrigado a enterrar os entes queridos na localidade mais distante do concelho é triste realidade que as gentes do Porto da Cruz enfrentam. A incongruência é vista como uma “pouca vergonha” para os muitos fregueses que não se conformam com o impensável. A esta contradição junta-se a reduzida oferta de transportes públicos, sobretudo para quem vive nos sítios mais afastados da vila.
Para Isilda Marques a principal problema que urge resolver no Porto da Cruz “é o nosso cemitério. Temos dois cemitérios e mesmo assim temos que ir enterrar para Machico, com a agravante para quem não tem carro, não vai lá mais porque aquilo fica distante”, contesta.
Critica a resolução tardia do problema dos cemitérios, ao apontar que “a cheia (aluvião) já deu há quantos anos e nunca resolveram a questão do cemitério”, critica.
Reclama a reabertura imediata do cemitério junto à igreja, que entende reunir condições para sepultar mais gente da terra.
“O cemitério lá em baixo antigo já se pode enterrar gente, porque já há mais de seis ou sete anos não se enterra lá ninguém. Quanto a mim, isto é, uma pouca vergonha. Com dois cemitérios e não ter um cemitério que enterre o pessoal da freguesia”, contesta.
Enterrar em Água de Pena quem morre no Porto da Cruz é agudizar a dor do luto. “A gente nunca esquece os nossos, mas ficando longe é mais complicado”, admite. Reforça por isso que “o que a gente precisa aqui no nosso Porto da Cruz é um cemitério”, reclama.
Isilda vem da “fazenda” com “umas coisinhas para a deitar na panela”. O que a terra dá “ajuda bastante… e sabe-se o que se está a comer”, reforça. A residir na Achada, apenas questiona as “camionetas” de transportes públicos. “Está mais ou menos. Podia estar melhor, mas para a gente, tá bom”, admite.
Na zona do Larano, António Spínola queixa-se da “idade que está chegando” e da doença no feijão e nas ‘semilhas’. Tanto que “a agricultura está uma miséria”, conclui o homem de 78 anos. “Também trabalhei na construção civil, porque só a fazenda não dava” para o sustento.
Culpa o tempo pela fraca produção agrícola e deixa claro que “não se pode cramar da água”.
Para quem vive nesta zona limite da freguesia, os transportes públicos são escassos.
“Durante o dia é uma miséria de carros. Tenho o passe para a camionete, mas para vir (para casa durante o dia) tenho de saltar lá em baixo na Vila e vir a pé”, denuncia.
Na Maiata de Cima, Manuel diz que está “tudo mal”. E por culpa de “uma camada de loucos e tontos”. Antigo combatente no Ultramar, diz ter integrado a 1ª Companhia que foi formada aqui na ilha, em 1968. O abono que recebia da tropa foi cortado. Mais uma razão para concluir que “isto está tudo lixado”.
“Cortam isto, não se pode criar isto, não se pode fazer isto, não se pode fazer aquilo, o que é que eles querem?”, atira. Até o famoso vinho americano do Porto da Cruz está pela ‘hora da morte’. “O vinho acabou. Há vinho, mas é no supermercado, engarrafado. Quem tinha muitas pipas agora sabe o que é que tem? Litros! E para vender tudo quer é barato. Por isso nada recompensa”, concretiza.
No centro da vila, Martinho Marques, motorista de táxi, considera que o Porto da Cruz “tem o essencial. Tem tudo o que é preciso para quem trabalha. O que não tem é às vezes as consultas médicas”. Esta é a única “praga. O resto está tudo bom”.
Inclusive para o sector do táxi, que classifica de “óptimo” este mês de Agosto. “Agora o resto foi uma praga, é para esquecer”, conclui.