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Governo não pode relaxar na execução, a começar pelas Finanças

Foto MÁRIO CRUZ/LUSA
Foto MÁRIO CRUZ/LUSA

O secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares considera "bastante aceitável" o grau de execução do Orçamento do Estado deste ano, mas adverte que o Governo não pode relaxar, a começar pelo Ministério das Finanças.

Em entrevista à agência Lusa, Duarte Cordeiro afirma que o cumprimento dos compromissos orçamentais de 2021 é essencial para a criação de condições de confiança nas negociações do Orçamento para 2022 com os parceiros parlamentares dos socialistas: PCP, PAN e PEV, entre os quais também inclui o Bloco de Esquerda, e remete para o final de setembro novo balanço sobre a execução orçamental com essas forças políticas.

No início de junho, num discurso que proferiu enquanto líder da Federação da Área Urbana de Lisboa (FAUL) do PS, Duarte Cordeiro alertou para os perigos do "isolacionismo e do facilitismo" em política.

Interrogado se o Governo e o PS correm esses riscos na segunda metade da presente legislatura, o secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares diz esperar que não, mas acrescenta que o seu executivo "não pode relaxar em relação às suas responsabilidades".

"Não podemos relaxar na execução do Orçamento do Estado. Pela parte do Governo, é muito importante a demonstração em relação à concretização dos compromissos que fomos assumindo com os vários partidos no âmbito do Orçamento. Por outro lado, é muito importante -- e eu tenho visto isso da parte dos membros do Governo -- o compromisso e o empenho no que diz respeito ao combate à pandemia, à aplicação de medidas para a rápida recuperação do país ou à motivação do executivo para começar a implementar os projetos no âmbito do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR). O Governo tem de continuar a estar empenhado na concretização destes objetivos. Não podemos relaxar em relação às nossas responsabilidades neste momento", defende.

Para Duarte Cordeiro, ao Governo compete executar o Orçamento, "garantindo o seu cumprimento e a criação de condições de confiança para a negociação do Orçamento do próximo ano".

"É um compromisso não apenas meu [enquanto secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares] mas de todo o Governo, a começar pelo Ministério das Finanças e tocando em todos os ministérios que têm medidas negociadas no âmbito do Orçamento", frisa.

Confrontado com as críticas sobre a evolução da execução orçamental deste ano, Duarte Cordeiro realça, no entanto, que no início de julho foram feitas "reuniões unicamente destinadas a efetuar um balanço sobre a execução do Orçamento relativamente ao primeiro semestre do ano" e sustenta que "a execução é bastante aceitável e melhor do que em anos anteriores".

"Isso permitiu-nos iniciar as conversas com os partidos relativamente ao Orçamento para 2022. No final do mês de setembro, antes da apresentação do Orçamento para 2022, vamos voltar a fazer um novo ponto da situação. Queremos que exista essa confiança para salvaguardar as negociações do Orçamento do próximo ano", refere o membro do Governo.

Ainda sobre as críticas de que o seu executivo é alvo em matéria de execução orçamental, Duarte Cordeiro desdramatiza-as: "Os partidos fazem a sua parte e são exigentes connosco".

"Fazem intervenções relativamente à garantia das medidas negociadas. Muitas vezes as medidas acabam por não ser cumpridas na altura que os partidos esperam, outras vezes não são exatamente como esperam. Mas temos um ano para executar o Orçamento e não é expectável que se execute todo no primeiro semestre. Compete aos partidos manterem esse nível de exigência -- e aceitamos isso com naturalidade", sustenta.

Questionado sobre em que medida os resultados das eleições autárquicas de 26 de setembro vão influenciar as negociações do Orçamento para 2022 com os partidos parceiros do PS no parlamento, sobretudo com o PCP, Duarte Cordeiro separa esses dois planos.

"No passado, já tivemos a circunstância de ter eleições autárquicas e de haver entendimentos políticos no âmbito do Orçamento do Estado. No final de julho, tivemos reuniões com os diferentes partidos e com as deputadas não inscritas [Joacine Katar-Moreira e Cristina Rodrigues] com quem viabilizámos os últimos orçamentos. E nessas reuniões ficaram claros os objetivos e as prioridades que os partidos têm para o Orçamento do Estado para 2022", refere.

Com o PCP, em concreto, Duarte Cordeiro declara que ficaram claros os objetivos dos comunistas: "O que eles entendem que é insuficiente e quais as suas prioridades".

"Esse tema [eleições autárquicas] não foi um elemento considerado. Compete-nos ter em conta aquilo que foi transmitido nessas reuniões por parte desses partidos", advoga o secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares.

Já sobre a possibilidade de a direção do PCP perder condições políticas internas para negociar com o Governo novo Orçamento, designadamente em consequência de um eventual mau resultado nas eleições autárquicas, Duarte Cordeiro repete a tese de que eleições autárquicas e negociações orçamentais "são planos distintos".

"Acho que a avaliação deve ser feita em função dos objetivos que foram alcançados nos orçamentos negociados e aprovados e em função daquilo que foi possível conseguir para o país. Devo dar nota de que os entendimentos que foram possíveis à esquerda e também com o PAN permitiram um conjunto de respostas e de resultados que melhoraram muito a vida dos portugueses", sustenta.

A trabalhar para entendimento também com o Bloco

O secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares afirma que o Governo está a trabalhar para incluir o Bloco de Esquerda na viabilização do Orçamento para 2022, instrumento que considera essencial para a recuperação do país pós-pandemia.

Estas posições foram assumidas por Duarte Cordeiro, depois de questionado se há reais condições políticas para o Bloco de Esquerda voltar a viabilizar uma proposta do Governo de Orçamento do Estado, depois de ter votado contra no ano passado.

"Esperamos que sim. Temos a expectativa de que existem essas condições para um entendimento", declara o membro do executivo.

Neste ponto, o secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares defende que "o país vive um momento de recuperação para o qual é necessário haver um Orçamento que permita a preservação de um conjunto de respostas e, simultaneamente, apostar no investimento público, na retoma e em projetos inscritos no Plano de Recuperação e Resiliência (PRR)".

"Esses projetos devem permitir que o país saia da crise da pandemia mais forte do que estava antes desta crise. Há condições políticas para isso. Esperamos que haja capacidade para nos entendermos. Estamos a trabalhar nesse sentido", assinala.

Questionado sobre o facto de o Bloco de Esquerda, em sucessivas intervenções públicas, se revelar mais contundente do que o PCP nas críticas ao Governo, designadamente em debates parlamentares com a presença do primeiro-ministro, António Costa, Duarte Cordeiro secundariza esses episódios.

"Tivemos reuniões de trabalho com o Bloco de Esquerda que decorreram em clima muito semelhante ao de anos anteriores. Dessas reuniões resultou um conjunto de objetivos e de prioridades. Ficámos de trabalhar sobre elas e voltar a reunir no final deste mês ou início de setembro. A nossa expectativa é continuar este trabalho e procurar alcançar um entendimento", salienta.

Interrogado se PS e o Governo vão pôr "uma pedra" sobre aquilo que aconteceu no ano passado com o Bloco de Esquerda, quando optou pelo voto contra o Orçamento para 2021, Duarte Cordeiro advoga que o seu partido "fez uma avaliação política" dessa decisão do BE de chumbar o Orçamento.

"E o PS continua a fazer essa avaliação. O PS entende que foi fundamental a aprovação do último Orçamento, porque permitiu inscrever um conjunto de medidas que, sem elas, Portugal poderia não estar em condições de combater a crise nos mesmos termos. No entanto, disponibilizámo-nos para conversar e trabalhar com o Bloco de Esquerda, tal como fizemos no passado. O Bloco de Esquerda também demonstrou disponibilidade. Tivemos já reuniões e estamos a trabalhar", afirma.

De acordo com a generalidade das sondagens, apesar de o Bloco de Esquerda ter chumbado o Orçamento para 2021, a relação de forças entre este partido e o PS praticamente não se alterou ao longo do último ano.

Duarte Cordeiro apresenta uma explicação para esse indicador resultante da generalidade dos estudos de opinião.

"Não houve nenhuma crise porque houve partidos que aprovaram o Orçamento para 2021. Portanto, felizmente, essa avaliação é feita num contexto em que foi possível o Governo adotar um conjunto de medidas fundamentais, como o lay-off a 100%, que preservou o emprego e os rendimentos, o aumento do salário mínimo e a extensão de um conjunto de medidas de apoios sociais", sustenta.

Interrogado se está convencido de que se o Orçamento para 2021 não tivesse sido aprovado, os indicadores traduziriam uma penalização eleitoral do Bloco de Esquerda, o dirigente socialista responde: "Felizmente, o Orçamento foi aprovado, tornando possível uma resposta diferente à crise".

"Ainda estamos num contexto de combate à pandemia e os portugueses esperam que o Governo esteja concentrado nesse combate. Esperam também que estejamos concentrados numa rápida recuperação da economia e na concretização das condições existentes -- condições que só foram possíveis porque negociámos um conjunto de pacotes de fundos europeus, como o PRR e o novo quadro comunitário -- que permitam a resolução de problemas estruturais do país", acrescenta.

Contra qualquer discussão sobre a sucessão de António Costa

O dirigente socialista Duarte Cordeiro salienta que a liderança do PS está resolvida até 2023 e defende que não se discuta neste congresso a sucessão de António Costa, nem sequer o método de eleição, primárias ou diretas.

Duarte Cordeiro, que é líder da Federação da Área Urbana de Lisboa (FAUL) do PS, considera natural que António Costa tenha remetido para 2023, no final da legislatura, a decisão sobre mais uma recandidatura ao lugar de secretário-geral do partido e ao cargo de primeiro-ministro.

Duarte Cordeiro também não atribui especial relevância ao facto de António Costa ter admitido que o PS poderá ter uma mulher como secretária-geral, dizendo que isso é "inevitável" a prazo.

Interrogado sobre a declaração do secretário-geral do PS ao jornal "Expresso" de que só em 2023 comunicará se vai ou não ser recandidato a esse lugar e a primeiro-ministro, Duarte Cordeiro diz que a recebeu "com muita naturalidade".

"Em 2023 termina o seu mandato de secretário-geral e termina, esperemos nós, a legislatura. Portanto, é natural que seja no final da legislatura e no final do mandato que o secretário-geral do PS faça essa avaliação", justifica.

O líder da FAUL do PS e também secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares recusa que António Costa tenha criado um "tabu" ao não esclarecer já o seu futuro político após 2023.

"Pelo contrário, acho que o objetivo de António Costa, exatamente, é de dizer, com naturalidade, que no final desta legislatura avaliará do ponto de vista pessoal aquilo que é o futuro", sustenta.

Duarte Cordeiro não atribui especial significado político à ideia de António Costa de que o próximo secretário-geral do PS pode ser pela primeira vez uma mulher.

"É uma circunstância inevitável", começa por responder.

"Inevitável ser homem ou mulher. E, portanto, acho que, como não há limitação do ponto de vista de género à candidatura para secretário-geral do PS, qualquer militante pode e deve ter essa expectativa, se assim o desejar", argumenta.

Interrogado se não vê aqui um sinal de António Costa estar a colocar na corrida à liderança do PS figuras como a sua líder parlamentar, Ana Catarina Mendes, ou a sua ministra de Estado e da Presidência, Mariana Vieira da Silva, Duarte Cordeiro afirma que não.

"A liderança do PS, felizmente, é um tema que está bem resolvido. E não será, naturalmente, um tema deste Congresso. Acabámos de reeleger o secretário-geral do PS, vamos ter as eleições para os órgãos nacionais do PS, e vamos ter também a definição da estratégia do PS para este mandato", contrapõe.

Interrogado se o PS deve voltar a realizar eleições primárias abertas e simpatizantes, como aconteceu em setembro de 2014, para escolher o sucessor de António Costa, Duarte Cordeiro recusa antecipar essa discussão.

"Os estatutos do PS definem bem como é que pode ser feita a eleição de um secretário-geral. Não acho que faça sentido discutir nem o método nem as pessoas, porque a liderança não está em causa, e António Costa acabou de ser eleito secretário-geral do PS", insiste.

Questionado sobre os motivos de o ministro das Infraestruturas, Pedro Nuno Santos, já ter comunicado que não tenciona falar durante o congresso do PS em Portimão, no sábado e no domingo, Duarte Cordeiro, considerado próximo deste dirigente socialista, remete a resposta a essa pergunta para o próprio Pedro Nuno Santos.

No entanto, acrescenta que não vê qualquer sinal de afastamento de Pedro Nuno Santos face à liderança do Governo e do PS.

"O Pedro Nuno Santos é um ministro com muita importância neste Governo. Tem um conjunto de responsabilidades relevantes para o nosso futuro na área da ferrovia, na habitação e é alguém que também tem dossiês difíceis no Governo. É dirigente nacional do PS, tem participado e tem feito intervenções quer como ministro quer como dirigente nacional do PS. Tem correspondido a vários convites que lhe têm sido feitos para apresentações de candidaturas autárquicas", aponta.

Para o líder da FAUL do PS, Pedro Nuno Santos é "uma pessoa que está motivada no exercício das suas funções, quer como membro do Governo, quer como dirigente nacional".

Confrontado com a ideia de que o atual ministro das Infraestruturas poderá ter a sua carreira política comprometida caso corra mal o processo de reestruturação da TAP, o secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares reage:

"Volto a dizer, Pedro Nuno Santos é alguém que está motivado no exercício das suas funções e não me parece limitado em nada", defende. 

Interrogado sobre os motivos que o levaram a si e a Pedro Nuno Santos a não apresentar novamente uma moção setorial ao próximo congresso do PS, tal como aconteceu em 2018, Duarte Cordeiro alega que alguns dos pontos dessa anterior moção estão agora a ser executados pelo Governo.

Mas deixa também um recado a quem criticou o seu grupo, conotado com a ala esquerda do PS, em 2018.

"Hoje, podemos dizer que essa moção não só tem atualidade, como em certa medida o Governo tem aplicado alguns dos objetivos nela contidos. Os objetivos não foram assim tão divisionistas como se procurou fazer crer. Portanto, aquilo que às vezes parece que é divisionista, depois, na prática, não é - e todos nos conseguimos entender em torno desses objetivos", afirma.

Já sobre a sugestão feita recentemente pelo vice-presidente do Grupo Parlamentar do PS Pedro Delgado Alves no sentido de que o partido faça uma autocrítica sobre o período em que José Sócrates foi líder do partido, Duarte Cordeiro demarca-se.

"Não olho para o PS como um partido que não tem feito debates sobre todas as matérias e todos os assuntos. Temos apresentado soluções e medidas tendo em conta várias situações e não tendo como base a particularização de um aspeto em concreto. Acho que não ganhamos nada com isso e não vejo o PS como um partido que se tenha inibido no debate de todos os temas de atualidade, inclusivamente no que diz respeito a temas que envolvem a justiça", sustenta.