Amnistia Internacional diz que situação no Afeganistão "devia ter sido evitada" e pode agravar-se
A secretária-geral da Amnistia Internacional, Agnès Callamard, classificou hoje a tomada de poder dos talibãs no Afeganistão como "uma tragédia que devia ter sido prevista e evitada" e que pode agravar-se "sem ação rápida e decisiva da comunidade internacional".
A responsável da organização não-governamental alertou ainda para os "milhares de afegãos em sério risco de represálias dos talibãs", desde "académicos e jornalistas a ativistas da sociedade civil e mulheres defensoras dos direitos humanos", que "estão em perigo de ser abandonados a um futuro profundamente incerto."
"Os governos estrangeiros devem tomar todas as medidas necessárias para assegurar a saída segura para fora do Afeganistão de todos aqueles que correm o risco de ser visados pelos talibãs", considerou.
Para esse efeito, Agnès Callamard referiu a "expedição de vistos, prestando apoio às evacuações do aeroporto de Cabul, providenciando a recolocação e reassentamento, e suspensão de todas as deportações e regressos forçados".
Ao mesmo tempo, instou os Estados Unidos a providenciar segurança contínua naquele aeroporto, onde o caos se instalou hoje devido a centenas de afegãos que tentavam fugir do país, mas visou também as Nações Unidas, nomeadamente o Conselho de Segurança.
"À medida que o povo do Afeganistão enfrenta uma nova e dura realidade, o Conselho de Segurança da ONU deve também adotar uma resolução de emergência apelando aos talibãs - que agora controlam efetivamente o país - a respeitar a lei internacional dos direitos humanos, proteger civis e acabar com ataques de represálias, à medida que prosseguem as negociações sobre as disposições transitórias", disse.
Pelo menos sete pessoas morreram hoje no aeroporto de Cabul quando tentavam fugir dos talibãs, incluindo várias que alegadamente caíram de um avião em voo, com testemunhas a admitirem troca de tiros entre norte-americanos e rebeldes.
Militares norte-americanos, que falaram sob condição de não serem identificados por não estarem autorizados a discutir a operação em curso, disseram à Associated Press (AP) que o caos provocou sete mortos, incluindo vários que caíram de um avião que tinha descolado.
Num vídeo que se tornou viral nas redes sociais vê-se o que parecem ser dois corpos a cair de um avião que tinha acabado de descolar do aeroporto de Cabul.
Num outro vídeo, centenas de pessoas estão a correr ao lado de um avião militar norte-americano em andamento na pista, com algumas delas a conseguirem agarrar-se ao aparelho.
A chegada dos talibãs a Cabul no domingo precipitou a saída do país do Presidente afegão, Ashraf Ghani, após terem tomado o controlo de 28 das 34 capitais provinciais em dez dias, e sem grande resistência das forças de segurança governamentais, no âmbito de uma grande ofensiva iniciada em maio - altura em que começou a retirada das tropas norte-americanas e da NATO do país, que deverá ficar concluída no final deste mês.
Um porta-voz do movimento islâmico radical, que governou no Afeganistão entre 1996 e 2001, disse no domingo à televisão pública britânica BBC que os talibãs pretendem assumir o poder no Afeganistão "nos próximos dias", através de uma "transição pacífica", 20 anos após terem sido derrubados por uma coligação liderada pelos Estados Unidos, pela sua recusa em entregar o líder da Al-Qaida, Osama bin Laden, após os atentados de 11 de setembro de 2001.
Hoje, numa mensagem de vídeo, o 'mullah' Baradar Akhund, chefe do gabinete político talibã no Qatar, fez a primeira declaração pública de um líder talibã após a conquista do país, anunciando o fim da guerra no Afeganistão, com a vitória dos talibãs, após a fuga no domingo do Presidente, Ashraf Ghani, e a captura de Cabul.
Com a partida de Ghani, um grupo de líderes políticos formou o Conselho de Coordenação para a transição de poder para os talibãs, composto pelo ex-presidente afegão Hamid Karzai, o presidente do Alto Conselho para a Reconciliação, Abdullah Abdullah, e o líder do partido Hizb-e-Islami e antigo senhor da guerra, Gulbuddin Hekmatyar.
No entanto, os talibãs não forneceram, até agora, informações sobre como funcionará o processo de transição ou a tomada do poder.