População tomou consciência da captura do Estado pela corrupção, diz PR da África do Sul
O Presidente sul-africano, Cyril Ramaphosa, disse hoje na comissão judicial 'Zondo' que a sociedade civil tornou "a maioria de nós" ciente da extensão da captura do Estado pela grande corrupção na África do Sul.
"Muitos dos incidentes de captura do Estado vieram até mim por meio do trabalho de jornalistas, organizações da sociedade civil e instituições como o Ministério Público", declarou Cyril Ramaphosa.
O chefe de Estado, que começou hoje a ser ouvido pela comissão judicial 'Zondo', que inclui uma investigação de três anos sobre a "corrupção e captura do Estado", disse que considerou demitir-se quando se "apercebeu" da extensão do problema no governo e no seu partido, o Congresso Nacional Africano (ANC, na sigla em inglês), no poder desde 1994.
Todavia, o chefe de Estado sul-africano adiantou que renunciar ao cargo "teria prejudicado a capacidade de contribuir para o fim da captura do Estado", sublinhando que "se falasse abertamente" levaria à sua "destituição" do cargo.
O Presidente sul-africano disse que, desde 2018, o governo que lidera comprometeu-se a "acabar com a corrupção", começando com mudanças em cargos de liderança.
Ramaphosa explicou que a aplicação da lei foi "deliberadamente enfraquecida para limitar a capacidade de processar os responsáveis pela corrupção", sublinhando que o Ministério Público começou a fazer "progressos" no combate à corrupção no país.
Sobre as alegações que enfrenta relacionadas com a estatal elétrica Eskom, que se encontra praticamente falida, Ramaphosa disse que renunciou, em 2014, ao conselho não-executivo da Optimum Coal, sublinhando que "vendeu" as suas ações na empresa fornecedora da Eskom "pouco antes de ser nomeado vice-presidente" do país, em 2013.
A mina da Optimum Coal foi vendida pela Glencore à controversa família indiana Gupta.
Ramaphosa vincou que "não teve nenhuma ligação desde então", salientando que a sua aquisição das ações da Optimum "foi feita através da bolsa de valores de Joanesburgo".
Ramaphosa acrescentou que "não estava envolvido em nenhuma das operações do dia-a-dia" da empresa.
O chefe de Estado refutou também as alegações de dois antigos gestores da Eskom, membros do ANC, implicados no processo de captura do Estado, de incapacidade do seu executivo para impedir uma "crise" na estatal elétrica sul-africana.
No primeiro de dois dias de depoimento na qualidade de vice-Presidente e Presidente da República, Ramaphosa procurou distanciar-se do seu antecessor Jacob Zuma, apresentando-se como um dirigente que resistiu à captura do Estado a partir do interior do próprio Estado e do ANC, de que é presidente desde 2018.
"Pôr fim à captura do Estado permitirá que o Estado concentre os seus esforços e recursos de forma mais eficaz na prestação de serviços públicos, o que é fundamental para a transformação e o desenvolvimento da nossa sociedade", declarou o presidente sul-africano perante o juiz Raymond Zondo, que lidera a investigação à grande corrupção pública no mandato do ex-Presidente Jacob Zuma, preso desde 8 de julho por desacato ao Tribunal Constitucional.
Ramaphosa sublinhou que "vale a pena destacar que muitas das nossas instituições críticas continuaram a funcionar como precisavam, e conforme previsto na Constituição, ao longo deste período também".
"Agora, apesar dos danos que foram causados pela captura do Estado às instituições públicas, e com o impacto resultante na prestação de serviços, a realidade é que o trabalho do governo, sim, continuou, e houve progressos em várias áreas", referiu sem avançar detalhes.
O ex-presidente Jacob Zuma, que cumpre uma pena de prisão de 15 meses desde 08 de julho, liderou o país entre 2009 e 2018, tendo sido afastado pelo seu partido, o ANC, antes de terminar o mandato depois de múltiplos escândalos relacionados com corrupção, desde quando era vice-presidente da República.
O ex-chefe de Estado foi substituído no cargo por Cyril Ramaphosa, que era vice-presidente de Zuma.
No início da audiência de hoje, na qualidade de presidente do ANC, Ramaphosa afirmou que, entre 2014 e 2021, o partido no poder alegadamente não disciplinou de forma decisiva qualquer membro do partido por corrupção.
"Sim, é uma questão de preocupação e contestação no seio do partido", disse Ramaphosa.
"Devemos traçar uma linha na areia e levar a sério a questão da corrupção", frisou.