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Para além do imediato: o futuro

A normalidade estagnada, orientada para o imediato e para pequenas rotinas de entretenimento, pode dar uma falsa sensação de estabilidade e segurança que na verdade representa um dos maiores perigos para a vida em comunidade, pois nunca assegurará os mecanismos necessários para se enfrentarem os grandes desafios do futuro. E são tantos.

Isso preocupa-me. As águas estagnadas perdem vida, mesmo que a natureza seja esplendorosa à sua volta. Gerir o imediato de uma forma populista, prepotente, primária e minimalista será sempre pouco. Isso acontece por incapacidade ou incompetência, por falta de visão, por vaidade egoísta ou até por maldade disfarçada. Em qualquer circunstância, é um verdadeiro perigo.

Recordo que em 2009 perguntei a um motorista de táxi em Havana como era a vida naquele país. Perguntei como vivia o seu dia a dia. Respondeu-me com aparente naturalidade: “nunca sei como vou viver o dia de amanhã, nem sei se terei comida, mas acabo sempre por viver e ter o que comer, tenho o essencial”. Parecia que isso lhe bastava. Parecia. Na verdade, pode não ter sido absolutamente sincero. Sabe que corre riscos quando fala do regime político. Não conhecia verdadeiramente o seu interlocutor e pode ter sido prudente ou contido na exteriorização das suas emoções. Mas deixou uma mensagem inquietante: nunca sabe como irá viver o dia de amanhã.

Podemos ser felizes com muito pouco. Sim, podemos. O que não podemos é permitir que nos impeçam de dizer o que pensamos e de ter aquilo que merecemos. O que não podemos é deixar que, podendo ter tanto, sejamos obrigados a viver com muito pouco. O que não devemos é renunciar a novas oportunidades. Somos seres inconformados. Merecemos mais. Muito mais. E essa é a reflexão que se impõe nalguns momentos. Porque terei de ter apenas metade se posso ter quase tudo? Porque terei de ser grato por quase nada, se tenho direito a mais? Esta é a reflexão. E este é o momento. É tempo de abrir horizontes. É o momento de olhar, perceber e interpretar cenários, renunciando a tudo o que não nos possa verdadeiramente assegurar novos caminhos de esperança. Não vamos perder nada. Vamos apenas querer mais. É tempo de assumir o futuro.

A pandemia recente trouxe-nos momentos absolutamente angustiantes e de grande desespero. Obrigou-nos a enfrentar grandes constrangimentos e limitações. Obrigou-nos a reagir. Mas, para além de ter imposto reações imediatas e alterações de comportamentos, veio também impor uma reflexão em torno daquelas que foram as nossas opções ou as nossas prioridades no passado, uma reflexão acerca do nosso caminho e da necessidade de assumir novos posicionamentos, novos paradigmas e novos desafios. Todo o momento de angústia deve também ser um momento de revolta interior. É tempo de assumir o futuro e o nosso maior desafio agora é transformar rotinas estagnadas e ultrapassadas em novos caminhos com novas oportunidades. Conhecemos o passado e o presente. Sabemos que o futuro depende de novas opções. Vamos assumir o futuro. Sem medo.