O tapete vermelho ao futebol
A subserviência dos políticos (nos mais altos cargos da nação) ao futebol não é de hoje. E a comunicação social também tende a apadrinhar e a venerar o “Portugal” da Seleção. E nós, Portugal, somos muito mais do que isso.
Sinto-me particularmente confortável em escrever sobre o tema porque gosto verdadeiramente de futebol e sigo com a maior atenção o meu clube, por isso contra o “futebol jogo” nada tenho, antes pelo contrário.
Por que razão os mais altos cargos políticos da Nação fazem da Seleção portuguesa de futebol e dos seus jogos um desígnio nacional? Por que razão o tema da Seleção é comentado no intervalo dos jogos pelo presidente da República? Por que razão um presidente da República vai receber e discursar a um conjunto de profissionais milionários que quase nada fizeram para além do que lhes era exigido no exercício das suas funções? Por que razão a nacionalidade, a portugalidade e o sentimento pátrio quase só se ouvem ou se sentem quando uma equipa joga futebol?
Eu guardo para mim a resposta às perguntas anteriores, mas gostava muito de ver os mais altos cargos da Nação muito interessados em acompanhar, comentar e dar visibilidade aos desvarios da Banca que todos pagamos – e continuamos a pagar - com os nossos impostos. Por que razão Portugal não se une, não se indigna e não exalta o sentimento nacional quando em causa estão valores e causas bem mais relevantes para todos nós?
Relembro que gosto imenso de futebol, sou apaixonado pelo jogo, mas não deixo que isso me tolde a visão sobre as prioridades de um país e daquelas que devem ser as preocupações dos altos cargos políticos do país que tomam decisões que a todos nos afetam.
E quando joga a Seleção, parece que esse “desígnio” nacional que enche telejornais e jornais, torna turva a imparcialidade jornalística, que ora venera e endeusa a Seleção e que ora a critica e a descapacita na praça pública. Prefiro que os media mantenham uma atuação equidistante e analítica quando falam e escrevem sobre a Seleção, não embalando na postura política que torna da “bola” um objetivo nacional.
Preferia mil vezes que o Presidente – e outros cargos – recebessem e dessem visibilidade a tantos outros campeões de outros desportos que a classe política e a generalidade da imprensa diariamente tendem a considerar menores. Preferia mil vezes que o Presidente e tantos outros altos cargos políticos puxassem por Portugal na luta por uma sociedade mais igual, com menos desemprego (isso sim um desígnio nacional) do que saber se Portugal passa aos “quartos de final” ou termos de ter milhares de horas em direto com os pormenores do dia a dia da Seleção. O espaço público está demasiado contagiado pelo futebol e a política portuguesa que há muito se alimenta e alimenta este ciclo e este “status quo”.
Eu gostava de ver bandeiras e cachecóis nas varandas e cantar o hino quando Portugal melhora as condições dos que têm menos, quando Portugal atinge metas importantes na melhoria da qualidade de vida dos seus cidadãos, quando Portugal consegue formar e criar campeões na medicina, na cultura ou na investigação. Nada disto é impossível, basta que mudemos de rumo. E para o fazer não temos de deixar de ver e vibrar com o futebol, mas a cada assunto e a cada tema a sua importância.