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A literatura, o turismo literário e o Património Cultural

Quando se junta o fenómeno do turismo à arte da literatura, funda-se uma vertente denominada de turismo literário. É possível afirmar que o turismo literário pode, de facto, inserir-se no turismo cultural (como uma vertente), dado que abrange os turistas e visitantes que se identificam, encontram e criam valores culturais com as pessoas que agregam as mitologias culturais dos locais.

É importante salientar que a literatura é capaz de causar o interesse em viajar, com o intuito de conhecer locais e mirar os símbolos que estão relacionados com as obras literárias e com os seus autores. Por sua vez, quando o leitor viaja e assume o papel de turista, viajante ou mesmo de peregrino, vê com os próprios olhos os lugares que imaginou aquando da sua leitura.

É certo que a literatura vai muito mais além de meras palavras, de sentimentos ou emoções. A literatura é uma expressão artística do Ser Humano que abrange histórias de épocas, locais e até sentimentos do próprio autor. A literatura é cultura! e nós não somos nada sem ela. Por isso, é tão urgente a sua presença numa sociedade atual, porque quem lê sabe e conhece.

A valorização da literatura é um processo fulcral. Através dela, é possível aprender, saber, conhecer… e, aliada ao turismo, é deveras um forte parceiro para o desenvolvimento de uma região e de um país. Conhecer um sítio pelos olhos de um escritor (a), é uma experiência que cativa muitos visitantes que têm grandes interesses culturais. Assim, o património cultural é um dos fortes elementos que atraem visitantes a um determinado local, o que vai acabar por ser notório no seu desenvolvimento. Não há dúvidas que esta produção artística, que se insere no património cultural de um povo, contribui para a identidade e memória coletiva do mesmo.

Reflito nisto com carinho. Lembro-me de fazer, há uns tempos, um passeio pelo Rio Douro e, estar atenta a todos os pormenores da paisagem, para nunca mais me esquecer dela, reparei que andava à procura de alguma coisa. Naquela excecional paisagem, em conjunto com o rio, eu procurava os detalhes e as simplicidades, não apenas com os meus olhos, mas também pelos olhos do eterno Miguel Torga, que escreveu no Diário XII “O Doiro sublimado. O prodígio de uma paisagem que deixa de o ser à força de se desmedir. Não é um panorama que os olhos contemplam: é um excesso da natureza. Socalcos que são passadas de homens titânicos a subir as encostas, volumes, cores e modulações que nenhum escultor, pintor ou músico podem traduzir, horizontes dilatados para além dos limiares plausíveis da visão. Um universo virginal, como se tivesse acabado de nascer, e já eterno pela harmonia, pela serenidade, pelo silêncio que nem o rio se atreve a quebrar, ora a sumir-se furtivo por detrás dos montes, ora pasmado lá no fundo a reflectir o seu próprio assombro. Um poema geológico. A beleza absoluta.”

É percetível que o património literário português tem um forte espólio cultural que, inclusive, é reconhecido internacionalmente, onde os escritores portugueses asseveram o seu nome na história da literatura portuguesa. As obras literárias portuguesas comportam-se consoante a ideologia de cada autor, a maneira como este observa o mundo, formando assim uma linha de pensamento que vai dar origem a uma obra única.

Quando paramos para observar o mundo exterior, o que vemos é uma vasta quantidade de gente que não tem conhecimento do potencial literário do próprio país. Vemos cada vez menos livrarias com histórias por contar, ou pior… vemos livrarias cujo conceito de livraria deixa parcialmente de existir, como o caso da Livraria Lello, no Porto.

A literatura associada ao turismo leva à descoberta de locais consagrados e imortalizados pelos escritores. No mesmo sentido, o turismo literário, pode ser, efetivamente, um fator positivo para o desenvolvimento de um local ou de uma região. Pode, claro, ser um forte agente estimulador da experiência turística e, consequentemente, pode originar um potencial para o consumo turístico. Este segmento de turismo, pode contribuir para que a cultura da sociedade não seja esquecida, pode ajudar os pequenos comércios locais, sobretudo, as pequenas livrarias.

A conclusão a que se chega mediante estes factos é que os agentes que deveriam ser incitadores da cultura apenas se focam numa parte dela, descurando tudo o resto. É, deveras frustrante, pois existe tanto potencial literário que precisa de ser explorado, que precisa de ser trabalhado e, acima de tudo, valorizado. Existe uma forte latente de desenvolvimento regional neste nicho e, então a minha questão é a seguinte: Estamos à espera de quê?