A Europa na liderança da agenda ambiental
Cerca de um ano depois do compromisso dos 27 Estados da União Europeia para alcançar a neutralidade carbónica em 2050, a Comissão Europeia apresentou estes dias um pacote de propostas designado “Fit to 55”, no que representa a primeira grande iniciativa do acordo ecológico europeu e uma prioridade do mandato de Ursula von der Leyen. O conjunto de propostas para uma economia mais verde abrange áreas como as energias renováveis, a eficiência energética, a construção e reabilitação de edifícios, o uso do solo e o comércio de emissões.
A Comissão Europeia promete uma revolução ambiental e assume que o quer fazer a um ritmo extraordinariamente acelerado: a Europa pretende reduzir as suas emissões de CO2 em 55% até 2030 (face aos valores de 1990). Contando com o entusiasmo e a determinação política de Frans Timmermans, a Comissão pretende por termo às vendas de carros híbridos, a gasolina ou a gasóleo em 2035, um calendário ainda objeto de contestação entre países. Para acelerar a eletrificação do parque automóvel, os Estados membros terão que implementar mais rapidamente os postos de carregamento. O objetivo é tornar o carregamento de veículos elétricos e o reabastecimento de hidrogénio para veículos pesados tão fácil como abastecer um veículo de combustível tradicional – a União Europeia definiu a meta de um milhão de pontos de carregamento para veículos elétricos até 2025 e três milhões até 2030.
Os territórios europeus, em terra e em mar, estarão implicados na dinâmica verde através da integração do mercado europeu do carbono e da imposição de um sistema “poluidor-pagador”. A aviação, em especial para os voos na União Europeia, e a construção, para acelerar a renovação térmica, serão igualmente alvo desta expansão do mercado do carbono. Este último, agora focado em algumas indústrias pesadas, também será revisto para aumentar o preço por tonelada de carbono e quotas mais baixas. Está também prevista uma revisão fiscal para reforçar a atratividade das energias renováveis e penalizar os combustíveis fósseis.
Bruxelas pretende aprovar o pacote em 2023, mas as divergências entre os Estados membros são já evidentes e tenderão a intensificar. A extensão do mercado do carbono aos edifícios, intenção da Alemanha, preocupa a maioria dos países que temem o impacto económico e social do esforço nos inquilinos e senhorios. Em França, a subida do preço da gasolina já está a aumentar os receios de um regresso dos “coletes amarelos”. A dimensão da reforma do mercado do carbono e da tributação da energia também revela divergências. A Europa central e oriental receia enfrentar exigências demasiado elevadas e demasiado rápidas, o que seria muito negativo para a recuperação económica. Os problemas e as tensões pioram com o papel atribuído à energia nuclear e ao gás na transição energética.
Outro eixo do plano que é muito discutido relaciona-se com a criação de um “mecanismo de ajustamento das fronteiras de carbono”, destinado a aumentar as importações de países terceiros com normas ambientais menos rigorosas em determinados sectores-chave (aço, eletricidade, cimento, fertilizantes, alumínio). Paris quer um instrumento ambicioso e rápido para as suas receitas para financiar o plano de recuperação europeu; Berlim e os países do Norte pedem cautela face aos riscos de retaliação comercial. O desafio será também a criação de um mecanismo compatível com as regras da Organização Mundial do Comércio, onde alguns já clamam pelo protecionismo. O resultado das eleições alemãs no outono, e em particular uma vitória dos Verdes, poderá mudar o rumo. Paris quererá aproveitar a presidência rotativa do Conselho da UE, no primeiro semestre de 2022, para influenciar os debates. O conjunto das propostas legislativas passará para o Parlamento Europeu e para o Conselho da UE, que representa o conjunto dos Estados-membros, que irão entrar em negociações para aprovar o conjunto de medidas - um processo que se prevê demorar vários meses.
No ano de realização da COP 26 (conferência das Nações Unidas para ao clima, a realizar no final do ano, em Glasgow), a Europa afirma-se como o primeiro continente a propor uma abordagem holística e concreta à luta contra o aquecimento global. A Europa posiciona-se assim na liderança para a sustentabilidade e deixa uma mensagem às empresas: todos terão de participar num esforço que é muito grande, mas que representa um investimento na competitividade e na soberania do velho continente. O plano de recuperação europeu é um primeiro e importante passo desta nova liderança.