País

Partidos criticam Governo por ficar "fora de jogo" na criminalização do enriquecimento injustificado

None

PSD, BE e Chega insistiram hoje nas críticas ao executivo por não incluir na Estratégia Nacional de Combate à Corrupção (ENCC) a criminalização do enriquecimento injustificado, com a ministra da Justiça a reiterar que essa é responsabilidade do parlamento.

Francisca Van Dunem abriu o debate no parlamento que se debruça hoje sob quatro propostas de lei do Governo que concretizam a ENCC e 21 diplomas de todos os partidos, muitos centrados na criminalização da ocultação de riqueza ou enriquecimento ilícito.

O primeiro pedido de esclarecimento ao executivo coube ao deputado José Manuel Pureza, do BE, que apontou que a proposta do Governo que concretiza, no plano criminal, a Estratégia Nacional de Combate à Corrupção "tem aspetos positivos, aspetos negativos e um ruidosíssimo silêncio".

"A ausência de iniciativa do Governo sobre criminalização do enriquecimento injustificado foi explicada pela senhora ministra pela suposta falta de necessidade de operar essa transformação da ordem jurídica portuguesa. Esta falta de comparência -- que a tardia iniciativa do PS não disfarça -- deixa a Estratégia sem a ambição de ir ao essencial. Registamos", disse.

O deputado apontou ainda "a centralidade conferida na proposta aos prémios penais e à negociação de sentenças": para o BE, "a atenuação especial de pena para os arguidos que colaborem até ao encerramento da audiência de julgamento de primeira instância, é um escancarar de portas a uma forma perversa de processo penal da confissão negociada no lugar de um processo penal da investigação qualificada".

"Uma estratégia séria de combate à corrupção implica dotar a investigação criminal de meios humanos, técnicos e materiais mais fortes que os meios ao dispor do mundo da corrupção. Mas o Governo escolheu o caminho mais fácil e mais barato que é o do direito premial aditivado", criticou.

"O Governo nesta matéria ficou estranhamente fora de jogo: mostrou algum desdém pela criminalização do enriquecimento injustificado ou ilícito ou ocultação de riqueza e ainda não explicou bem porquê, acho que é altura de o fazer hoje", atirou o social-democrata Carlos Peixoto.

O deputado do PSD disse ainda que "não há boas leis com maus recursos e com fracos meios e investimentos na investigação criminal" e que o Governo, que tinha "obrigação de apresentar um plano para quatro anos relativamente ao investimento na investigação criminal ainda não o fez".

Mas o deputado aproveitou para deixar outras críticas à ministra: "Mesmo bem-intencionada, de boa fé, há uma coisa que não se livra, é das manchas causadas pelos labirintos de nomeações que tem feito no seu Ministério e que protagonizou. Este indescritível rodopio de magistrados e de técnicos da Polícia Judiciária para esta instituição, para órgãos do Estado e para tribunais, é obscena, é descarada, é tóxica e é bafienta".

"À mulher de César não basta parecê-lo, é preciso sê-lo", rematou.

Coube a Cláudia Santos, do PS, responder ao deputado do PSD: "No século XXI, mulher nenhuma precisa de parecer aquilo que não é, é um provérbio profundamente misógino para começar um debate desta natureza".

A deputada defendeu que a estratégia em debate é "uma estratégia mais preocupada com aquilo que é do que com aquilo que parece e às vezes tem sido mal interpretada em vários domínios", sustentando que esta está "longe de ser inócua", tendo "propostas radicalmente inovadoras, quer no âmbito do direito penal, quer no âmbito do direito processual penal".

Pelo Chega, o deputado único André Ventura criticou o Governo por, depois de "falar durante anos" sobre enriquecimento ilícito, excluir essa matéria da proposta em debate, lamentando também que não tenha sido incluída a reforma do Tribunal Central de Instrução Criminal.

Na resposta, Francisca Van Dunem insitiu que na altura em que a proposta da estratégia foi apresentada "tinha acabado de entrar em vigor a lei 52/2019, que justamente criminalizava a recusa de declaração ou a declaração inexata na sequência de uma notificação para a declaração de bens, de rendimento e patrimónios".

"Isso resultava de uma iniciativa do parlamento e o Governo entendeu que, tratando-se, como se trataria, de aperfeiçoar esse modelo deveria, numa ótica de cortesia institucional, deixar que fosse o parlamento a pegar nessa matéria e eventualmente a alterá-la", sustentou.

A ministra vincou que "o Governo mostrou, relativamente a tudo o mais, não ter nenhuma dificuldade em enfrentar qualquer das questões que o problema do combate à corrupção implicava".

Quanto ao "Ticão", Van Dunem defendeu que o Governo "aprovou uma proposta de lei justamente destinada a alterar as condições de funcionamento do Tribunal Central e essa proposta foi enviada para o parlamento e o Governo tem a expectativa de que ela venha a ser discutida no dia 09 [de julho]".