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Brasil teria evitado 400 mil mortes se registasse média mundial

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Foto EPA/Antonio Lacerda

O Brasil teria evitado 400 mil mortes por covid-19 se registasse a média mundial de óbitos, afirmou hoje o epidemiologista da Universidade Federal de Pelotas (UFPel) Pedro Hallal à comissão parlamentar que investiga a resposta das autoridades à pandemia.

Hallal apresentou dados compilados por si na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da pandemia, do Senado brasileiro, para afirmar que o país tem 2,7% da população mundial, mas apresenta 12,9% das mortes por covid-19 no mundo e, se tivesse seguido a média global, menos pessoas teriam morrido.

"Ontem [quarta-feira], uma em cada três pessoas que morreram por covid-19 no mundo foi no Brasil (...) Podíamos ter salvado 400 mil vidas no Brasil apenas se estivéssemos na média mundial", afirmou.

O epidemiologista, coordenador de um inquérito serológico realizado pela UFPel chamado Epicovid e que testou 100 mil pessoas no Brasil a pedido do Ministério da Saúde, também contou que foi censurado durante uma apresentação dos dados deste levantamento sobre a incidência da covid-19 em indígenas, numa reunião no Palácio do Planalto, sede da Presidência brasileira.

"Vou dizer para as senhoras e os senhores que este slide que apresentava diferença pelos grupos étnicos foi censurado -- repito o termo: censurado -- na coletiva [conferência] de imprensa no Palácio do Planalto, na qual eu apresentei os resultados dessa pesquisa", disse, enquanto mostrava os dados aos senadores da CPI da pandemia.

"Faltando 15 minutos para começar a minha apresentação, no Palácio do Planalto, senhores senadores e senhoras senadoras, eu fui informado, pela assessoria de comunicação, de que o slide tinha sido retirado da apresentação de slides de que eu era o apresentador", acrescentou.

O gráfico em questão, apresentado hoje na CPI da pandemia, indicou que entre maio e junho do ano passado a doença atingiu em média cinco vezes mais indígenas do que brancos e duas vezes mais os negros do que a população branca.

No final de junho, a incidência da doença entre os indígenas era de 7,8%, enquanto entre brancos a ocorrência era de 1,7%.

O epidemiologista também atribuiu à postura do Presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, a principal responsabilidade pela situação da pandemia no país.

Segundo o especialista, só a demora na compra de vacinas contribuiu para que acontecessem 95,5 mil mortes evitáveis.

"Nós fizemos uma análise que estimou que especificamente o atraso na compra das vacinas da Pfizer e da CoronaVac resultou em 95,5 mil mortes", afirmou.

Jurema Werneck, médica e diretora-executiva da Amnistia Internacional no Brasil, que também estava a prestar depoimento nesta audiência da CPI da covid-19, apresentou dados que indicaram que a maioria dos mortos pela covid-19 no Brasil eram pessoas de baixa rendimento, baixa escolaridade, negros e indígenas.

"O que os estudos atestam é que as desigualdades sociais tiveram influência sobre altas taxas de mortalidade. Quando a gente cruza com diferentes marcadores a gente vê que a maioria das pessoas que morreram no Brasil eram negras, indígenas, de baixa renda e de baixa escolaridade. Já sabíamos que o Brasil tinha uma grande desigualdade neste campo e deixámos passar", afirmou a diretora da Amnistia Internacional.

A especialista defendeu ainda que haja responsabilização e a reparação dos danos causados pelo "descontrolo da epidemia" e considerou ser preciso "criar uma frente nacional" de combate à covid-19 liderada pelo Parlamento "e que inclua setores da sociedade".

Werneck também avaliou que o Brasil não está a enfrentar diferentes vagas de infeções por covid-19, mas "sendo arrastado por um grande tsunami, uma grande tragédia, porque o Brasil não está a tomar as medidas necessárias de controlo da pandemia".

O Brasil é o país lusófono mais afetado pela pandemia e um dos mais atingidos no mundo ao contabilizar 507.109 vítimas mortais e mais de 18,1 milhões de casos confirmados de covid-19.

A pandemia de covid-19 provocou, pelo menos 3.893.974 vítimas em todo o mundo, resultantes de mais de 179,5 milhões de casos de infeção diagnosticados oficialmente, segundo o balanço feito pela agência francesa AFP.

A doença respiratória é provocada pelo novo coronavírus SARS-CoV-2, detetado no final de 2019, em Wuhan, uma cidade do centro da China.