Já não é permitido sonhar?
Vivemos numa época estranha em que parece ser crime ser-se bonito ou bem sucedido. Para os inquisidores dos tempos modernos tudo serve de arma de arremesso
Há uns anos meti na cabeça que ia trazer o desfile anual da marca de lingerie Victoria´s Secret para Portugal. Para quem não sabe este evento era muito mais do que um desfile e dava corpo a um conceito que ficou eternizado pelas “Angels” que mais não era do que um conjunto de mulheres lindíssimas que se tornavam embaixadoras da marca e desfilavam no meio de uma grande produção com os maiores músicos internacionais para apresentar as novas coleções com pompa e circunstância. Este evento era seguido por muitos milhões de mulheres um pouco por todo o Mundo e chegou a ombrear com a “Super Bowl”, a final do Futebol Americano que é o espetáculo com maior audiência nos Estados Unidos. Nunca o cheguei a organizar, mas acabei por ser convidado pela marca para assistir em Paris ao Victoria´s Secret Fashion Show.
O que assisti, no Grand Palais em Paris, nesse 30 de Novembro de 2016 foi ao maior espetáculo de audiovisuais que tenho memória. Com concerto dos The Weeknd, da Lady Gaga e de Bruno Mars, que se iam entrelaçando na passarela enquanto as famosas “Angels” desfilavam com a lingerie, que se fazia acompanhar por uma grande encenação que envolvia as famosas asas, penas, chapéus e muitos outros adereços. No backstage as próprias modelos mostravam um nervosismo e um entusiasmo pouco comuns porque sabiam estar a fazer parte de um evento memorável. Ao contrário de algumas semanas da Moda amplamente criticadas, as mulheres que subiam ao palco não eram escanzeladas, tinham corpos bem feitos sim, mas com medidas normais, entre as quais Irina Shayk, que se encontrava já por essa altura grávida.
Custa-me por isso ver que a marca vem agora abdicar desse conceito para passar ao que diz serem “mulheres reais” que mais não são do que ativistas sociais entre elas uma mulher lésbica, uma transgénero ou uma asiática. Faz-me questionar se será que mulheres bonitas não são reais. Vivemos numa época estranha em que parece ser crime ser-se bonito ou bem sucedido. Para os inquisidores dos tempos modernos tudo serve de arma de arremesso. O ideal é ser-se mal jeitoso e com uns quilinhos a mais para não ferir susceptibilidades. Não se podem filmar mulheres nos estádios de futebol, não se pode querer almejar algo, a menos que façam parte de algumas minorias a quem tudo parece ser permitido e aplaudido. Sou totalmente a favor da diversidade. Para mim tanto se dá se é branco ou preto, se é homossexual, bissexual ou hetero, acho é que estamos a cair num exagero perigoso em que tudo é pecado e se proíbe por dá cá aquela palha.
Ao mesmo tempo, vamos vendo cada vez mais miúdas a ter sucesso mostrando o corpo nas suas contas de Instagram, tornando-se famosas e acedendo a um sem número de regalias, fazendo disso negócio. Não me parece que elas ( e bem ) dêem a mesma importância ao assunto que alguns ditadores que na verdade nos querem impôr as suas vontades. O bonito e o feio, o gordo e o magro o mais bem sucedido e o menos sempre fizeram e sempre irão fazer parte das nossas vidas. Isso não irá mudar só porque alguns ressabiados não convivem bem com eles próprios. Há lugar para todos como deve haver lugar para sonhar, para sermos melhores na nossa profissão ou simplesmente para cuidarmos do nosso corpo. É surreal ao ponto a que isto chegou. Quando vemos alguém que atingiu um certo patamar que ambicionamos, seja no que for, isso deve ser factor de motivação para chegarmos lá e não para exigirmos que esse alguém deixe de existir ou que só possa existir mediante determinadas regras e parâmetros.