Subir na vida. A que ritmo?
Não devemos ir ao ritmo dos outros nem tentar acompanhá-los. Devemos confiar nas nossas próprias capacidades e fazer o que tem de ser feito à nossa maneira e medida
Existem diversas formas de subir na vida. Uns através de expensas próprias, seja pela capacidade de trabalho, o talento natural e até por vezes a sorte, o destino (se acreditarem nele) , a criatividade ou mesmo a perseverança. Também há os que sobem à custa dos outros. Os que são mestres da cópia, os ladrões (a quem às vezes chamamos nomes mais pomposos), os que se aproveitam do esforço de outros para passar por cima sem dó nem piedade e os que não se importam de prejudicar e pisar quem lhes dá confiança e oportunidades, para no momento certo, não olhar a meios para ficar com os dividendos, deixando os escrúpulos para quem os tem. Há quem suba de pé, ou às cavalitas, mas também dá para subir deitado (por muito que as leis da física tentem demonstrar o contrário). Os que vão de coluna direita e os esguios que se moldam ao que for preciso. Uns vão de cabeça bem levantada e outros nem olham nos olhos.
Sobre os segundos, as próprias atitudes falam por si. Quanto aos primeiros, uma das muitas lições que a vida nos dá, é o ritmo a que atingimos ou pretendemos atingir os nossos objectivos. Quantas vezes nos esfalfamos a trabalhar, fazemos tudo e mais um par de botas e quando olhamos para o lado vemos outros que nos parecem menos aptos ou esforçados a atingir o que sempre quisemos? Tantas que nem dá para contar. Mas é importante, quando acreditamos nas nossas capacidades e quando temos a firme convicção que estamos no caminho certo não olhar para os outros com inveja ou sequer como atestado da nossa incapacidade. Um dos maiores feitos no nosso percurso é perceber o nosso ritmo, não tentar queimar etapas na ânsia de chegar lá e nem tão pouco perdermos muito tempo a olhar para o lado a tentar acompanhar quem vai mais rápido ou com excessos comparativos que nos tiram tempo e energias.
O ciclista português João Almeida deu (provavelmente sem se aperceber), corpo a esta máxima, na última Volta a Itália que terminou recentemente. Mesmo para quem não segue ciclismo, não será difícil entender que as etapas de montanha são as mais difíceis e que exigem um esforço maior, levando o corpo ao limite. Na primeira dessas etapas o nosso Pantera ao tentar acompanhar o grupo dos favoritos levou longe de mais o seu esforço e “rebentou”, perdendo logo aí importantes minutos para o primeiro. A partir desse dia mudou a sua estratégia. Nas subidas seguintes não foi atrás do engodo e deixou ir quem se quis distanciar, mantendo o seu próprio ritmo. E foi maravilhoso de ver, pouco a pouco, mantendo o seu próprio ritmo recuperar terreno e ultrapassar um a um quem dele havia fugido.
Percebeu uma das coisas mais decisivas da nossa construção pessoal. Não devemos ir ao ritmo dos outros nem tentar acompanhá-los. Devemos confiar nas nossas próprias capacidades e fazer o que tem de ser feito à nossa maneira e medida. Nas montanhas que se nos deparam todos os dias é isso que devemos procurar. Expurgar a frustração e a inveja, entender que a vida dos outros não é a nossa e que a nossa deve ser vivida de maneira própria. É na compreensão do que somos, do que valemos e na forma que encontramos para atingir o que desejamos que encontramos a magia de cada momento. Só nesse ritmo podemos ser felizes. Só assim retiramos da vida um outro sabor. E esse não se compra.