Precisamos uns dos outros
Provocar dor no outro para aliviar a sua nunca é solução
A perturbação ou doença mental não é apenas uma questão individual, sendo que integra todo o sistema que a envolve. Pode dizer-se que muitas vezes emerge de um sistema disfuncional e desagua em outros, perpetuando o mau estar e sofrimento. As vítimas da doença mental trespassam os que manifestam os primeiros sintomas, atingindo igualmente os que estão emocionalmente mais próximos. Negar a dor, tantas vezes insuportável e difícil de definir, ou simplesmente criar uma crosta de insensibilidade, como única forma de sobreviver, caracteriza as doenças mentais mais difíceis de tratar. Mesmo quando os doentes iniciam tratamento, tendem a desistir precocemente ou estar permanentemente a interrompê-lo . São processos longos que exigem resiliência e suporte emocional. Contudo existem soluções intermédias que permitem qualidade de vida e uma consciencialização progressiva das razões que sustentam a dor, motivando progressivamente para uma intervenção continuada mais efetiva. Provocar dor no outro para aliviar a sua nunca é solução. Por isso tantas vezes temos que cuidar daqueles que transportam a dor dos outros, carregados de culpa imputada e marcas profundas dos estilhaços que se confundem, já com o próprio sofrimento. Relações e sistemas mutilados pela doença não tratada. Apesar da tendência de alguns em esperar dos outros as respostas, que não encontram em si próprios, e chamar amor e amizade à necessidade de culpar e ou humilhar para sobreviver na sua infelicidade, a resposta é não aceitar manter-se nesse papel. Quando falamos de crianças e jovens têm que ser outros adultos a intervir não os deixando cristalizar nessa função. Quanto mais depressa for desvinculada esta relação de dependência disfuncional mais cedo se pode intervir, na origem e na ramificação do problema. A doença mental não é apenas um estilo de personalidade. De ambos os lados há quem sofra diariamente, em silêncio ou sem ressonância nos seus apelos de ajuda. É preciso estar atento e não ter medo de agir. Um conselho de amigo ou um sermão continuado não resolve quando falamos de doença ou perturbação mental. O tratamento passa pela ajuda especializada. Procurar e exigir do sistema respostas cada vez mais próximas das necessidades de todos é uma obrigação social e comunitária.