Análise

Não lhes basta bater no fundo

Foram vários os que em momentos distintos atentaram contra o que apregoam

Está a ficar perigosa a vida colectiva insular, pois foram muitos, em diversos contextos, que dispararam de forma imprudente. Nuns casos, as atoardas não fizeram vítimas. Noutros, o efeito ricochete foi tal que as ‘bazucas’ verbais rebentaram com estrondo nos pés dos que deviam dar à sola, mas que teimam em arrastar-se sem escrúpulos no pântano em que se movem.

Os lesados do PRR que salivam pelo dinheiro fresco, mas dizem mal do plano que não lhes dá margem para desvarios; os mentores das subversões às regras em vigor no combate à pandemia mereciam análise, mas por manifesta falta de espaço, limitamo-nos hoje a diagnosticar o que se passa no Nacional despromovido e que ignorou sinais e alertas lançados em tempo útil. Fizemos a nossa parte.

Não foi por falta de aviso. A meados de Janeiro, quando o Nacional somava derrotas inexplicáveis, alertámos para barretes koziellos, thils e afins, para atitudes displicentes e para desnortes evidentes. Nalguns fóruns, que ao contrário do Presidente do clube, recusamos adjectivar, fomos insultados.

Vários protagonistas eram desde bem cedo a imagem de todo um clube ‘ioió’ que se deixa encantar com o sobe e desce sistemático, por muito que seja aliciante estar na II Liga com orçamento de primeira e que prefere alimentar egos com vitórias morais do que com resultados desportivos.

Se na altura entendíamos que convinha acordar cedo, - embora essa não seja prática corrente na hierarquia do clube – também tínhamos indícios que erros recentes estavam a repetir-se. O Nacional necessitava de algo mais, porventura, de um sobressalto que tarda, mas disso não fez caso.

Em Abril voltámos à carga. Faltavam sete jogos para salvar a época de má memória. Em nome dos contribuintes madeirenses que pagam caprichos sem retorno evidente prometemos exigir responsabilidades sem contemplações. Aqui estamos para reprovar o colapso total da política desportiva do Nacional, clube que denota ser centro de emprego para dirigentes que poupam na qualidade do plantel para que nada lhes falte; que falhou na contratação de reforços, muitos do quais foram autores dos erros clamorosos que ditaram derrotas consecutivas no campeonato; que só jogou menos mal frente aos três ‘grandes’, o que num campeonato com 18 equipas configura um erro de cálculo básico; que não tolera a contestação, nem a sugestão e ainda por cima instiga jogadores contra adeptos; clube com pouca propensão para os negócios de milhões e manifesta incapacidade de potenciar os feitos dos anos de glória e da presença europeia; clube que, tal como o rival, recebe dinheiro público para promover a Madeira, nuance que dadas as tristes figuras que toda a gente tem visto deve ter efeito nulo ou até contraproducente.

Não admira que tenha batido no fundo em toda a linha, desportiva e estrategicamente. Haver dois candidatos à presidência até dava garantias de avanço civilizacional. Mas com base no que tem acontecido nas últimas horas é pena não ter surgido uma terceira via consistente, com propósitos inovadores que dignificassem a prática desportiva, o ecletismo do clube e a grandeza de uma marca que é internacional.

Um e outro candidato cometem equívocos primários que os sócios devem julgar. Rui Alves, assumido membro de honra da ala regional dos insubstituíveis e seguidor convicto da tribo que tem como lema “depois de mim o caos”, garante que é recandidato por temer que um clube “comandado por esta gente” em muito pouco tempo se pode destruir, colocando-o “novamente na antecâmara da morte”.

É grave que não tenha dado conta que o clube que lidera está a definhar há alguns anos. E não é só por causa das subidas e das descidas, antes por falta de projecto desportivo transversal, adaptado aos novos tempos e tendências.

É grave que atire para a lama o presidente da Assembleia Geral, acusando-o de pacto com a ilegalidade. Esqueceu-se de quem é Miguel de Sousa, do que fez pela Madeira e pelo clube, das razões que motivaram a que fosse sucessivamente convidado para ser o representante dos sócios e dos discursos nos jantares de aniversário que colhiam mais aplausos do que os seus?

É grave que tente resolver em tribunal com ameaças de processos-crime aquilo que qualquer líder respeitado leva com regularidade aos lugares próprios.

Daniel Meneses, assumido nacionalista que muitos desconhecem, lamenta “a sensação que o Nacional só pode ir a reboque de uma pessoa ou duas, e que sem essas pessoas o Nacional cai e morre” e que “tem havido falta de espaço para que os sócios possam participar, quer na vida activa do clube, quer em projectos para o próprio clube”. Enquanto sócio o que fez durante todos estes anos para além de ser cúmplice do ‘status quo’? Que massa crítica introduziu no clube para que este dependesse menos de um ou dois e se abrisse a mais, que não são tantos quantos os que se apregoam? E que ideia fracturante tem para revolucionar a colectividade?

Com um ou com outro, a manter-se este tipo de posicionamento atentatório da essência do clube, e sobretudo da sua diversidade, o Nacional não fecha pois é feito de gente, mas corre sérios riscos.