Crónicas

O bom, o mau e o circo

E chegamos ao final com a sensação que a história da água na Madeira não tem o destaque que merece

Do Ministério da Cultura, que nos trouxe grandes episódios como a resposta à crise vivida no meio cultural com um convite para um drink de fim de tarde, chega-nos a Lotaria do Património. O Governo, que celebrou o indigente 1% reservado à Cultura no Orçamento do Estado, recorreu ao jogo para compensar aquilo que não quis financiar. “Compre um raspa e ajude a salvar o nosso património cultural”, resume o plano de quem tem a missão de gerir a Cultura em Portugal. A ideia é tão boa, que promete continuidade. Depois da lotaria, teremos o Totobola da TAP, o Euromilhões do Serviço Nacional de Saúde e, quem sabe, a Raspadinha do Novo Banco.

O bom: Visita Guiada

As levadas. A grande epopeia madeirense feita por homens de quem a História não guarda memória. Por isso, a vinda do Visita Guiada à Madeira, um programa da RTP sobre peças da cultura portuguesa, para falar sobre as levadas é um momento que merece registo. Ao longo de 48 minutos, Paula Moura Pinheiro, acompanhada do excecional Raimundo Quintal, falam-nos de como as levadas se confundem com a nossa história e de como foram as veias que deram sustento a gerações e gerações de madeirenses. Se há programas de televisão obrigatórios este será, certamente, um deles. Raimundo Quintal explica-nos como a água se fabrica na Laurissilva. Revela-nos que as primeiras levadas ultrapassavam vales através de enormes vinháticos perfurados. Fala-nos da importância da comissão dos aproveitamentos hidráulicos ou de como Afonso de Albuquerque, impressionado com a dimensão do feito madeirense, quis desviar o Rio Nilo com os homens que escavaram as levadas. Ao longo do programa, a história das levadas é partilhada com a ajuda de belíssimas imagens da paisagem que, também elas, ajudaram a desenhar. E chegamos ao final com a sensação que a história da água na Madeira não tem o destaque que merece. Não tem museu, não é ensinada na escola, mas tem entusiastas que produzem programas como o Visita Guiada, ou o documentário regional Levadas da Madeira, que nos recordam que os mais de 3 mil quilómetros de levadas são um dos nossos monumentos mais valiosos.

O mau: Conflito Israel-Palestina

Na guerra não há bons e maus, os que têm mais ou menos razão, nem sequer vencedores e vencidos. Dos conflitos armados apenas resultam vítimas. Muitas. De todos os lados. O conflito que opõe Israel à Palestina não é exceção. Na verdade, revela bem o acerto do argumento. Para percebê-lo, a história da relação entre israelitas e palestinianos não é essencial, até porque ocuparia o resto desta crónica. Para simplificar, basta-nos registar que os dois lados são agressores entre si. O que não permite simplificação, é a identificação de quem estamos a falar. Israel é um só, mas Palestinas há muitas. Gaza não é a Cisjordânia, nem todos os palestinos fazem parte do Hamas e Jerusalém é todo um outro assunto. Se calhar esse é o primeiro erro de quem escolhe um dos lados da trincheira. Quem rotula Israel de poderoso opressor, não pode esquecer o direito que os israelitas têm a defender-se. E quem apelida os palestinianos de terroristas, tem de reconhecer que o Hamas utiliza os residentes em Gaza como escudos humanos. Os rótulos são uma censura prévia que poupam tempo, mas causam enorme desconhecimento. Esse é o único ponto desta crónica. É possível ser solidário com os palestinianos sem ser defensor do Hamas, da mesma forma que é legítimo reconhecer o direito à defesa dos israelitas, sem ser defensor da política de Netanyahu. E na contabilidade deste conflito, feita entre a quantidade de rockets disparados contra Israel e a barragem de bombardeamentos que varreu a Palestina, há apenas um número relevante. 66 crianças mortas, só na última semana. Ainda acha que uma trincheira é melhor do que a outra?

O circo: Regras de acesso à praia

Escafandros e réguas em riste. Foi aprovado o novo regime jurídico de idas a banhos. De um qualquer escuso gabinete ministerial, povoado por assessores especializados em direito balnear, saíram as regras para quem quiser ir à praia no Verão. Tome nota, porque há muito a ter em conta. As tolhas deverão estar separadas por 1,5 metros entre si. Mas tenha atenção, os chapéus-de-sol devem manter uma distância mínima de 3 metros. Quer alugar uma cadeira de praia? Tem de escolher entre a manhã ou a tarde, para permitir a rotatividade de utentes. Jogar com umas raquetes? Dar uns toques na bola de futebol? Tenha juízo! Desporto na praia só a ler um livro em ritmo acelerado. E não se esqueça dos chinelos. A sua utilização é obrigatória quando se desloca ao bar para tomar um gelado. E para fiscalizar este manancial de regras, distanciamentos, horários, semáforos, sentidos de circulação e afins, teremos a Polícia Marítima de fita métrica no coldre e terminal de pagamento automático para cobrar a respetiva multa. Tudo enquanto preparam uma importante apreensão de geleiras carregadas de bolas de berlim, por manifesto perigo para a saúde pública.