Madeira

A história de Policarpo, o madeirense surdo que mais lutou para ter carta de condução

No Canal Memória de hoje veja o que foi notícia no DIÁRIO a 19 de Maio de 1991

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Há precisamente 30 anos, o DIÁRIO revelava o caso de Manuel Policarpo Chaves, um madeirense com deficiência auditiva profunda que lutou contra tudo e contra todos para realizar o sonho de tirar carta de condução. Conseguiu alcançar o seu objectivo ao fim de 10 anos de tentativas. Foi o segundo surdo a obter o título na Madeira.

A reportagem assinada pela jornalista Eker Melim (hoje Eker Sommer) descrevia que Policarpo era natural da freguesia do Faial e que ficou surdo devido a uma meningite na infância. Quanto tinha 8 anos, a sua família mudou-se para o Funchal, onde frequentou o Instituto de Surdos e estudou na Escola Francisco Franco. Em 1978, aos 13 anos, concluiu o curso geral de mecânica. Trabalhava no Centro Ortopédico do Funchal (Irmãos Machado) na Rua da Conceição e considerava-se um “homem feliz”. Mas queria concretizar o sonho de criança de ter “um carrinho”.

Precisava de carta e para isso inscreveu-se em 1981 numa escola de condução do Funchal. Devido à sua limitação física, muniu-se de um atestado médico que o classificava de “apto” para possuir o referido título. Frequentou 22 lições práticas e 15 teóricas com o instrutor Manuel de Freitas. Conseguiu passar no exame de código mas não lhe permitiram fazer o exame de condução porque não estava “habilitado” a ter carta. Mas Policarpo não desistiu. Pediu apoio à Associação Portuguesa de Surdos. Submeteu-se a duas juntas médicas, com um intervalo de vários anos, que o classificaram de “inapto”. Entretanto, viu um amigo com o mesmo problema emigrar para a Suíça, onde tirou carta. “Ele lá conseguiu, enquanto eu, aqui, continuava a tentar”, descrevia.

Sem nunca perder a esperança, Policarpo voltou a inscrever-se na escola de condução e teve as lições obrigatórias com o mesmo instrutor, que o considerava “um aluno extraordinário”. “Eu sempre defendi que os surdos podem ter carta de condução. São pessoas que devido à sua condição desenvolvem os reflexos, tornando-os muito rápidos, para além de que estão sempre extremamente atentos”, explicava Manuel de Freitas na mesma reportagem.

No início de 1991, o aluno submeteu-se a nova junta médica, que, finalmente, o autorizou a fazer o exame de condução. Fez o exame em Abril de 1991 e passou. “Em 20 minutos consegui aquilo pelo qual lutei durante dez anos. Quando o eng.º Freitas Branco disse que, finalmente, já podia contar com a carta de condução, não pude deixar de chorar”, recordou.

Hoje, Manuel Policarpo Chaves tem 62 anos.

Descarregue aqui a edição do DIÁRIO de 19 de Maio de 1991 e veja o que foi notícia nesta data.