"A desigualdade combate-se todos os dias, também neste parlamento"
“Estou há pouco mais de um ano e meio como Presidente da Assembleia Legislativa da Madeira e devo dizer que este é dos atos que mais me alegram, que tem maior simbolismo para o parlamento, que engradece mais esta casa da democracia, porque traz aqui um tema que é transversal a todas as correntes políticas, a todos os quadrantes partidários.”, afirmou José Manuel Rodrigues, na manhã desta segunda-feira, na cerimónia de abertura da instalação artística “Eva”, no átrio do parlamento regional, um projeto itinerante da Associação OLHO.te, inserido no âmbito das comemorações do Dia Internacional da Mulher, que se assinalou no passado dia 8 de março. EVA tem nome e corpo de mulher para lembrar que é preciso persistir na luta pelos direitos e pela dignidade de todas as mulheres que são, todos os dias e de tantas maneiras, marginalizadas, esquecidas e/ou violentadas.
O presidente da Assembleia Legislativa agradeceu à associação OLHO.te ter escolhido “a casa da democracia e da Autonomia” para acolher esta iniciativa, notando que a presença de EVA vem “lembrar o quão distantes ainda estamos de cumprir os direitos humanos, no que à mulher diz respeito.” José Manuel Rodrigues sublinhou que “a desigualdade combate-se todos os dias, também neste parlamento, através da voz das senhoras deputadas e dos senhores deputados, e que se há coisa que ainda nos deve afligir e atormentar é o facto de termos, ainda, na Região e no país, as altas taxas de violência doméstica e de mortalidade das mulheres vítimas desta.” “É inadmissível e é terrível que ainda tenhamos estes números em 2021”, acrescentou, sem esquecer a questão da “desigualdade salarial, na ordem dos 30%, em relação aos homens”, aspeto que, segundo o líder do primeiro órgão de governo próprio da Região, “tem, obviamente, de ser corrigido”. Não obstante os “passos positivos” que vêm sendo dados em prol da igualdade de género, José Manuel Rodrigues considera que “estamos, ainda, longe daquilo que é desejável” e evocou um verso de “Cantata de paz”, poema de Sophia de Mello Breyner - “Vemos, ouvimos e lemos / Não podemos ignorar” - para lembrar que “não podemos ter os olhos vendados perante as injustiças”.
“Sei que vêm aqui com um objetivo nobre, que é o de chamar a atenção das senhoras deputadas e dos senhores deputados, e do Presidente da Assembleia, para a necessidade de haver paridade, também, na vida política, designadamente a nível parlamentar. A boa notícia é que esta é a legislatura com mais mulheres no parlamento da Madeira. A má notícia é que ainda estamos longe da paridade entre mulheres e homens”, afirmou, destacando que “na revisão eleitoral que vier a ser efetuada, e que está a ser apreciada no âmbito da Comissão de Aprofundamento da Autonomia e da Reforma do Sistema Político, estou convencido de que os senhores deputados terão em consideração a necessidade de caminharmos gradualmente para uma paridade entre homens e mulheres.” Neste capítulo, José Manuel Rodrigues regozija-se pelo facto de as principais chefias da Assembleia legislativa da Madeira serem femininas e por liderar um gabinete constituído por onze elementos, dentre os quais sete são mulheres. Números que, segundo o presidente do parlamento, “são fruto, não de nenhuma lei da paridade, mas do trabalho, do mérito e da competência destas mulheres”.
O Presidente da OLHO.te, Hugo Castro Andrade, abrilhantou a cerimónia com a declamação de um poema alusivo à temática abordada, numa performance que foi um pouco mais além. O artista desafiou os presentes a escutarem o poema de olhos vendados, por forma a tornar mais intensa a experiência. “Podem contar com a Associação OLHO.te, que não tem cor política partidária, e tem um objetivo e um foco para a construção de uma sociedade mais justa, coesa e participativa, para elevar o nome Madeira em todo o mundo, um mundo voltado para o diálogo, para a paz e para os direitos humanos.”, vincou. Hugo Castro Andrade inspirou-se na figura bíblica feminina Eva e no paradigma do feminino no Cristianismo, bem como no pintor surrealista belga René Magritte e a traição das imagens: “Ceci n’est pas une pipe”.
“Esta instalação cria espaços onde todas e todos podem falar e ser ouvidos, onde dor e esperança podem ser partilhados, encontrando formas de trabalhar em conjunto.”, lê-se na sinopse do projeto. “Eva” é um trabalho de arte participativa, erigido por Hugo Castro Andrade, tendo contado com a colaboração de mais de meia centena de pessoas de várias idades, géneros etnias. Antes de chegar ao átrio da Assembleia Legislativa da Madeira, mostrou-se nos seguintes locais: Câmara Municipal do Funchal, Secretaria Regional de Equipamento Social e Conservação, Junta de Freguesia de São Martinho, Teatro Municipal Baltazar Dias, Associação Monte de Amigos e Tribunal Judicial da Comarca da Madeira. Do parlamento, onde permanecerá até à próxima sexta-feira, dia 21 de maio, rumará à Câmara Municipal de Santa Cruz.