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Desafio(s) do Futuro: Natalidade e Educação

1. Em 1976, dois anos após o 25 de Abril – e ano das primeiras eleições para a Assembleia Legislativa da Madeira –, Portugal tinha uma população residente de pouco mais de 9 milhões e 350 mil cidadãos e, nesse ano, nasceram 186 712 nados-vivos. Em 2020, ano em que fomos forçados a repensar o presente e a redesenhar o futuro, este número situou-se em apenas 84 296, menos cerca de 102 mil, e na ilha da Madeira e Porto Santo somente 1830, valor que segue uma clara tendência de decréscimo na fecundidade e que representa o segundo mais baixo valor de sempre. Convoco o leitor para um particular pormenor: no início dos anos 70, nasciam na Região Autónoma da Madeira mais de 6 700 nados-vivos, e só nas últimas duas décadas tivemos uma queda de 76%. No mesmo ano (1976), a idade média das mães ao nascimento do primeiro filho era de 23,7 anos, a taxa bruta de natalidade fixara-se nos 19,8%, a taxa de mortalidade de crianças com menos de um ano de idade por cada 1000 nascimentos era de 33,4% e a população residente analfabeta com 10 e mais anos era de quase um milhão e oitocentos mil portugueses, ou seja, 25,7% (de acordo com os Censos).

Entretanto passaram 47 anos do fim da ditadura, mais de 4 décadas de “descobertas”, de tentativas e erros que convergiram neste presente “instável” que confiamos agora às mais jovens e bem qualificadas gerações. Vivemos um momento/período em que como país, nós portugueses deixamos de ter filhos em número suficiente para assegurar a renovação das gerações. Desde 1982 que o número de filhos tem vindo a diminuir no país e os números registados não permitem já essa substituição, e por isso somos hoje um país de filhos únicos (eu próprio), onde há cada vez menos crianças, mas, conjuntamente um país que no espaço de quase meio século muito se metamorfoseou e alcançou uma esperança média de vida inimaginável em 1974, e por esta razão estamos mais velhos! Lamentavelmente, “fazer nascer” deixou de ser uma prioridade para os jovens casais – e sucessivos Governos – (para além de perto de 15% dos casais portugueses sofrerem de infertilidade), até porque a alteração do estatuto da mulher na sociedade portuguesa fê-la ter novas ambições/projetos de vida (e muito bem!), um trabalho a tempo inteiro, educação superior, acesso a novas profissões e carreiras, e isso, claro, significou uma redução considerável na taxa de fecundidade e natalidade, a que se junta uma quase ausência de políticas governamentais de incentivo e apoio à natalidade e às famílias. Alguns governantes acreditam que será apenas um cartão “Kit bebé”, no valor de 400 ou 500 euros, que estimulará por si só a natalidade e que promoverá o tão desejado acréscimo da fecundidade na Região, mas estão manifestamente equivocados e os dados oficiais comprovam-no! São precisas outras e estruturantes medidas – não apenas financeiras – que beneficiem as famílias que querem ter filhos, e em particular aquelas que desejam ter um segundo ou terceiro filho. Assim, se nada mais for feito, Portugal e a nossa Região continuará a assistir ao decréscimo da sua população e, entre os vários cenários possíveis, um é certo: no futuro seremos efetivamente menos!

Segundo as projeções do INE, e num cenário “otimista”, em 2030, seremos apenas 10 milhões de portugueses, em 2050, perto de 9 milhões e 200 mil, e em 2080, menos de 7 milhões e meio, ou seja, estamos perante um claro quadro de poucos nascimentos e de mais saídas do que entradas no nosso território. Infortunadamente, o nosso país é já hoje o 3º mais envelhecido da Europa e o 5º mais envelhecido do mundo, e prevê-se que em 30 anos ocupe o primeiro lugar neste ranking europeu, e que seja já em 2030 o 3º mais envelhecido do planeta, sabendo nós, de antemão, o que tudo isto acarreta para um sistema/estado social como aquele que temos em Portugal (e na Europa). Por outras palavras, desde 2020 que Portugal atravessa aquilo que o demógrafo francês, Gérard-François Dumont, designou de “Inverno Demográfico”. A imagem não é animadora – com uma reduzida taxa de natalidade e o envelhecimento a que ela em grande parte nos conduz, não esquecendo o despovoamento e desertificação de parte do território nacional, sobretudo interior (algo idêntico ao que assistimos em algumas concelhos e freguesias da Região) – e aponta um rumo/futuro que precisa de ser invertido, ou pelo menos mitigado. É indispensável garantirmos aos portugueses a possibilidade de terem os filhos que desejam, e nós sabemos que essa vontade ainda permanece intacta em muitas famílias portuguesas, para além um suporte de políticas que permitam aos jovens casais poderem conciliar melhor a sua vida profissional com a vida familiar.

2. Acreditar no futuro de um país ou Região é acreditar nos mais jovens, aqueles que são hoje os mais qualificados de sempre, que se movem num mundo bem diferente do passado e que é cada vez mais acelerado, imprevisível, volátil e global.

A Educação mudou muito o (e no) nosso país nas últimas décadas e ela determina como será o futuro, nas próximas! É de suprema importância a formação dos recursos humanos, a preparação e composição de novos (e mais) talentos, pois é isso que nos colocará noutro patamar e com outra capacidade para atrair investimentos e gerar riqueza sustentável – mas também desenvolver socialmente o país –, e para tal é necessário termos pessoas preparadas, com as competências e conhecimentos necessários para o fazer!

Há, sem grande dúvida, uma extraordinária diferença entre o país que saiu da Revolução de 1974 e o atual. No início dos anos 80 apenas 2,4% da população portuguesa tinha concluído o ensino superior e esse valor subiu para quase 20%, em 2019. Temos hoje jovens capazes de se afirmarem no mercado global e os programas ou barómetros internacionais de avaliação dos alunos sublinham uma clara melhoria do ensino nas últimas décadas (apesar de termos uma taxa de abandono escolar das mais altas da União Europeia; dados de 2019 referem que apenas 1 em cada 4 adultos tem o ensino secundário completo). Mais: em 1970, quatro anos antes de Portugal se tornar um país democrático, um em cada quatro portugueses não sabia ainda ler nem escrever. De facto, a aposta e o investimento na Educação era uma necessidade do passado, mas esta deve continuar a ser explorada no presente e mantida no futuro!

Existem evidentes indícios de que no futuro muito será diferente. A “regeneração geracional” revela que seremos inevitavelmente mais qualificados e que nas próximas décadas poderemos finalmente almejar recuperar o atraso educacional que há mais de meio século nos assombra. Atualmente, no mundo o processo de mudança e atualização tecnológica está constantemente a acelerar e, portanto, precisamos de indivíduos e sociedades que tenham a capacidade de aprender incessantemente e esta capacidade é ela mesma um desafio para toda a sociedade. O grande desafio do momento presente – e principalmente do futuro –, para além da transição digital e da utilização da tecnologia é, de facto, aprender. Será a inovação, a criatividade, o acesso à informação e a fontes de conhecimento (e a modernização da nossa economia), que vão gerar valor nas sociedades do futuro, pois a automação e robotização dos processos produtivos (ou seja, do trabalho), que está já em curso, dará alguma resposta aos problemas que a demografia nos apresenta, mas precisa de mão de obra altamente qualificada e especializada. O nosso atual modelo de ensino, assente em pressupostos já ultrapassados (com currículos e metodologias visivelmente desajustadas), no qual a memorização (até de alguma informação arcaica e irrelevante) e a uniformização são competências intensa e repetidamente valorizadas, está claramente obsoleto e desalinhado com as necessidades presentes e de uma nova revolução industrial – a revolução 4.0 ou digitalização – que se centra nas novas Tecnologias de Informação e que tem a capacidade de esbater distâncias físicas, aproximando produtores, clientes e consumidores. Lamentavelmente, as nossas escolas continuam a avaliar os alunos pela capacidade de informação repetida (pela “conformidade” e concordância) e não pela resolução de problemas; continuam a não preparar os jovens para a incerteza, para o “arriscar”, errar/falhar, ou seja, para novas formas de trabalhar, de inovar, para uma capacidade empreendedora, para o desenvolvimento de um pensamento independente, criativo, autoconfiante e crítico. Em suma, num futuro e mundo onde a ciência e tecnologia assumirão um papel ainda mais determinante, as escolas precisam de encontrar novas formas de educar e de construir cidadãos (e uma sociedade) onde todos possamos (e apreciemos) viver.