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Enriquecimento ilícito

Comecei por tentar escrever sobre a “Operação Marquês”, porém provocou-me tal vómito que parei para repensar mas o teclado do computador parecia embruxado e obrigou-me a tecer algumas linhas para exprimir a minha perplexidade, igual à de tantos cidadão, como eu, indignados pela forma impune como se rouba e vilipendia no nosso país. Não importa se é o Sócrates, o Salgado, o Vara, o Bava, o Isaltino, o Lima e tantos outros que já se torna exaustivo nomeá-los e mais difícil arranjar uma prisão com dimensão para enjaular todos estes seres esquálidos que semeiam mais miséria no país. Interessa, sim, exprimir a revolta pela justiça calamitosa que temos, da nossa legislação que iliba os canalhas de colarinho branco e condenam aqueles que não têm posses financeiras para interpor recursos nos tribunais. Não, não podemos aceitar uma justiça para ricos e outra para pobres. É minha convicção que, à luz da nossa legislação, ninguém chegará a ser condenado por muito que corrompa ou seja corrompido.

Fala-se de novo, numa lei sobre enriquecimento ilícito para tentar tapar, à pressa, os furos manhosos, que eles sabem existir na legislação atual, mas só porque sentem a indignação na população e tentam alisar a onda, até o povo esquecer. Existe um emaranhado de leis mas com muita forma de contorna-las valendo-se da alínea x do artigo y para ultrapassar a questão e quando não conseguem contornar vão protelando até que o crime prescreva. Apenas um exemplo: Os mais atentos conhecem o modelo 1649, formulário eletrónico para declaração de rendimentos e controle público da riqueza dos titulares de cargos públicos, o qual já existe a alguns anos e deveria ser entregue no Tribunal Constitucional, ou seja, quando um individuo assume um cargo público é obrigado a preencher essa declaração. Ali constaria que quando assumiam o cargo, não tinham bens, tinham um carrito que só andava a descer e magra conta bancária, passados alguns anos saem do cargo ostentando um rico patrimónios, um bólide de alta cilindrara, bons prédios e chorudas contas bancárias. O Tribunal Constitucional, o DCIAP, o Ministério Público ou quem de direito, pergunta-lhes de onde proveio tal fortuna em tão pouco tempo? Bastava começar por aí se eles tivessem (mas não têm) que provar a proveniência de tais fortunas. Quantos conseguiriam justifica-las? Maria José Morgado, figura central do M P no combate à corrupção, tem razão quando diz que a corrupção é viral e é preciso quebrar as cadeias de contacto. O pior de uma justiça paupérrima é que cria um pântano de águas pestilentas onde se move a corrupção; São políticos, juízos, empresários, advogados, e até figuras relevantes do clero, um autêntico terrorismo de formato financeiro. E ninguém põe mão nisto? Não, não põem porque parece que ao legisladores interessa leis dúbias que depois cada um interpreta à sua maneira e os casos vão se arrastando indefinidamente nos tribunais. Até os governantes e os deputados na A. República parece que fazem vista grossa ao aprova-las, quem sabe, venham delas aproveitar-se mais tarde. Nem lhes interessa saber que num ranking de 180 países, Portugal encontra-se cotado na 33ª posição no que respeita a corrupção. Não, não estou a ser duro nas palavras, pois os resultados falam por si. Nesta “operação marquês” em concreto, alguém fez mal o seu trabalho, por negligência ou má fé; polícia judiciária, ministério Publico, DCIAP, funcionários judiciais ou Juízos pois só assim se compreende que crimes por corrupção, os mais difíceis de provar por via da da legislação portuguesa, prescrevam em tão pouco tempo e só assim se percebe que nunca haja culpados.

Ilustro este texto com uma frase da filósofa russo-americana, Ayn Rand, fugitiva da revolução russa, que já em 1920, fazia esta estranha previsão do futuro, a qual 100 anos depois é uma triste realidade: “Quando você perceber que, para produzir, precisa obter autorização de quem nada produz; quando comprovar que o dinheiro flui, não com bens, mas com favores; quando perceber que muitos ficam ricos pelo suborno e por influência, mais que pelo trabalho, e que as leis não nos protegem deles, mas, pelo contrário, são eles que estão protegidos de você; Quando perceber que a corrupção é recompensada e a honestidade se converte em auto sacrifício; Então poderá afirmar, sem temor de errar, que a sua sociedade está condenada.

Previsões existem, sobre o clima, sobre a corrupção, sobre a natureza, sobre as pandemias mas, nem mesmo assim, a cegueira do homem tem limite. Já me atrevo a vaticinar que tal como Cristo veio ao Mundo, há dois mil e tal anos, lembrar a degradação humana, o covid-19 veio para lembrar que os gananciosos não levam nada deste Mundo mas, enquanto cá andam atropelam gente honesta.