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Morreu o cantor Artur Garcia, nome da música ligeira portuguesa da década de 1960

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O cantor Artur Garcia, que morreu hoje aos 83 anos, foi "um dos mais reconhecidos cançonetistas/atores da sua geração", que alcançou particular sucesso na década de 1960, como destaca a Enciclopédia da Música em Portugal no Século XX.

"O seu estilo interpretativo insere-se nos moldes da música ligeira da época, privilegiando a clareza da enunciação do texto", lê-se na enciclopédia, dirigida pela musicóloga Salwa Castel-Branco.

Nascido em 15 de abril de 1937, Artur Garcia morreu hoje, na Aldeia de Juzo, em Cascais, a um dia de completar 84 anos. A sua morte foi comunicada à Lusa pelo agente artístico António Fortuna.

Como outros nomes da sua geração, Artur Garcia frequentou o Centro de Preparação de Artistas da então Emissora Nacional, tendo-se dado a conhecer através de programas como "Gente Nova ao Microfone" e "Serões para Trabalhadores".

O cantor estreou-se em disco, aos 23 anos, em 1960, na Rádio Triunfo, com um EP de originais, que o levou, pouco depois, para as edições Valentim de Carvalho, onde gravou também versões portuguesas de êxitos internacionais da época.

Filho de um ator amador, Artur Garcia iniciou, no entanto, carreira aos 14 anos, no contexto das coletividades de Lisboa, tendo participado no programa "Andam Cantigas no Ar", da Rádio Graça.

Na década de 1960, foi figura assídua dos ecrãs televisivos, nomeadamente no programa "Melodias de Sempre", onde fez duetos com Gina Esteves, Fernanda Soares, Madalena Iglésias, Simone de Oliveira e Maria de Lourdes Resende.

O intérprete, natural de Lisboa, gravou, também um EP de duetos com Maria Clara (1923-2009).

Artur Garcia foi eleito Rei da Rádio, em 1967, e Príncipe do Espetáculo, em 1969.

Fora de Portugal, atuou sobretudo para comunidades portugueses nos Estados Unidos, Canadá e em França. Entre outros países, atuou igualmente nos antigos territórios de África, então sob administração portuguesa.

Em Espanha, atingiu aceitação junto do público, chegando mesmo a ser um dos artistas da editora Discos Marfer, onde permaneceu durante a segunda metade da década de 1960 e o início da seguinte, até 1972, e para a qual gravou a maior parte da sua discografia.

Participou em diversas edições do Festival da RTP da Canção, nomeadamente nas duas primeiras, em 1964 e 1965, sem nunca atingir vitória. Em 1967, interpretou "Porta Secreta", uma canção composta pelo autor de "Ele e Ela", Carlos Canelhas, com a qual atingiu o 5.º lugar, a sua melhor posição no certame, e que se revelou um dos maiores êxitos da sua carreira.

A última vez que tentou representar Portugal na Eurovisão foi em 1974, com "Dona e Senhora da Boina", que ficou a meio da tabela.

Venceu, porém, por três vezes, o Festival da Figueira da Foz, e a sua presença marcou os festivais de Espinho, Atlântico, Mediterrâneo e o de Aranda del Duero, que venceu em 1967 com "A Dança do Mundo", e que lhe abriu as portas para várias atuações em Espanha.

Participou como ator e cantor em várias peças e filmes.

No teatro destacam-se espetáculos como "Todos ao Mesmo" (1965), "Frangos na Grelha" (1971), "Meninas vamos ao Vira" (1978) e "Mamã eu quero" (1998).

Na RTP participou em "Romance na Serra" (1961) e "Pátio dos Milagres" (1962), entre outras produções.

Do seu repertório fizeram sucesso canções como "Casaca Azul e Ouro", "Como o Tempo Passa", "Olhos de Veludo" e "Lobos da Cidade", de autores como Tavares Belo, Nóbrega e Sousa e Ferrer Trindade, além de Carlos Canelhas.

De 1978 a 1998, com menos atividade nos palcos, foi proprietário de uma loja de discos, em Lisboa. Manteve, no entanto, o contacto com as comunidades portuguesas, nomeadamente numa digressão aos Estados Unidos, em 1977, que partilhou com Amália Rodrigues.

Em 1989, foi um dos artistas que atuou em Lisboa, na Gala da Associação para a Valorização do Chiado, quando passava menos de um ano sobre o incêndio.

Em 2005, no dia do seu aniversário, a Câmara de Lisboa assinalou os 50 anos de sua carreira com a produção de um espectáculo no Fórum Lisboa. A data remetia para a sua entrada no Centro de Preparação de Artistas da Emissora Nacional, em 1955.

Em 2007, recebeu a Medalha de Mérito Municipal da capital portuguesa.

Em 2012, atuou na gala da Rádio SIM e, em 2013, juntou-se ao projeto "Encontros com Vida", da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, que promovia pequenos concertos, teatro e danças de salão, nos seus lares.

Em 2015, foi um dos artistas que participou no espetáculo "Scarllaty - 40 Anos, A Vida à sua Maneira", dedicado a Guida Scarllaty, a personagem criada por Carlos Alberto Ferreira, pioneiro do transformismo em Portugal.

Quando da homenagem municipal a Artur Garcia, pelos 50 anos da sua carreira, em 2005, o cantor disse à Lusa "ter tido a sorte de ter começado num período de ouro da música portuguesa, de grandes autores e compositores".

Reconhecendo os "altos e baixos" e "a travessia no deserto", garantiu, todavia, "guardar os melhores momentos" do seu percurso, que não associava aos êxitos, mas sim ao "contacto humano".

"Vendi milhares de discos", afirmou então o cantor que editou mais de 250 títulos. "Se naquele tempo fossem dados discos de ouro pelas vendas, eu teria a casa forrada a ouro", garantiu.

"Sou avesso a homenagens, mas fiquei muito satisfeito e contente por a Câmara de Lisboa se ter lembrado de mim, que sou um filho da cidade e tenho uma carreira que foi feita pelo povo e pelo meu próprio esforço", disse Artur Garcia, horas antes de subir ao palco do Fórum Lisboa, em 15 de abril de 2005.