Comércio para turistas está em "hibernação"
O comércio especializado para turistas nas zonas históricas das cidades portuguesas não conseguiu adaptar-se na pandemia, encontrando-se em "estado de hibernação" à espera que a "tormenta passe", ao invés do comércio tradicional, que ganhou outra importância, segundo um investigador.
Em declarações à agência Lusa, o especialista em comércio tradicional João Barreta explicou que o comércio que estava a ser uniformizado para não residentes, em 2019, está "em estado de choque".
Na sua maioria, ainda não se adaptou: a procura que tinha como origem o turismo praticamente terá desaparecido e a oferta está na expectativa de que tudo regresse àquilo que muitos consideram o 'novo normal. João Barreta
De acordo com o especialista, mestre em Gestão do Território, a ideia de proximidade "ganhou uma importância decisiva" no contexto pandémico, reforçando a confiança e a segurança dos consumidores.
"Os consumidores de antes transformaram-se, por força da insegurança e da desconfiança face à situação pandémica, em meros compradores que adquirem o básico e o essencial, claro que quanto mais perto de casa melhor, sem querer correr quaisquer riscos", salientou João Barreta, referindo que o setor alimentar foi o que mais cresceu, a par das farmácias.
O investigador lembrou que, devido à alteração de hábitos de consumo, muitas pessoas passaram a cozinhar em casa, dando prioridade à aquisição de alimentos em mercearias de bairro, embora se mantenham as idas a médias e grandes superfícies.
João Barreta considerou que a crise atual "constitui uma oportunidade" para os pequenos empresários do comércio tradicional.
"Mostrou ter oferta que responde à procura, revelou-se disponível, adaptou-se e, acima de tudo, disse 'presente', transmitindo a segurança e a confiança pelas quais a procura tanto anseia. A oportunidade traduziu-se em afirmar-se perante a sociedade, perante a procura, perante a concorrência", assinalou.
No fim da pandemia, considerou, seria importante "não deixar esmorecer o entusiasmo" gerado no comércio local.
Sobre o encerramento de alguns negócios que estavam dependentes do turismo, João Barreta reconheceu que se devia compreender o que se "vivenciava antes da pandemia".
Os negócios dependentes de uma procura protagonizada pelo turismo são uma situação que merece uma análise diferente. Foram negócios que cresceram de forma proporcional ao 'boom' do turismo, sendo que a queda abrupta deste fez com que muitos negócios pura e simplesmente parassem e alguns tenham mesmo cessado. João Barreta
Relativamente ao futuro pós-pandemia, João Barreta sublinhou que há muito trabalho a fazer e que os poderes governamentais devem refletir mais sobre o comércio local.
"O trabalho que nos espera, como sociedade, passa em primeiro lugar por reconhecer a situação de alguma 'anormalidade' que já se vivia há algum tempo (daí ser 'velha'), antes da pandemia, e tratar de fazer acontecer um 'novo normal'. A nível dos poderes governamentais (administração central e local) e no que concerne ao comércio de proximidade, há que refletir com o que nos está a acontecer e, acima de tudo, aprender, aprender muito", indicou.
Os dois primeiros casos de pessoas infetadas em Portugal com o novo coronavírus foram anunciados em 02 de março de 2020, enquanto a primeira morte foi comunicada ao país em 16 de março. No dia 19, entrou em vigor o primeiro período de estado de emergência, que previa o confinamento obrigatório, restrições à circulação em Portugal continental e suspensão de atividade em diversas áreas.
A suspensão ou restrição de atividade em variados setores, como restauração, comércio, turismo e cultura, entre outros, elevou o número de falências em Portugal, agravou situações de precariedade e provocou aumento do desemprego.