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Marcelo foi mestre da comunicação mas fugiu a temas sociais importantes

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O sociólogo Manuel Carvalho da Silva considerou que Marcelo Rebelo de Sousa mostrou ser um mestre da comunicação no mandato que está a terminar, mas optou por nunca abordar temas socialmente importantes como a corrupção ou o trabalho.

"Neste seu primeiro mandato, Marcelo inovou essencialmente na comunicação. Ele é um mestre da comunicação moderna, com muitos anos de experiência. Mas pode ter sido uma mudança excessiva e deixar uma herança complicada", disse Carvalho da Silva, comentando o Presidente que tomada posse para um segundo mandato na terça-feira.

Para o investigador social, o facto de o Presidente da República ser um bom comunicador e ser popular há tanto tempo agrada às pessoas.

Carvalho da Silva salientou que Marcelo Rebelo de Sousa tem um estilo próprio, "quase absolutamente diferente de todos os presidentes anteriores", embora tenha considerado que esse estilo "tem coisas boas e menos boas".

"É um estilo ancorado na sua personalidade, e que resulta do que fez ao longo da sua vida: está lá a marca do professor de direito, do conhecedor da Constituição da República e sobretudo do polarizador", afirmou.

Carvalho da Silva considerou positivo que o Presidente, com o seu estilo próprio, se tenha distanciado "de alguma charlatanice que por vezes usava quando era comentador televisivo".

"O que marca também este estilo é um protagonismo aberto que às vezes chega às forças governativas, o que não lhe compete e, por vezes, na relação com os partidos, cheira a interferência", afirmou.

O ex-sindicalista referiu ainda que Marcelo Rebelo de Sousa "defende sempre em público a governabilidade, do ponto de vista do ancoradouro para o exercício da governação".

Mas considerou que isto é reflexo da sua "apetência por estar sempre em cena e a influenciar".

"Vamos ver como será o segundo mandato, pois pode trazer surpresas, boas ou más", disse.

Um aspeto positivo apontado por Carvalho da Silva foi o facto de o Presidente da República (PR) ter reconhecido o Governo da geringonça e o ter ajudado a consolidar-se.

"Marcelo, com a sua postura e inteligência, teve uma atitude de reconhecimento da geringonça. Dado que existia antes uma ideia persistente de que o Governo tinha legitimidade suspeita e Marcelo interpretou que a situação era mesmo sólida, adaptou-se, integrou-se e ajudou o Governo a consolidar-se, o que foi positivo", afirmou à Lusa.

Em contrapartida, o sociólogo apontou como negativo o facto de Rebelo de Sousa se dirigir diretamente às pessoas, mas secundarizar as instituições de intermediação da sociedade.

"Existe a ambição, o objetivo claro de ligação direta às pessoas e as pessoas gostam, mas o populismo também se alimenta disto. no entanto, não considero que o PR tenha uma postura de populismo, tal como se conhece hoje", referiu.

Mas, para Carvalho da Silva, "esta ligação direta às pessoas gera um problema: a secundarização das instituições de intermediação da sociedade".

Lembrou a propósito que, quando Marcelo Rebelo de Sousa vai a um congresso sindical, patronal ou a um encontro cultural, em regra o que é noticia, o que sai da iniciativa é o comentário que ele faz sobre determinado tema do dia e considerou que o PR "não tem a preocupação de puxar pela importância da representação coletiva".

"Isto é prejudicial e não devia ser assim, pois não há democracia sem as instituições de intermediação", considerou.

Carvalho da Silva referiu ainda como marcante, no primeiro mandato do PR, o facto de este não falar sobre situações relacionadas com corrupção, que prejudicam os portugueses.

"Sempre que estão em análise na sociedade grandes problemas relacionados com o grande centrão, processos complicados que envolvem compadrio e corrupção, lesivos dos interesses nacionais e das pessoas, Marcelo passa como gato sobre brasas, procurando não se salpicar, mas nessa procura põe de lado o que deveria ter, que era a coragem de ser frontal, pois a sociedade portuguesa merecia que houvesse esse afrontamento e esse rigor e a desconstrução da ideia de que foram os portugueses que andaram a viver acima das suas possibilidades", disse referindo o exemplo do caso BES.

Outro aspeto considerado marcante, pela negativa, é o distanciamento do Presidente em relação ao mundo do trabalho.

"Relativamente ao mundo laboral, Marcelo nem cheira o assunto quanto mais intervir face aos desequilíbrios que existem e que geram pobreza e desigualdades. Fica muito pela solidariedade caritativa, não dá um passo para a cidadania social, o que faz muita falta. Pois seria muito bom que o PR dissesse que nenhum cidadão deve ficar dependente da caridade alheia", considerou.

O ex-sindicalista defendeu que o PR deveria falar mais das questões sociais e económicas.

Para Carvalho da Silva, Marcelo Rebelo de Sousa continua a ser um homem de direita e beneficia disso, "conforme se viu na campanha eleitoral", embora muitas pessoas tenham esquecido isso.

"Vivemos um tempo de movimento tectónico entre as correntes de ideologia e de pensamento, em claro deslize para a direita, o que é transversal à sociedade, ao país, à Europa e ao mundo, até no plano geoestratégico e geopolítico".

Na opinião do investigador social, este movimento tectónico "facilita a vida ao PR e faz esquecer que ele é um homem da direita portuguesa".