Imprudências
Pedro Ramos negou por 3 vezes dados da DGS. Fez bem. estão aquém da realidade
Até ontem a Madeira era a região do país percentualmente com mais casos de Covid-19.
Até ontem a Madeira estava com uma taxa de incidência superior à do país. Nos últimos 14 dias, os 296 casos por 100 mil habitantes na Região contrastam com os 174 em termos nacionais.
Até ontem o índice de transmissibilidade era mais alto na Região do que no resto do país. O relatório do Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge dá conta de um o Rt de 1,15 enquanto que em Portugal Continental é de 0,71.
Os dados são objectivos e susceptíveis de interpretações honestas. Tudo o resto, das notas desesperadas aos números martelados, configura publicidade enganosa.
Até ontem, e só na última semana, o secretário da Saúde ordenou a difusão de três esclarecimentos que atacam a Direcção Geral de Saúde (DGS) por ser prejudicial à gestão da pandemia na Região, embora saiba que a discrepância decorra, na sua versão, de “um processamento retrospectivo de casos”, devido a problemas de compatibilidade da plataforma nacional SINAVE, enquanto que a DGS alega, desta vez, que 81% dos novos casos na Madeira tiveram um período entre o diagnóstico e a notificação superior a 48 horas, “decorrente de intercorrências informáticas de um laboratório na região e que se encontram em processo de regularização”.
Como se vê há culpas mútuas na origem do desencontro de números relativos à Covid-19 na Região, anomalia que já dura há quase um ano e já foi explicada vezes sem conta, tanto pela DGS, como pela Secretaria Regional de Saúde e Protecção Civil. Só que como nem tudo é claro, dá-lhe jeito insistir no entretenimento. Não há dia em que o relatório da situação epidemiológica em Portugal coincida com a contagem diária feita na Região. Só que a disparidade decorrente de anomalias nos sistemas, critérios de atribuição geográfica dos casos ou falhas humanas não é comparável ao que de pior há no nosso mundo.
Daí ser surpreendente que, numa só semana, as autoridades de Saúde da Região se preocupem, por três vezes, com uma diferença que já vem de longe, reacção que coincide com notícias menos cómodas para quem gere a pandemia localmente, mas que estão assentes em números regionais, logo, insuspeitos.
Quem tutela a Saúde na Região tem emitido notas com o intuito de desviar atenções. Na terça-feira apelou à valorização dos “números fidedignos” da Madeira, anteontem atacou os dados “geradores de desinformação junto da população”. Ontem, admitiu haver “um diferencial temporal” que entende ser lesivo, embora, segundo os entendidos, tenha que ser reposto.
Em termos globais, os números da DGS, continuavam até ontem inferiores aos números apresentados pela Madeira. Logo, o encontro de contas ainda demora uns dias e o argumento que “são prejudiciais para a dinâmica do sector do turismo na Região” só é plausível por serem inferiores aos reais.
A alegação turística, riscada da terceira nota, é imprudente, mas confirma que a Secretaria que é da Saúde afinal tem outros interesses. Por isso, é legítimo perguntar se quem tutela a Saúde tem gerido a pandemia em função do Turismo e da imagem externa da Região ou daqueles que cá vivem e sofrem? Julgávamos que essa era competência da Associação de Promoção, que se tem revelado atenta às dinâmicas que dependem mais dos mercados de origem do que deste destino, onde repetidamente se diz que “está tudo controlado”.
E quanto ao Turismo, a Saúde refere-se a qual? Ao que um dia voltará - assim o esperamos e quanto antes, mas talvez só em Maio - ou àquele, quase residual, que cá está mas que não chega para todos, pois metade dos hotéis acaba este mês sem dinheiro? Ao que gostava de ter ou o que levou o gestor hoteleiro, André Barreto, a escrever no domingo passado neste DIÁRIO sobre “os novos pedintes”?
Será esta crueldade que a todos afecta motivada pelos números da DGS que em tempos já deu menos mil casos à Madeira, diferença que agora é de 200? Os números são o que são e acima de tudo reflectem uma realidade inevitável, seja aqui, ou noutra parte do mundo. E se são verdadeiros, apesar de díspares, não há nada a temer.