As ginjas da Laurissilva
- Ainda bem que te encontrei, meu amigo, ando cá com umas dúvidas e queria tira-las contigo.
- Desde que eu saiba, amigo, podes contar comigo.
- Desde há algum tempo até agora, a quase toda a hora, que leio no diário e oiço no noticiário, uma discussão maldita, a propósito de uns caminhos, de umas ginjas e de uma tal Laurissilva.
Será que o amigo me pode explicar o que essa discussão quer significar?
- Por acaso até te posso esclarecer com a máxima exatidão, pois conheço esse caso como as palmas da minha mão.
- Graças a Deus, pois já perguntei a uma série de amigos meus, fiquei sempre sem saber, porque nunca me souberam responder.
- Essa senhora Laurissilva – por acaso até uma pessoa minha amiga – tem uma casa junto a um penhasco, lá no fim de um caminho mal-amanhado, onde fez um barzinho num recanto e tem uma ginjinha que é um encanto.
- E com esta maldita pandemia, perdeu “freguesia” e já não deve vender como vendia?
- Exatamente. Porque nem todas as pessoas podiam ser suas clientes. Para lá irem só as que tivessem carros potentes.
- Claro, devido ao acesso desgraçado, para tomar a ginjinha, só quem tivesse bom carro?
- Pois, e os habituais clientes, devido ao confinamento, deixaram de aparecer e a senhora para o negócio sobreviver outros clientes tem que ter.
- Estou a ver. E ao pedir para arranjar-lhe o caminho, arranjou um sarilho com os vizinhos?
- É verdade. Isto é uma terra com muita “ invejidade”, como sabes!
Mas é uma pena, digo-te com sinceridade, pois trata-se de uma zona cheia de verdura, de beleza e com uma certa nostalgia, quer seja de manhã como ao cair do dia.
Então para namorar tu perdes o juízo, julgas estar no Paraíso!
-Não me digas mais nada. Já lá foste com a tua namorada?
- É verdade. Foram muitos minutos de felicidade. Estarmos ali juntinhos, naquele “verdinho” a ouvir o chilrear dos passarinhos. Apesar de ser durante o dia, acredita que houve momentos, que parecia ver as estrelas a cintilarem no firmamento!
- Acredito, sim senhor. Então não sei de que é capaz o amor!
Mas com o caminho arranjado vai ser melhor para a senhora mas pior para a privacidade dos namorados.
- Sim, mas o caminho está demasiadamente esbambalhado e tem de ser reparado. Se houver um incendio aqui ou acolá, nem o” carro da bomba” vai lá.
E sabes uma coisa que me enche de felicidade? A senhora Laurissilva já me disse que assim que o caminho esteja arranjado, vai comprar dois fornos; um para fazer espetadas e outro para cozer bolo do caco!
- Isso é que seria uma beleza. Comer uma espetadinha, com vinho seco e bolo do caco, no meio daquela natureza!
Nesta terra só está triste quem gosta mesmo da tristeza!
No entanto já digo o que dizia minha avó: Ninguém dá ponto sem nó!
- Bom, amigo, finalmente fiquei esclarecido. Foi um prazer falar contigo.
- Sempre que precises, conta comigo. Até a próxima, amigo!
Juvenal Pereira