Quo tendimus?
Nunca sabemos os nossos limites até nos forçarmos, ou sermos forçados a atingi-los
Aproxima-se a Páscoa, altura propícia para as estações de televisão tirarem o pó a vários filmes de época e arejarem as histórias que giram à volta da Vida e Morte de Jesus Cristo.
Quo Vadis é um desses filmes. Baseado num livro do escritor polaco Henryk Sienkiewicz (1846-1916), ambientado na Roma Imperial à época de Nero, que tem por tema a perseguição que se abateu sobre os cristãos após o Grande Incêndio de Roma.
A expressão aparece na Bíblia, em João 16:5, onde Jesus Cristo diz:
“Iam ut ego sum et vado ad eum qui me misit et nemo ex vobis interrogat me: Quo vadis? “ (agora que vou para aquele que me enviou, nenhum de vocês me pergunta: Para onde vais?), e aparece também em uma obra apócrifa do século III, que se chama “Actos dos Santos Apóstolos Pedro e Paulo”, quando Pedro encontra Jesus na Via Ápia carregando uma cruz e pergunta-Lhe, “Para onde vais, Senhor?” (Quo vadis Domine?). O Senhor responde: “Eu volto para Roma para ser cruxificado, já que tu, Pedro, estás fugindo de ajudar o Meu Povo”. Depois dessa afirmação, Pedro arrepende-se e regressa a Roma, continuando o seu ministério e acabando por dar a sua vida por Cristo.
E nós, para onde vamos? Que caminho seguir?
A epidemia que vivemos, que vamos vivendo ao longo destes quase dois anos de incertezas, trouxe consigo novas, e por vezes duras, realidades. Se no início não sabíamos exactamente com o que contar, agora continuamos sem saber exactamente com o que contar. Fizeram-se planos e contingências, foram ouvidos os mais variados especialistas que deram a sua opinião, tantas vezes de uma forma pessoal, da forma como iam entendendo o “não sabemos” geral, com um pouco mais de conhecimento do que o comum dos mortais, dando à evidência o “não sabemos” de uma forma mais elaborada, que foi servindo para que os políticos responsáveis pela ordem pública fossem tomando decisões com base no pouco que fomos sabendo.
E as contingências foram dando lugar a planos de fechos e reaberturas, com avanços e recuos, com desconhecimento generalizado baseado em conhecimentos que entretanto foram sendo adquiridos, muitos de uma forma empírica, mais tarde transfigurados em estudos para escudarem o pouco que sabemos ainda hoje.
E houve heróis.
Que resistiram à adversidade, tanto cuidadores como cuidados, que tudo fizeram para que a normalidade prevalecesse o mais normal possível, mesmo sabendo que o normal não é o normal que todos ansiamos, que todos queremos e esperamos.
E houve, também, os anti-heróis, aqueles que tudo fizeram para que tudo corresse mal, mesmo que involuntariamente, mesmo que por cansaço de um interminável confinamento, mesmo que por sentir a necessidade de ter uma economia minimamente funcionante.
E agora, que caminho seguir?
Nunca sabemos os nossos limites até nos forçarmos, ou sermos forçados a atingi-los. A epidemia actual forçou-nos a ir aos limites, aos limites da resistência, aos limites da resiliência, aos limites do que pode o sofrimento ao deixar para trás muitos dos cuidados que seriam, que eram imprescindíveis para que a saúde fosse muito para além da Covid 19. Para além da saúde, ficaram para trás também medidas de apoio às empresas que geram o emprego indispensável para que haja saúde, ficaram para trás necessidades tidas como certas e que deixaram de ter essa certeza, ficaram para trás bens essenciais como a educação e cultura, todos à espera de uma vacina milagrosa que tudo cura de um momento ao outro, à guisa dos feitos históricos descritos e documentados como praticados por Jesus Cristo.
Quo vadis Dominae, perguntou Pedro.
Quo tendimus Dominae? Id quod sequitur.
Para onde vamos Senhor? Porque caminho seguir, perguntamos nós agora, sem termos qualquer certeza de resposta, de uma resposta que possa trazer esperança no nosso futuro imediato, no atenuar da desesperança que se apodera a pouco e pouco das gentes cansadas.
Os milagres actuais têm de vir de todos e cada uma de nós, com a nossa resiliência comum a ter de se sobrepor ao egoísmo individual, mesmo que para isso seja necessário acreditar, ou fazer por crer, nas decisões e soluções que nos vão sendo apresentadas e, se não concordarmos, fazer ver que não concordamos com fundamentos reais e não com o “achismo” que tem caracterizado a maioria das medidas apresentadas, contribuindo de uma forma positiva para que o depois de amanhã possa ser num caminho e numa direcção suficientemente suaves para que não sejamos obrigados a responder como Cristo:
“Ego vadam ad Romam iterum cricifigi, quoniam Petrus sunt fugeres, potestate auxilium mihi populus”, Eu volto para Roma para ser cruxificado, já que tu, Pedro, estás fugindo de ajudar o Meu Povo.
Os meus votos de umas Boas e Santas Páscoas a todos.
P.S. – as traduções para latim são da responsabilidade do Google Tradutor, já que o meu conhecimento em termos desta língua são nulos. Peço desculpa por qualquer lapso que possa existir.