Vacinar a Democracia
Não é recuando para o passado que se construirão soluções com futuro
Cansados: é assim que nos sentimos após um ano de pandemia, enquanto as consequências se acumulam nas nossas vidas. Os casos de COVID-19 somam-se, atingem os nossos familiares e amigos, as perdas humanas multiplicam-se, a fadiga pandémica acentua-se e as consequências económicas, sociais e políticas agravam-se todos os dias. Perante a pandemia, à primeira oportunidade eleitoral os portugueses deram uma resposta que preocupa: se é certo que a vasta maioria votou na estabilidade que consideram representada por Marcelo Rebelo de Sousa, outros houve, 1 em cada 10 dos que votaram, que preferiram escolher vendedores de ilusões. Na Madeira, foram o segundo grupo maioritário. Chegados aqui, torna-se cada vez mais importante que, tal como vacinar contra a COVID-19, sejamos capazes de vacinar a democracia contra fenómenos ilusionistas. Nas autárquicas deste ano, teremos uma nova oportunidade, que não pode ser desperdiçada, em particular pelas forças políticas de esquerda que na Madeira continuam a acreditar numa verdadeira alternativa à maioria de direita, a mesma que não exclui possíveis alianças futuras com fenómenos rocambolescos.
Enquanto enfrentamos a terceira vaga da pandemia, decorre também o processo de vacinação contra a COVID-19, que tem mais aspectos positivos do que os negativos que alimentam a espuma dos dias. A existência de vacinas apenas um ano após o início da pandemia é um feito digno de registo para a ciência e para a medicina, que não pode ser menorizado por acontecimentos menos felizes em torno da vacinação e que representa uma grande esperança no momento difícil que vivemos. Para além disso, a aquisição centralizada de vacinas pela União Europeia e a sua progressiva disponibilização, não sendo um processo imune a críticas, confirmou a importância estratégica, política e económica da União também na área da Saúde, no momento em que se defende o aprofundamento do seu papel também nesta área e para o qual Portugal já contribuiu durante a sua presidência. A administração de vacinas, de acordo com os planos de vacinação estabelecidos para Portugal e para a Região, permitiu que já estejam vacinadas mais de 350 000 pessoas, 80 000 com ambas as doses. Finalmente, o alargamento progressivo desta primeira fase é um sinal muito positivo, permitindo que ainda a semana passada se tenha iniciado a vacinação de todas as pessoas com mais de 80 anos, cerca de 670 000, protegendo os mais vulneráveis e o grupo mais afetado a nível de mortalidade por esta doença. Concentrados no que correu bem e sem ignorar o que correu menos bem, com inaceitáveis ultrapassagens que devem ser censuradas, é preciso olhar em frente, com total determinação e resiliência.
Exaustos deste tempo que vivemos, não é recuando para o passado que se construirão soluções com futuro: nem para o passado da direita nacionalista ditatorial, nem da direita autárquica no Funchal. Não é andando para trás, é continuando em frente. Do passado, que fiquem apenas as lições das soluções erradas de quem já esteve no poder e agora se apresenta como novidade redentora. Na política, como na COVID-19, há variantes cuja eventual menor resposta das nossas “defesas” devemos continuar a estudar. Estas variantes, a sua evolução e as respetivas consequências, quer ao nível da gravidade da “doença” que provocam, quer da resposta “imunológica” necessária, tem sido acompanhada por muitas instituições. Se na COVID-19 a vacina já existe e a sua adaptação depende da ciência, na política depende apenas de cada um de nós e dos partidos que acreditam que há caminhos para continuar e outros novos para construir, para que a vacina contra as doenças do passado e as novas epidemias não se atrase. O caminho é em frente, com confiança clara no futuro.