"Chega a um tempo que temos de fazer como eles querem"
Armador de Câmara de Lobos está descontente com proibição de Bruxelas de pescar gata
Os pescadores não vão deixar de pescar gata, não porque queiram, mas porque é impossível nos moldes actuais não a pescar quando andam na faina da espada e não consideram ser razoável a decisão da Comissão Europeia de proibir a captura, transporte e descarga, uma vez que o peixe é pescado entre 600 a 800 metros de profundidade e quando chega à superfície está morto. “Jogar fora é triste”, diz Alexandre Rodrigues, armador de Câmara de Lobos. “É triste jogar fora um peixe que vem do mar para a rua já morto”.
O pescador com uma larga experiência argumenta que, se não permitem vender em lota, pelo menos deixem os pescadores fazerem à sua maneira, usá-la como isco ou levar para casa para as famílias. Esclarece que não há outro sistema para pescar a espada disponível que evite que a gata morda o anzol a tanta profundidade. “O aparelho vai para a água, o que está lá no fundo, se tiver vontade de comer, come”, desabafa. “Não há maneira de evitar apanhar esse peixe, nem a gente, nem em parte nenhuma do mundo inteiro”.
O armador acredita que a decisão partiu de quem não tem conhecimento. E diz que na pesca de rede, a meia-água, é que os peixes chegam vivos na rede e podem ser escolhidos e as espécies protegidas devolvidas ao mar. A pressão na subida é tanta na pesca da espada, que o peixe não resiste e morre sempre.
Este é no entender de muitos um retrocesso no processo que não beneficia nem os homens do mar, nem a espécie, que vai continuar a ser capturada involuntariamente. O fim é que será diferente, uma vez que não pode ser tida a bordo das embarcações. Será devolvida ao mar para ser consumida pelas gaivotas, diz o pescador. “Vai andar a boiar em cima de água. Depois de morta ela não vai para o fundo, ela fica em cima de água a boiar, as ‘gavinas’ começam a picar até dar fim do peixe”. “Eu acho isso injusto, acho isso mal.”
Nesta fase Alexandre Rodrigues conta que não têm vindo muitas gatas nos anzóis. “As gatas - a gente chama xaras -, as xaras parece que ouvem estas confusões, desaparecem”. Num lance, revela o armador, podem vir 10 a 12, em outras ocasiões 15 a 20, no meio de 30 a 40 espadas, 50 a 60. “Depende”.
Além desta espécie de tubarão de profundidade também por vezes vêm outras espécies, como o espadarte ou mesmo um atum, que vive muitos metros mais acima, é apanhado quando o aparelho está a ‘correr’.
O pescador confessa que há muita procura pela gata, também chamada sapata e bacalhau de Câmara de Lobos, por ser branco e vendido seco. “As pessoas adoram esse peixe”. À pergunta se os pescadores vão tentar contar a proibição, não acredita. “Temos de cumprir com a lei da União Europeia, a gente já tem medo e cada vez está pior. Se a gente trouxer um peixinho desses para terra sem ter ordem, apanha uma multa. É somos capazes de ficar sem a licença de pesca”. “Chega a um tempo que temos de fazer como eles querem: é jogar fora. Não se pode arriscar”.
Alexandre Rodrigues assume que deitar a gata fora vai representar prejuízo para os pescadores, que contavam com esse rendimento para cobrir alguns custos da pesca. “É prejuízo para a gente, que não se ganha dinheiro, não se ganha nada. E é um peixe que já vem preso, sempre dava para safar, para pagar o isco ou pagar o gasóleo, ou a comida.”
O proprietário revela que a fiscalização tem sido mais apertada no cais, que os inspectores inclusive entram dentro do barco. “Não vão aos camarotes por sorte”, comentou. “Até à cozinha com olho-de-boi eles iam para ver se estava suja ou se estava limpa. Mas não é. É para ver se tinha alguma coisa lá de peixe”. “Agora é que não se pode levar um peixe em modos para casa, isto é um absurdo”, terminou.