“Me, myself and I”
1. Disco: Sia escreveu e dirigiu um filme. “Music – Songs from and Inspired by the Motion Picture” é simples, mas eficaz. As críticas ao seu trabalho de realização têm sido arrasadoras, mas o disco tem momentos muito interessantes, como as colaborações com Dua Lipa e com David Guetta. Pop honesto.
2. Livro: “Mal-Amanhados” é o nome de uma série açoriana, uma espécie de “road-trip” pelas ilhas do arquipélago irmão. Depois da estreia nos Açores, anda agora pela RTP1. No entretanto, saiu o livro, com o mesmo nome, escrito pelas mãos de Luís Filipe Borges, Alexandre Borges e Nuno Costa Santos. Um excelente complemento para os que se apaixonaram pela série, como eu.
3. Desde a passada semana que sou sexagenário. Não posso dizer que tenha sentido os anos a passarem. Fiz quase sempre o que quis, procurando ser livre e sabedor de que a minha liberdade acaba onde começa a liberdade dos outros.
Nasci no início dos anos 60. Uma década de enormes transformações políticas e sociais. Atravessei-a, vivendo uma infância feliz e despreocupada, entre a Praia da Azarujinha, a praceta e a escola primária, no fim da rua.
Cheguei rapidamente aos 70’s. Descobri o valor da música e datam desta altura as primeiras leituras marcantes.
Arribei à Madeira a 31 de Dezembro de 74. Vínhamos ver o fogo e regressávamos a Lisboa. Era essa a intenção. Quem voltou foi o único que aqui nasceu, o meu pai, ficando por cá quatro “cubanos” que são hoje tão madeirenses como o melhor dos madeirenses.
Vivi a construção da autonomia. O perceber que saberemos sempre decidir melhor sobre o nosso destino comum, do que outros o poderiam fazer. Ao fim de quarenta anos, não tenho dúvidas que podíamos ter feito mais e melhor.
Nos 80’s vivi uma das melhores décadas da minha vida. Direito em Coimbra, que nunca acabei, e depois História nas extensões universitárias na Rua dos Ferreiros e que, também, não terminei. Este por uma unha negra.
A última década do século passado viu-me consolidar a vida profissional. Primeiro no Aeroporto do Porto Santo e, depois, no da Madeira. Nasceram as filhas mais velhas e voltei a fazer teatro. Pisei palcos na Madeira, no Continente, em Espanha e no Brasil. Não é difícil imaginar, quando lá fora, do orgulho que tinha quando dizia de onde vinha.
É claro que não consegui fazer tudo o que me propus realizar. Era uma impossibilidade que, reconheço hoje, pecava por excesso de ambição. Precisava de duas vezes 60 anos.
No novo século, montei uma companhia de teatro que nunca recebeu, das entidades oficiais regionais, um euro que fosse para montar as suas produções. Nunca o quis. Todos os que lá trabalharam foram sempre pagos pelo seu trabalho.
No dealbar da segunda década, após nascer a última das filhas, decidi passar das “bocas” aos actos. Foi assim que, depois de uma breve passagem, há mais de 20 anos, pelos palcos da política, fundei, com outros liberais portugueses, o Iniciativa Liberal. E é aqui que vou andar nos próximos tempos. Enquanto me sentir com forças e entusiasmo, porque é isso que me motiva.
Se me orgulho de muitas coisas que fiz, há também umas quantas que não tiveram valor algum. Não as esquecendo, atiro-as para trás das costas, procurando não repeti-las.
Ainda tenho, se não for surpreso, uns quantos anos para continuar a ser como sou: teimoso, resiliente, chato, curioso, consciente, desbocado e, na medida do possível, livre.
Estou tranquilo. Tenho a vida bem arrumada e até já fiz as pazes com a morte. Como disse Heine: “Eu sei que Deus vai-me perdoar… é o trabalho dele!”
4. António Costa apelou à participação dos portugueses na consulta pública do Plano de Recuperação e Resiliência. Num artigo no DN de Lisboa, fala dessa consulta como se fosse uma ideia dele e não uma exigência da Comissão Europeia. Dá-nos duas semanas para isso.
Como bom cidadão, fui ver o bendito PRR. É um documento denso e profundo. Cheio de minúcias e linguagem difícil.
Comecei por ficar a saber que o Plano vem apresentado “com exclusão de elementos técnicos ainda em elaboração, nomeadamente relativos aos custos e a alguns marcos e metas.” Começa bem. Como é que o Primeiro-ministro quer que se faça uma avaliação, se não disponibiliza os dados que a permitem fazer? Como disse Carlos Guimarães Pinto: “A única consulta pública que pode ser feita é ao tipo de letra usado no documento.”
Ficamos sem saber muitas coisas. Por exemplo, os impactos do PRR na economia? Ou, quantos postos de trabalho vai gerar? Qual a repercussão no PIB? Quais os efeitos na riqueza do país?
Estão lá coisas lindas como: “Abordagem Integrada de Apoio às Comunidades Desfavorecidas nas A.M.”, “Agendas mobilizadoras para a reindustrialização”, “Roteiro para a Redução das Restrições nas Profissões Altamente Reguladas”, “Força de Trabalho Capacitada para a Criação de Valor Público”, “Administração Pública Conectada, Segura e Inteligente”. [Se bem repararam, consegui deixar passar uma frase onde estão as palavras “Administração Pública” e “inteligente”, sem fazer uma piadola]
Sr. Primeiro-ministro, eu até gostava de ajudar, mas com o prazo de duas semanas penso que nem vai dar para decifrar as perífrases do texto do Plano.
5. Miguel Albuquerque não me desafiou para ler o que pensa fazer com o dinheiro da “bazuka” que vai chegar à Madeira. Até porque, não há nada para ler, a não ser o que se pode encontrar nas páginas dos jornais. Ainda assim, e antes que o tempo e a oportunidade passem, cá vai o que “li”:
Segundo as prioridades estabelecidas pelos socialistas do Governo Regional: ESTADO, ESTADO E MAIS ESTADO.
Albuquerque ainda veio dizer que quer mais 100 milhões para os Portos. Ou seja: AINDA MAIS ESTADO.
Não se vê nada para a recuperação das empresas que tanto sofrem, nada que garanta a manutenção do emprego, uma linha que seja, na recuperação turística. Eu não sei onde é que esta gente tem a cabeça.
Foi o que os madeirenses escolheram e agora vamo-nos lixar todos juntos.
6. O Económico Madeira lançou uma sondagem onde procurava saber dos possíveis resultados nas eleições autárquicas, no que ao concelho do Funchal diz respeito. Parece que Pedro Calado é o favorito e ganha com uma perna às costas. Diz que com quase 61%. Estão, também, por lá plasmados uma série de resultados com outros candidatos do PSD.
O que me chateou neste trabalho foi o facto de nem terem tentado saber quem seria o candidato do meu partido. Como não acredito que tenham lançado a sondagem sem nomes à cabeça, nada daquilo faz sentido porque não sou candidato à distinta Câmara do Funchal. Mas agradeço, a quem cozinhou aquilo, os 4,7% que me atribuem, se os candidatos pelo PSD forem Pedro Ramos ou Manuel António Correia. Não tem resultado prático nenhum, mas afaga-me o ego.
7. Fiquei sem palavras ao saber que Miguel Albuquerque anda a receber autarcas eleitos pelo PSD para tratar das eleições autárquicas, na Quinta Vigia, sede da Presidência do Governo Regional. O que me falta em palavras e sobra-me em adjectivos.
Isto é uma espécie de absolutismo estalinista, “L'État, c'est moi”, onde Albuquerque se confunde com o Estado. Paira sobre nós, como se de uma divindade da política se tratasse.
A sede do PSD Madeira é onde se encontra Sua Excia. E onde se encontra o Presidente fica o centro do mundo, ao redor do qual tudo gravita. “Me, myself and I”.
8. Vamos continuar, nesta espécie de confinamento, até à Páscoa. A luz no fundo do túnel que nos dão, é isto. Não há um número, um objectivo a atingir. É assim, porque sim. É assim, porque há alguém que sofre de "achismos" e, porque manda, assim decide.
Com isto, mantem-se a pandemia do medo, cultiva-se a divisão e alimenta-se as crises de saúde e económica.
As empresas laboram a meio-tempo, num regime que nem é carne nem é peixe, e com isso veem-se arredadas de apoios de que tanto precisam. Se isto não é de propósito…
Só não vê quem não quer.