Governo britânico nega que retirada de Cabul tenha sido "disfuncional e caótica"
O vice-primeiro-ministro britânico, Dominic Raab, defendeu hoje a retirada de cerca de 15 mil britânicos e afegãos em risco após a conquista de Cabul pelos talibãs em agosto, depois que um ex-oficial a condenou como "disfuncional e caótica".
Raab, que na época era ministro dos Negócios Estrangeiros e, portanto, responsável pela operação, admitiu, em declarações à estação pública britânica BBC, que houve "desafios" e "lições a serem aprendidas", mas insistiu que fez "um bom trabalho" com base em "padrões de evacuações recentes" e "se comparado internacionalmente".
"Foi a maior operação de evacuação aérea recente", reivindicou, lembrando que o Reino Unido tirou do Afeganistão 5.000 britânicos, 8.000 afegãos e 2.000 crianças, mais pessoas do que qualquer outro país, exceto os Estados Unidos.
A deputada trabalhista Emily Thornberry pediu a Raab, atualmente Ministro da Justiça, que "considere demitir-se", após as revelações "chocantes" feitas à Comissão Parlamentar de Negócios Estrangeiros pelo ex-funcionário Raphael Marshall, que deixou o posto no Ministério em setembro.
Marshall acusou Raab de ser "lento" a tomar decisões e de "não entender bem a situação", o que tornou a operação de agosto passado "disfuncional e caótica".
O antigo diplomata disse que faltavam funcionários, em teletrabalho devido à pandemia, para avaliar os cerca de 150.000 pedidos de afegãos para ser resgatados porque estavam em risco devido às suas ligações com o Reino Unido, por exemplo, porque trabalharam como tradutores ou motoristas durante os 20 anos de ocupação aliada do país asiático.
Segundo o ex-diplomata, dessas pessoas, "menos de 5%" receberam ajuda depois que a capital do Afeganistão, Cabul, caiu em 15 de agosto nas mãos dos talibãs, após a retirada das tropas dos Estados Unidos e da NATO em maio.
De acordo com Marshall, as decisões sobre quem ajudar, com base em dois programas de ajuda do Governo, foram tomadas "arbitrariamente" e às vezes por funcionários inferiores, enquanto o ministro, que já em agosto foi criticado por continuar de férias na Grécia, demorou "horas" a responder.
Numa das acusações mais prejudiciais, o ex-funcionário afirmou que muitos dos 'emails' recebidos foram marcados como lidos para desresponsabilizar o Ministério, embora "nenhuma ação tenha sido tomada" para respondê-los, e lamentou que muitos dos funcionários designados para a tarefa "não tinham conhecimento" sobre a situação ou as línguas faladas no Afeganistão.
O presidente da Comissão parlamentar, o igualmente conservador Tom Tugendhat, disse à BBC que, a julgar pelas evidências, o Ministério dos Negócios Estrangeiros era como "uma Mary Celeste [navio encontrado vazio no século XIX ao largo dos Açores] num momento de emergência nacional".
"A questão a ser respondida é: onde estavam todos?", questionou o parlamentar.