Unidade territorial
Não me recordo de uma circunstância na qual não me quis sentir português. Não é que a portugalidade me tenha sido transmitida pelos genes. Disso, estou certo, não por ser erudito na disciplina de genética (embora o destino me tenha afastado de uma promissora carreira médica) mas porque um filho só recebe o melhor de um pai e de uma mãe.
Tenho, porém, a certeza de que sempre me senti português. Há algo de reconfortante em deixar tudo para a última, chegar sempre atrasado e acabar o almoço a pensar no que vou jantar. E para mim era claro que este espírito não conhecia barreiras no território nacional.
Até hoje.
Hoje, ao querer viajar de avião na TAP para o Continente (não confundir com a cadeia de supermercados a qual, tanto quanto é do meu conhecimento, ainda não admite compras por meios aéreos mas apenas on-line) fui confrontado com uma nova legislação nacional que obriga os passageiros à entrada do Rectângulo a preencher um formulário de localização.
O douto formulário contém a mesma informação que preenchi na reserva do meu voo na companhia e na chegada à Madeira. Nada mais.
Não seria Portugal se não tivesse de veicular a mesma informação, por diversas vezes, a pessoas diferentes (muitas vezes para concluírem que não é com eles e que me devo dirigir ao balcão do lado).
Não antecipei, ainda assim, que a falta do formulário fosse impeditiva de concluir a viagem. Isto porque a distância entre o aeroporto de Faro e o aeródromo de Bragança não difere significativamente da distância do Continente às colónias (para aqueles que consideram que Portugal não termina no Mondego). Os critérios definidos para realizar estas duas viagens são, no entanto, distintos.
Não antecipei também que o formulário (de preenchimento exclusivo online) apresentasse um erro no número de telefone da pessoa de contacto que impede o seu preenchimento - será certamente para distinguir os portugueses dignos daqueles que não o são.
Aqueles que conseguem preencher o afamado formulário da DGS com sucesso têm à sua espera uma pulseira verde (daquelas que os miúdos recebem quando vão à discoteca e que se compram em qualquer loja do chinês), a qual dá acesso a entrar num respeitável, eclético e inacessível país: Portugal.
Diogo B. Pereira