Crónicas

De frente para o mar

1. Disco: os lendários Deep Purple decidiram fazer-se “putos” e presentear-nos com um excelente trabalho, de versões, que dá pelo nome de “Turning to Crime”. Uma homenagem sentida às raízes do rock. Abrem com um electrizante arranjo de “7 and 7 is”, de Arthur Lee, música de 1966, passam por “Well” dos Fleetwood Mac (1969) e nem se esquecem de passar pelas raízes mais profundas, revisitando “Let the Good Times Roll” de Louis Jordan and his Tympany Five (1946). E soa tudo a Deep Purple. Não há cura, nem vacina, que evite ouvir até à exaustão.

2. Livro: neste Natal que se aproxima, fica aqui uma lista de presentes que não me chateava de receber: “Stalingrado”, de Vassili Grossman; “A Vida e a Lenda do Sultão Saladino”, de Jonathan Phillips; “O Crepúsculo da Democracia”, de Anne Applebaum; “A Associação das Pequenas Bombas”, de Karan Mahajan; “O Instituto para o acerto dos relógios”, de Ahmet Hamdi Tanpinar; “Diário da Peste”, de Gonçalo M. Tavares. Se houver uma alma caridosa…

3. No dia 3 de Outubro, dias depois de ter sido eleito, Pedro Calado disse ao Jornal Económico: “o PSD/CDS-PP “sempre foi contra” a dissolução da empresa, sublinhando que, em Assembleia Municipal, chumbaram a proposta do executivo liderado por Miguel Gouveia, “como forma de salvaguardar os postos de trabalho e proteger os direitos dos trabalhadores”.

Isto é, para mim, claro. Claríssimo. E no entanto, chegaram os despedimentos.

Numa troca de opiniões, um amigo perguntava-me: já que reclamava tanto, que solução defendia para a Frente Mar. Dei-lhe a única resposta possível: não sei. E não sou só eu que não sei.

Não tenho dúvida nenhuma de que a empresa municipal, criada pelos socialistas laranja, serviu de centro de emprego aos socialistas rosa, quando estes ganharam a Câmara do Funchal. Foi um fartar vilanagem, principalmente, numa altura em que a admissão de funcionários para a CMF estava vedada pelo PAEF.

Esta história está toda ela muito mal contada. Sei, só se fosse cego não o saberia, que aquilo se transformou numa coutada do PS e que há quem lá não apareça, abrigado pela lei que permite a mobilidade. E a função pública ligada ao Governo Regional é uma coutada de quem? Têm alguma moral para falar? Conheço uns quantos que vão lá de manhã picar o ponto e só lá voltam ao final do dia para fazer o mesmo. Quando voltam.

Eu estou-me bem lixando para estas guerrinhas partidárias dos socialistas rosa com os socialistas laranja. Quero é que se lixem todos. Mas, para mandar gente embora, exige-se que o processo seja transparente e racional. Que se faça um estudo de viabilidade que analise e identifique a segurança do investimento em função do retorno que possa gerar. Projecção de receitas, de custos, de despesas, investimentos futuros, fluxos de caixa, análise de indicadores, “payback”. Isto, por um lado. Por outro, não se recupera uma empresa sem um plano de investimentos e que, também ele, pode passar por dispensa de funcionários. Em suma, estas medidas têm de estar apoiadas num estudo de viabilidade que demonstre publicamente que estas coisas têm de ser feitas; relatórios que demonstrem, aos munícipes, a justificação destas medidas extremas.

E, com base nisso, que se tomem as decisões que os estudos indicarem como sendo as melhores. Tem de estar tudo em aberto. Desde uma eventual privatização, até ao encerramento da empresa. Agora, decidir despedimentos com base em contas de mercearia é que não.

4. Permitam que deixe aqui umas palavras para o meu amigo e colega actor, Hugo Castro Andrade, manifestando-lhe toda a minha solidariedade. O que te estão a fazer, na FRENTE MAR, é uma das maiores canalhices que a história desta terra, que amamos, registará.

O teu trabalho, na área da Educação Ambiental, é de excelência. O modo como lidaste com os processos da Bandeira Azul para os diferentes espaços geridos pela empresa, é exemplar, tão exemplar que levou à conquista de vários prémios nacionais.

Lembro, com particular relevo, as peças de teatro “A Menina do Mar num Mar de Plástico”, inspirada na obra da grande Sophia de Mello Breyner, e que ganhou um prémio nacional de boas práticas ambientais, bem como a peça que escreveste e dirigiste: “O Peixe Ecocêntrico”.

Só quem não te conhece não sabe o furacão que és. Por onde passas, nada fica igual. És lá pessoa de só picar o ponto! Tu “picas” é o juízo deste mundo e do outro, com essa enorme capacidade de trabalho. Não deve haver na FRENTE MAR ninguém que trabalhe mais e melhor do que tu. E isso cria-te problemas: és um terror para os medíocres, não tens tempo para os lambe-botas e tens um coração do tamanho do mundo.

Tenho a certeza de que, se tivesses agarrado a mão que te quiserem dar, não estavas a passar por isto. Fizeste bem em não aceitar. Ias ficar nas mãos de gente reles e sem escrúpulos.

Sei que como actor/agente-cultural/encenador tens orgulho no que fazes. Acontece-me o mesmo. E é por isso que usamos todas as ferramentas à nossa disposição para publicitar o que fazemos, porque queremos público para nos ver. Passar pelas tuas páginas, nas redes sociais, é rever o teu trabalho que agora entendem que “não fazias” na FRENTE MAR.

Magrite pintou um cachimbo e escreveu por baixo: “ceci n’est pas une pipe” (isto não é um cachimbo). Pretendia assim o pintor negar o que víamos, ou seja, que o que estava no quadro não passava de uma representação do cachimbo e não o objecto em si. Pedro Calado, do alto do seu surrealismo, vem fazer o mesmo: “ceci n’est pas Hugo Andrade”. Mas és, meu caro amigo, és e ocupas espaço.

De tudo o que precisares de mim, de tudo o que estiver ao meu alcance, dispõe. A injustiça enoja-me e a mediocridade repugna-me.

5. Li, na semana passada, o relatório da CTVC, o tal parecer que era sigiloso e que deixou de ser. Não é difícil de ler, está escrito numa linguagem acessível — com um ou outro hermetismo.

Quero destacar uma das frases que lá está: “Poderá ser prudente aguardar por mais evidência científica antes de ser tomada uma decisão final de vacinação universal deste grupo etário”. O grupo etário dos 5 aos 12 anos.

A DGS decidiu ao contrário dos especialistas, a Secretaria Regional da Saúde decidiu ao contrário dos especialistas, e eu vou fazer, em relação à minha filha, o que os especialistas aconselham ser sensato, “aguardar por mais evidência científica antes de ser tomada uma decisão final de vacinação”.

No entretanto, vou tomar a minha dose de reforço.

6. Noticiou, o DN Madeira, que um aviário tinha regularizado o seu licenciamento. Isto em si não é notícia. É normal que as empresas, por mais diferentes que sejam as suas actividades, tenham de ter licença para funcionar. Aparentemente, esta notícia é uma espécie de “o cão mordeu um homem”. Mas não: este aviário levou 42 anos, eu repito: quarenta e dois anos, para se licenciar. 42 anos para licenciar uma indústria agro-alimentar. É este o Estado gerido em cima do joelho, é este o estado a que chegámos.

7. Manuela Dora, num comentário a um “post” do João Caetano Dias, pôs-me a pensar. Escreveu, a propósito das opiniões de uma certa direita comentadeira e croniqueira: “são muito mais compreensivas para o Chega e usualmente irónicas e desdenhosas relativamente à IL.” Tem toda a razão. Anda aí uma direita “que não coisa, nem sai de cima”, que se sente usurpada pela iniciativa de outros. Prefeririam, certamente, o marasmo proporcionado por um PSD tipo albergue espanhol e um CDS irrevogável. Não perdoam a chegada do liberalismo que, mesmo com as suas divergências, consegue trabalhar por um Portugal mais liberal e proporcionador de dignidade a todos os portugueses. Perderam o exclusivo da voz e isso chateia-os.

8. World Travel Awards - GANHÁMOS!!! Já temos mais bolas do que o Ronaldo.