OCDE desafia governos e comunidades africanas a enfrentarem desigualdade de género
A igualdade de género em África só será possível quando os governos e as comunidades enfrentarem a discriminação, segundo um relatório hoje divulgado em Paris pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE).
"Apesar das reformas legais, as normas sociais enraizadas continuam a discriminar mulheres e meninas", de acordo com a edição de 2021 do relatório regional sobre Instituições Sociais e Índice de Igualdade de Género.
Cobrindo 54 países africanos, o relatório revela que aspetos ocultos da desigualdade de género, como leis, normas e práticas discriminatórias, afetam persistentemente a qualidade de vida das mulheres, medida pelo Índice de Género na África, no emprego, empreendedorismo, saúde e representação política.
"A crise da covid-19 tem agravado a situação, com estimativas iniciais a revelarem que todos os tipos de violência contra mulheres e meninas aumentaram desde o início da pandemia", considera o documento.
No entanto, o relatório mostra avanços encorajadores na luta pela igualdade de género no nível regional.
"A liderança política e a participação das mulheres na tomada de decisões melhoraram, principalmente em países que aplicaram políticas públicas específicas, como as quotas: a representação feminina é 10 pontos percentuais maior do que em países que não adotaram essas medidas".
Entre 2014 e 2020, muitos países aprovaram reformas legislativas destinadas a abordar a violência de género e apoiar o acesso das mulheres à propriedade da terra e financiamento, destaca positivamente o documento.
"Acreditamos firmemente na igualdade de género e no seu papel no sucesso da Agenda Global 2030 e da Agenda 2063 da África. Mas muito mais precisa de ser feito pelas mulheres e meninas em África, já que vários obstáculos continuam a impedir a sua plena participação na sociedade e na economia", considera a islandesa Ragnheiður Elín Árnadóttir, diretora do Centro para o Desenvolvimento de África da OCDE, no relatório.
Para Elín Árnadóttir, "É uma questão de justiça, mas também de bom senso económico".
O relatório estima que as instituições sociais discriminatórias custaram a África o equivalente a 7,5% do seu produto interno bruto (PIB) em 2019.
"Apesar das grandes variações de país para país, em média, as mulheres africanas sofrem os níveis mais altos de práticas discriminatórias do mundo", destaca o relatório.
O documento mostra que "a violência de género se deve a normas restritivas de masculinidade que perpetuam a dominação masculina na esfera privada, bem como a aceitação por parte das mulheres dessa violência".
"Normas sociais discriminatórias também contribuem para a tolerância de práticas prejudiciais, como o casamento infantil e mutilação genital feminina (MGF). Por exemplo, em 2018, em média, 16% das mulheres africanas com idades entre 15 e 49 anos acreditavam que a MGF deveria continuar", vinca o relatório.
Quanto à participação política das mulheres, 28% da população ainda acredita que os homens são melhores líderes e merecem mais do que as mulheres para serem eleitos.
Além disso, a persistência da violência de género na esfera política "impede que mulheres e meninas aspirem a papéis de liderança e exerçam sua voz no domínio público".
Neste contexto, o relatório recomenda novas políticas públicas para proteger a integridade física das mulheres; promover sua emancipação económica; e promover a sua voz, liderança e ação na política.
Sugere ainda cinco formas de integrar mais plenamente a igualdade de género nas estratégias de desenvolvimento.
"Atualizar e eliminar as disposições legais discriminatórias e alinhar o quadro legislativo com as convenções internacionais e regionais; incorporar uma perspetiva de género em todos os ministérios e setores do governo, inclusive por meio de orçamentos com perspetiva de género", nomeadamente.
As restantes três são o apoio a "intervenções destinadas a mudanças positivas de comportamento, em particular envolvendo homens e meninos, bem como líderes comunitários influentes; fortalecer os esforços de paz e segurança de uma perspetiva de género por meio da aplicação efetiva da resolução 1325 do Conselho de Segurança das Nações Unidas, e investir mais em dados desagregados por sexo e interseccionalidade, para identificar lacunas nos dados de género e compreender melhor as normas sociais em evolução, para uma ação pública mais eficaz".
O relatório África 2021 incorpora os resultados de seminários e encontros de trabalho de alto nível sobre políticas públicas conduzidos em 2021 nas sub-regiões ocidental, oriental e austral.
Foram organizados pelo Centro de Desenvolvimento da OCDE em parceria com o Sahel and West Africa Club (SWAC), o Banco Africano de Desenvolvimento (AfDB) e a Comissão Económica das Nações Unidas para a África (CEA).