Israel "ocultou verdade" sobre repressão aos protestos palestinianos de 2018, diz ONG
Israel "ocultou a verdade" e não tomou medidas contra "responsáveis pela política ilegal de fogo real" que provocou mais de 200 mortos palestinianos nos protestos na fronteira de Gaza em 2018, denunciaram hoje organizações de direitos humanos.
O Exército e as autoridades israelitas não promoveram uma investigação efetiva e exaustiva dos factos, onde se incluem as ações dos militares nos protestos da Grande Marcha do Regresso em 2018, quando os palestinianos da Faixa de Gaza se manifestaram semanalmente junto à barreira divisória com Israel para exigir o fim do bloqueio ao enclave, indicam num relatório a organização não governamental (ONG) israelita B'Tselem e o Centro Palestiniano de Direitos Humanos (CPDH).
Nesses protestos de 2018 foram mortos mais de 200 manifestantes e cerca de 13.500 ficaram feridos, incluindo 155 pessoas que sofreram amputações.
As investigações de Israel sobre estes acontecimentos não passaram "de uma cortina de fumo" para "proteger funcionários responsáveis" de um processo perante o Tribunal Penal Internacional (TPI), que em 2021 iniciou investigações sobre alegados crimes de guerra e contra a humanidade cometidos pelo Exército israelita, o Hamas e outros grupos armados palestinianos desde junho de 2014, assinalam as ONG.
A repressão aos protestos da Grande Marcha do Regresso está incluída nas investigações do TPI.
Inicialmente, Israel "apressou-se a anunciar que iria investigar" as atuações das suas forças miliares durante a mobilização palestiniana "devido ao procedimento em curso no TPI", indica o relatório, denunciando que, no entanto, as medidas tomadas pelo Estado hebreu não foram efetivas nem cumpriram os requisitos exigidos.
Segundo a B'Tselem e o CPDH, tratou-se apenas de um processo "em que os militares se investigavam a si próprios, sem examinar as normas ilegais de fogo real transmitidas às forças de segurança".
As duas organizações também asseguram que as investigações "apenas se centraram nos soldados de menor patente", excluindo os responsáveis políticos e militares, e que não foram investigados os "milhares de incidentes" que provocaram feridos entre os palestinianos.
O Exército israelita já reagiu, indicando que "quase todos os anos as tropas enfrentam distúrbios massivos e violência", além de "atividades terroristas hostis", que incluem "disparos de francoatiradores".
"Descrever os distúrbios violentos como protestos civis é completamente falso", consideraram os responsáveis pelas Forças Armadas, argumentando que foram tomadas "as medidas necessárias para neutralizar o perigo que representavam" os manifestantes "para civis e soldados" israelitas.
"A decisão de abrir fogo foi emitida por altos comandos no terreno, baseando-se na sua avaliação profissional sobre o risco que representavam os desordeiros", alega o Exército.
Segundo os dados fornecidos pelas Forças Armadas ao B'Tselem, os militares analisaram os casos de 134 palestinianos mortos, num total de 234 vítimas mortais durante os protestos, tendo o corpo de advocacia geral militar ordenado a investigação de 36 casos.
Até ao momento, a investigação militar apenas resultou na condenação de um soldado envolvido na morte de um jovem palestiniano de 14 anos. O soldado foi declarado culpado por uma falta disciplinar menor, condenado a um mês de serviço militar comunitário, sem ser acusado diretamente de ter matado o menor.
Perante estas decisões, o B'Tselem e o CPDH concluem que "Israel não quer nem pode investigar os abusos contra os direitos humanos" nos protestos de Gaza, pelo que "a responsabilidade de garantir a prestação de contas por estas violações recai sobre o TPI".
"Os responsáveis por delinear a política de fogo real e a sua aplicação são os funcionários governamentais, o procurador-geral, os juízes do Supremo Tribunal e altos cargos militares" israelitas, concluem as duas ONG no seu relatório.