"Governabilidade será difícil" no Chile após eleições
O Chile deverá entrar num período de "governabilidade difícil" após as eleições presidenciais, com riscos para o processo de revisão constitucional, de acordo com a Economist Intelligence Unit (EIU).
"A governabilidade será difícil, independentemente de quem vença a segunda volta [das eleições presidenciais], devido à composição do Congresso, que está bastante dividido entre partidos de esquerda e direita", refere a EIU em análise hoje divulgada.
Nas presidenciais de domingo os chilenos concentraram os votos no ultra-direitista José Antonio Kast e no candidato das esquerdas Gabriel Boric, que garantiram uma confortável vantagem face aos restantes cinco concorrentes, mas sem nenhum a conseguir obter os 50% necessários para evitar uma segunda volta, prevista para 19 de dezembro.
O desempenho dos candidatos de centro-direita foi melhor do que o esperado, o que sugere uma vantagem de Kast face ao esquerdista Boric, na segunda volta.
Para a EIU, "nem Boric nem Kast terão maioria", o que "provavelmente levará a um impasse legislativo em muitas áreas".
O resultado eleitoral, adianta, terá implicações particularmente importantes para o processo de reforma constitucional naquele país, sendo que Kast se opõe à revisão da Constituição.
José Antonio Kast, com 27,9%, e Gabriel Boric, com 25,8%, foram os dois candidatos mais votados nas eleições do passado domingo, seguidos por um 'outsider', o populista de centro-direita Partido de la Gente, Franco Parisi, e o da coligação de centro-direita Chile Podemos, Sebastián Sichel, com 12,8% dos votos cada.
Ao contrário das eleições recentes no país da América do Sul, a direita registou um desempenho acima do esperado, com os três candidatos - Kast, Parisi e Sichel - a registaram 53,3% dos votos.
Esta votação reflete em parte as campanhas centradas no risco de um regresso à política da extrema-esquerda, através da coligação eleitoral Apruebo Dignidad, de Gabriel Boric, de acordo com a EIU.
As sondagens pré-eleitorais, para uma segunda volta nas presidenciais entre Boric e Kast, davam uma vantagem ao candidato de esquerda, mas o recente aumento de popularidade dos candidatos de direita deixa um bom presságio para o candidato da coligação Frente Social Cristiano.
Como entrave, analisa o EIU, José Antonio Kast tem de conquistar o eleitorado que votou em Parisí ou Sichel, que não pertencem à extrema-direita, não havendo garantia de que os votos do centro-direita mudem automaticamente para aquele candidato.
Kast, ex-deputado e advogado de 55 anos e que em diversas ocasiões defendeu a ditadura de Augusto Pinochet (1973-1990), alcançou 27,94% dos votos, enquanto Boric, um deputado de 35 anos e apoiado por uma formação de esquerda e pelo Partido Comunista, obteve 25,69%.
Caso a revisão constitucional seja aprovada por referendo em 2022, Kast poderá bloquear o processo, potencialmente criando um ambiente pós-eleitoral agitado.
O Chile também elegeu no domingo 27 novos senadores para renovar a câmara alta (Senado), que a partir de 2022 terá 50 lugares, além dos 155 membros da Câmara de deputados (câmara baixa).
Os resultados da primeira volta parecem indicar que em nenhuma das câmaras haverá uma maioria clara, com os grupos de direita e de esquerda forçados a articular apoios.
Os resultados demonstraram ainda assim a fragmentação e polarização da política chilena, na sequência do colapso de duas coligações de centro-esquerda e centro direita que dominaram o poder durante décadas após a ditadura.
Mais de metade dos eleitores inscritos para as eleições presidenciais de domingo no Chile não exerceu o direito de voto, indicou na segunda-feira o Serviço eleitoral do país, que registou 7.115.590 pessoas nas assembleias de voto (47,6% dos eleitores inscritos).
A baixa participação tornou-se crónica no Chile desde que em 2012 foi implementado o sufrágio voluntário e a partir de então apenas o plebiscito de outubro de 2020, que por larga maioria decidiu abolir a Constituição proveniente do regime ditatorial de Pinochet, superou os 50% de votantes.
Em junho, quando se realizaram as primeiras eleições regionais da história do país, foi registada uma taxa de participação de 19,6%, a mais baixa desde o regresso do Chile à democracia parlamentar em 1990.