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Sector das tecnologias da informação começa a sentir "pressão" na procura de trabalhadores

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A falta de recursos humanos não é atualmente um problema no setor das tecnologias da informação, mas a associação setorial nota que a "pressão do lado da procura" está a motivar uma grande transferência de trabalhadores entre empresas.

"A nível dos nossos associados tem havido uma grande transferência entre os 'players'. Basicamente, há uma pressão do lado da procura que faz com que muitos jovens, principalmente aqueles que têm menos anos de casa e, portanto, têm salários mais baixos, mudem com alguma facilidade, nomeadamente para os 'players' internacionais", disse à agência Lusa o presidente da Associação Nacional de Empresas de Tecnologia de Informação e Eletrónica (ANETIE).

Conforme nota José Pedro Salas Pires, as empresas internacionais "trazem algumas vantagens" face às nacionais, "como o facto de darem alguma perspetiva de carreira internacional e terem um 'branding' e uma comunicação de marca mais forte".

Por outro lado, "estão habituadas a pagar ordenados em França, Alemanha e outras geografias europeias", pelo que, para elas, "Portugal é um país com mão de obra qualificada e de relativamente baixo custo".

"Essa é a diferença em relação a outros setores como o calçado ou o turismo, que não têm recursos [humanos]. Nós temos recursos, mas tem havido uma grande pressão e, portanto, estão a aumentar os preços e há uma grande transferência entre as empresas de TI [tecnologias de informação]", explicou.

De acordo com a ANETIE, a instalação em Portugal de centros de competências de grandes marcas, como a Deloitte, HP, Cisco, Microsoft ou Google, assim como de vários bancos, "faz com que haja muitos recursos que transitam entre empresas, à procura de ganhar mais e de ter uma melhor experiência profissional".

Paralelamente, José Pedro Salas Pires dá conta de "um outro movimento" em curso em Portugal -- "e que tem a ver com a retoma" -- de consolidação do setor: "Há uma data de empresas portuguesas que foram compradas por empresas estrangeiras, sobretudo francesas e alemãs, ou seja, há uma espécie de consolidação pela via da aquisição. Não se cresce organicamente, mas cresce-se por aquisição. E isso é uma forma de comprar recursos", explicou.

O presidente da ANETIE refere ainda o facto de os sistemas de informação serem "transversais a todas as áreas económicas", o que gera necessidades quer na indústria, quer na agricultura, banca, sistemas financeiros ou saúde.

"E -- salienta -- aí sim, as empresas estão com dificuldade em recrutar e o que estão a fazer é subcontratar outras empresas, porque não conseguem ser suficientemente atrativas para ir buscar recursos na área dos sistemas de informação".

A exceção apontada pela associação são as empresas 'fintech' (empresas tecnológicas do setor financeiro), como a SIBS, "que estão a desenvolver produtos mais avançados, já mais fora do tradicional".

"Agora, se for perguntar à CGD ou ao BCP, têm tudo o que é sistemas de informação em 'outsourcing'", disse.

De acordo com José Pedro Salas Pires, a transferência de trabalhadores a que se vem assistindo entre as empresas do setor das TI "tem sido suficiente para responder às necessidades de recursos humanos", mas é provável que "não vá continuar assim".

"Vemos tanta propaganda de que somos muito bons e muito baratos, que já se está a sentir a pressão sobre esses recursos (daí o aumento do valor de cada um deles) e as faculdades não estão a formar pessoas suficientes a nível dos sistemas de informação", considerou.

O líder associativo diz que "o que vale" é que este 'gap' tem sido colmatado por alguns projetos que, em poucos meses, "estão a ensinar jovens sem licenciatura ou mestrado em sistemas de informação ou em tecnologias de informação, mas com alguma formação, a tornarem-se programadores nas linguagens mais procuradas, nomeadamente para desenvolver aplicações para androids, ios ou aplicações mais 'web oriented'".

"Por enquanto, isso tem ajudado a colmatar a falta de recursos universitários", acrescentou.

Embora considere que "não é por causa da falta de recursos humanos que Portugal não vai fazer a transformação digital", Salas Pires avisa que é preciso preparar com "muito cuidado" o futuro.

"Temos de ter muito cuidado, porque uma das coisas que se tem verificado é que muitos destes jovens facilmente -- e mais ainda agora, com o teletrabalho -- encontram emprego num país da Comunidade Europeia, a ganhar o dobro ou triplo do que ganham em Portugal. Portanto [a falta de trabalhadores nas TI] pode vir a ser um problema", alerta.

O presidente da ANETIE recorda que a emigração de recursos altamente qualificados e especializados "aconteceu muito a seguir aos anos 2008, 2009 e 2010", tendo, entretanto, abrandado "um bocadinho, com o efeito Web Summit e a criação de centros de competências de empresas internacionais como a Google, Cisco ou Deloitte, que permitiram reter jovens em Portugal".

Contudo, nota, isto acabou por criar a tal "pressão sobre os outros setores de atividade", porque "as pessoas preferem ir trabalhar para a Deloitte ou para a Google do que, por exemplo, para a Vista Alegre e, ainda menos, para as pequenas e médias empresas".