Exposição demonstra como visão da Europa exige confronto com colonialismo, ditadura e genocídio
A memória da Europa e o "mito do europeísmo" são mote para uma exposição, a inaugurar no próximo dia 17, no Arquivo Nacional da Torre do Tombo (ANTT), em Lisboa.
"Uma visão abrangente da Europa exige que nos confrontemos com uma história de colonialismo, ditadura, exclusão e genocídios", salienta o ANTT, numa perspetiva de atualidade, no comunicado enviado à agência Lusa.
Neste sentido, o ANTT argumenta que se "deve reconhecer as vozes minoritárias e o seu ponto de vista a partir da Europa, juntamente com a contribuição de não-europeus".
"Desta forma, podemos compreender a diversidade como a base da unidade europeia", atesta.
Intitulada "A Construção da Europa: História, Memória e Mito do Europeísmo ao longo de 1.000 anos", a exposição "conta a história da Europa e da sua construção como um conceito que mudou ao longo do tempo", e "questiona sobre a possibilidade de criar uma perspetiva comum a partir da qual a história europeia possa ser entendida como uma história partilhada por todos os seus habitantes".
Da exposição constam documentos do acervo do ANTT, como a "Bíblia dos Jerónimos" (1495), "um dos tesouros mundiais da iluminura", o Alvará, com força de lei, do rei José I, proibindo o transporte de escravos negros de ambos os sexos, dos portos da América, África e Ásia para Portugal (1761) e a Carta de lei de abolição da pena de morte em Portugal (1867), classificada como "Marca do Património Europeu".
A mostra inclui também documentos de arquivos estrangeiros como a Licença para imprimir a obra "D. Quixote", de Miguel de Cervantes (1604), proveniente do Arquivo Histórico de Espanha, e fotografias da exploração polar de Fridtjof Nansen, pioneiro na exploração polar (1894), da Biblioteca Nacional da Noruega. Dos Arquivos Nacionais deste país estão ainda patentes o Decreto sobre a caça às bruxas (1617) e o Direito de voto para as mulheres (1902).
Os documentos expostos "foram selecionados e organizados pelos técnicos dos arquivos dos países europeus que participam no projeto, de acordo com os aspetos e temas que consideraram mais importantes".
Segundo o ANTT, "uma obra coletiva deste tipo pode dar uma ideia do que os europeus, desta vez arquivistas e historiadores, podem pensar em conjunto sobre o europeísmo".
"Os documentos selecionados não só testemunham a história da Europa, mas também, esperemos, proporcionam ao visitante da exposição ou ao leitor do catálogo uma oportunidade para criar a sua própria imagem da Europa", afirma a mesma fonte.
De fora de Portugal estarão também expostas as miniaturas medievais do manuscrito "Beatus de Tábara" (968-970), provenientes do Arquivo Histórico de Espanha, e abolição da tortura no Império dos Habsburgos (1776), do Arquivo Nacional da Hungria.
De Portugal de destacar ainda o manuscrito "Apocalipse do Lorvão" (1189), classificado como património mundial, pela organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO), e os fragmentos das Cantigas de D. Dinis (1280-1320).
A exposição assenta em documentos agrupados em quatro "pilares", examinando a história comum da Europa sob os seguintes aspetos: "o Espírito da Europa", "a diversidade da Europa", "as Múltiplas Faces do Cristianismo" e "o Património do Iluminismo", refletindo a herança intelectual que a Europa representa, em escritos, obras de vida e tendências na ciência, na educação e nas artes, "e os seus efeitos intelectuais que vão para além das épocas históricas".
"A Europa é história, tradição, uma memória coletiva", sublinha o ANTT acrescentando: "Esta exposição pretende mostrar uma construção do europeísmo por forma a que hoje qualquer pessoa -- independentemente do nascimento, origem, nacionalidade, religião -- se possa identificar com ela, assumindo-a e considerando também as suas próprias identidades como parte dela".