Análise

Traídos pela pressa

Eleições “o quanto antes” apanham PSD, CDS e PS-M desprevenidos

Por razões alegadamente orçamentais, os políticos apressados tudo fizeram para provocar eleições antecipadas, o que não deixa de ser intrigante, sobretudo nos casos em que não há rumo, estratégia e liderança indiscutível. Porventura, devem acreditar em milagres, ou então em magia, os que anseiam por legislativas “o quanto antes”, mesmo que não disfarcem o incómodo por terem sido apanhados desprevenidos. As atitudes precipitadas na ressaca das Autárquicas, e por estas embaladas, têm sido constantes e a vários níveis. No poder regional coligado levaram à demissão inexplicável da secretária regional da Inclusão, com base nos excelentes resultados obtidos nos bairros sociais e no abrandamento dos números do desemprego; a incoerências diversas na gestão do alívio pandémico; e à notória descoordenação política que provocou discórdia entre governantes, apesar do esforço em atenuar estragos nas jornadas parlamentares motivadas pela ‘bazuca’ e que juntaram PSD e CDS. Na oposição, deixaram um PS-M órfão e adiado, sem gestor legitimado dos lugares que importa atribuir em breve, mesmo que Paulo Cafôfo tenha reaparecido em plena crise a assinar um comunicado na qualidade de presidente socialista.

A este desvario juntaram-se vários equívocos. Há um em destaque que é eloquente. Na sexta-feira, Miguel Albuquerque considerou fundamental a realização de eleições antecipadas, na sequência do ‘chumbo’ do Orçamento do Estado para 2022, antecipando que PSD e CDS devem constituir-se como alternativa ao actual governo socialista, devendo “apresentar, sem medo, o que querem para o futuro do país”.

Nesse mesmo dia, já noite fora, o que vemos? O medo instalado. O presidente do PSD pede ao partido que “pondere se vale a pena ir para uma disputa interna”, e “desatar aos tiros uns aos outros” quando o PS já está em campanha para as legislativas. “Durante todo o mês de novembro e o início de dezembro quem é o meu adversário, Paulo Rangel ou António Costa?”, questionou. As eleições directas estão marcadas para 4 de Dezembro.

No CDS, o mesmo filme de terror de agarrados às máquinas, se bem que agravado com convocatórias ilegais e com a desfiliação de um notável. O Conselho Nacional aprovou o adiamento do congresso, que estava marcado para 27 e 28 Novembro. Só vai ocorrer depois das eleições legislativas pois “este não é o tempo adequado para o debate interno”. Ou seja, cabe a Francisco Rodrigues dos Santos – cujo mandato termina em Janeiro - escolher candidatos, mesmo que depois o partido passe a ser liderado por Nuno Melo.

No meio da tormenta, ao sentir que o partido em que se filiou há 25 anos deixou de existir, sobra a lucidez de Adolfo Mesquita Nunes, lamentando que o CDS tenha desistido “de discutir e decidir em Congresso com que liderança e com que estratégia deve enfrentar as próximas eleições legislativas”, o que na sua óptica “é apenas a confirmação de que o partido deixou de existir, com pensamento e estratégia autónoma, aceitando com entusiasmo o caminho para a nossa irrelevância, dependendo da bondade e caridade de terceiros”.

Que alternativa é esta habitada por gente traída pela própria agenda?