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Um café bem forte, por favor

Os números globais demonstram-nos que, sem dúvida alguma, o CDS/PP salvou o PSD-Madeira de uma derrota nestas últimas eleições no Funchal

Saber da verdade é como tomar um café bem forte. Uns gostam. Outros detestam. O gosto é amargo, mas faz acordar.

As eleições autárquicas do passado dia 26 de setembro foram as primeiras a ocorrer na Madeira após o acordo político de coligação do PSD-Madeira com o CDS/PP. Estes resultados dão-nos informações preciosas sobre o atual panorama político e exige de quem tem responsabilidades políticas uma análise pormenorizada e lúcida.

O PSD-Madeira cantou vitória e tem toda a legitimidade para o fazer. A estratégia de união com o CDS/PP resultou. Esta união deu-lhe maiores probabilidades de ganhar as eleições e, após os resultados, há sempre que felicitar os vencedores e respeitar todos os candidatos de todas as candidaturas. Deram a cara pelo projeto que acreditavam e exerceram plenamente a sua cidadania, dando o seu contributo para a democracia.

A máquina propagandista do PSD-Madeira faz crer que recuperaram eleitorado. Mas será que é assim?

É ingenuidade a mais pensarmos que um resultado depende exclusivamente do capital político do cabeça de lista. Ainda esta semana um amigo sabiamente comentava-me que para ganhar eleições era preciso saber onde estão as ovelhas do rebanho e contar as ovelhas que temos.

Analisando os resultados eleitorais, é mais do que evidente que a vitória na Câmara Municipal do Funchal e na Assembleia Municipal deveu-se sobretudo à aliança do PSD-Madeira ao CDS/PP. Sem esta aliança, provavelmente a coligação “Confiança” teria ganho a Câmara Municipal do Funchal.

E ao analisar os resultados nas diversas freguesias do Funchal, constatamos novamente que, sem esta aliança, a coligação “Funchal Sempre à Frente” provavelmente não teria ganho as freguesias de São Gonçalo, São Pedro e Imaculado Coração de Maria.

Em quase todas as freguesias do concelho do Funchal, a coligação “Confiança” melhorou o seu resultado eleitoral. São Martinho é um caso curioso de perda de 876 votos. E as freguesias do Imaculado Coração de Maria e de Santa Maria Maior tiveram uma ligeira redução de votantes na “Confiança”, sendo que o resultado em Santa Maria Maior da coligação “Funchal Sempre à Frente” ficou aquém da votação dos votos somados do PSD-Madeira juntamente com o CDS/PP de 2017. Só quem vive em Santa Maria Maior consegue perceber a razão.

Os números globais demonstram-nos que, sem dúvida alguma, o CDS/PP salvou o PSD-Madeira de uma derrota nestas últimas eleições no Funchal, cidade que detém 40% da população madeirense. E sozinho, no contexto político atual, analisando atentamente os votos, o PSD-Madeira muito dificilmente teria conseguido conquistar o que conseguiu. Curiosamente, o CDS/PP apenas teve direito a um candidato a Presidente de Junta de Freguesia – do Imaculado Coração de Maria.

Confesso que me tem surpreendido o comportamento do CDS/PP. Esperava maior aproveitamento político porque, na verdade, o que os números dizem é que a chave da governação está nas mãos do CDS/PP. Sem a intervenção deste partido, o cenário político regional mudaria completamente. Saber aproveitar esta posição dominante para fazer a diferença poderá ser deveras interessante para todos nós.

Dividir para reinar é uma estratégia milenar de conquista de poder. E é para mim por mais evidente que uma oposição fraca e desorientada poderá fazer com que o CDS/PP perca esta posição dominante e, eventualmente, possa ser descartável já para as próximas eleições regionais de 2023.

Um equilíbrio de forças é sempre salutar em democracia. Uma oposição forte evita despotismo e abusos de poder. Contudo, para manter o equilíbrio das forças políticas tão necessário para a saúde democrática será necessário todos tirarem ilações e ensinamentos desta campanha e estabelecimento de estratégias para o futuro.

Recomendo, por isso, um café bem forte para alguns acordarem. O mundo é dos espertos e camarão que dorme a onda leva.

O povo é sempre soberano nas suas decisões. E, por respeitar sempre os resultados das eleições, censuro publicamente todos os comentários menos próprios de acusação de ingratidão à população pela alternância política ocorrida na cidade do Funchal. A diferença faz-se também pelas atitudes que adotamos perante as adversidades. Respeitar os resultados eleitorais e a decisão da população é uma regra democrática que se exige respeitar.

Quem tem olhos que veja. O panorama político alterou-se. Quem não ver, arrisca-se a morrer na praia.