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A soberania de menos de metade do Povo

Tenho a certeza que a maioria que não foi votar acreditava que nada mudasse

Passada que está mais uma campanha eleitoral, onde metade do povo não foi votar, é tempo de refletir sobre as razões que levam a que isto aconteça. Andei por muito lado. Falei com muita gente. Escutei argumentos para a falta de vontade de votar, alguns que me fazem pensar muito e que gostaria de partilhar convosco neste artigo de opinião.

Durante o período de pré-campanha, e mesmo de campanha eleitoral, o que mais ouvi é que todos pareciam a mesma coisa. Até as cores se confundiam. Todo o discurso era fechado para quem percebia de política ou estava por dentro das campanhas. Muitas vezes, as ações eram sempre com as mesmas pessoas, não alargando a outras, ou por inércia, ou por pensarem que toda a gente percebia o que estava em causa nestas eleições.

Algumas pessoas diziam: são todos iguais e no poleiro são a mesma coisa. Não se consegue distinguir uns dos outros. Brigam apenas entre eles porque querem é ser eleitos para depois fazerem a mesma coisa.

Quando colocava argumentos sérios que distinguiam as campanhas e, sobretudo, os programas eleitorais, chegava à conclusão que a esmagadora maioria não lia os programas, via televisão e acompanhava as redes sociais, e, algumas, poucas, seguiam os jornais. As pessoas pediam mais esclarecimento. Mais debate sério entre os principais candidatos. Mais clareza sobre o que os separava e sobre o que fariam de diferente se ganhassem.

Tentando dar o meu pequeno contributo, decorei os programas e tentava esclarecer mas, muitas vezes, também me sentia perdida, quando verificava que, para muitas pessoas, os e as candidatas, se não eram pessoas conhecidas estavam logo em posição de rebaixamento, porque ainda não tinham dado provas de nada. Quando respondia que os mais conhecidos tinham provas de terem deixado a Câmara endividada e uma extensa lista de carência de habitação social, que nunca deram apoios sociais como aconteceram nos últimos oito anos, etc., muita gente aceitava que era verdade, mas que iria contar muito se ganhasse um candidato que teria o apoio financeiro do governo regional, e estes não tiveram porque não foram capazes de negociar.

Quando a argumentação ia para a esfera pessoal e política, de autêntico boicote que foi feito na recusa do governo aos contratos programa com a Câmara que, agora, com toda a certeza, serão feitos por pertencerem todos ao mesmo “clube”, as pessoas respondiam: ”Mais vale um na mão do que dois a voar”. Contra esta argumentação, sentia que a luta que estava a ser travada era uma espécie de David contra Golias e que seria muito difícil vencer.

Tenho a certeza que a maioria que não foi votar acreditava que nada mudasse. Que o seu voto não contava para nada. Que não acreditava na democracia do voto. Que deixou andar e “o que vier para os outros virá para mim”. É a demissão completa do poder de decidir. É o desacreditar na democracia. Desacreditar nas candidaturas. Ninguém os conseguiu mobilizar. Ninguém foi capaz de perceber que esta gente precisava de ser picada, no bom sentido do termo, de forma a compreender que eram elas que decidiam o que estava em causa.

Preocupa-me muito esta demissão democrática mas, ao mesmo tempo, acho que muita coisa tem que mudar na forma de fazer política. Hoje vivemos novas realidades e as pessoas gostam de se sentir tratadas com inteligência e com o máximo de respeito. Gostam de perceber as diferenças entre os diferentes partidos para saberem o que farão de diferente, caso vençam as eleições ou sejam oposição.

Os resultados destas eleições são para serem respeitados sejam os que as ganharam sejam os que ficaram na oposição. Eu faço parte dos que vão estar atentos. Nunca me vou demitir do meu papel fiscalizador de quem votou por consciência e por convicção.