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Je suis meteorologista

Nunca pensei que houvesse tanta gente a perceber do tempo e que perdesse tanto tempo a olhar para o tempo. No dia 25 de Dezembro, fiquei cheia de medo que as televisões enfiassem nos aviões a caminho do grande temporal uma série de jornalistas, também eles especialistas, para verem a desgraça do norte da Madeira. Na mesma tarde, ainda o diretor do Observatório Meteorológico do Funchal, Vitor Prior não tinha acabado de trinchar o peru, já era trinchado nas redes sociais, a seco, sem molho nem recheio.

Tínhamos passado um ano inteiro a debater a Covid19, os especialistas em vírus apareceram de todos os lados, um parente disse-me mesmo, lá para Abril, que beber chá quente era bom para matar o desgraçado, sempre melhor que a lixívia do Trump.

Agora, desde o Natal passado, entretemo-nos a enfiar comentários nas redes sociais com sabor a trovoada, passo pelos grupos da especialidade, com meia dúzia de esforçados a acertarem mais do que as entidades oficiais no tempo e meia ilha a perder tempo a seguir os comentários dos profetas da desgraça que por lá passam. Quando se regista uma rajada de 98Km é uma festa. Depois, andam todos a ver o que se passa para as serras, os termómetros baixam aos 12oC e só vejo pessoas a lamentarem não ter chegado aos 9oC. Isso é que era.

Nos últimos tempos, conhecemos o Clemente, o Ernesto e a Filomena. Já sabemos que o maior perigo leva nome de mulher. Filomena tem ar de autoritária. Realmente, Ernesto faz lembrar coisas boas…

E andamos nisto. Como nos mandaram para casa em teletrabalho passamos os dias a trinchar o Prior e a caramelizar os pequenos dos grupos de meteorologia.

Tenho na bagageira do carro um casaco polar, uma gabardine, um impermeável, uma capa de chuva, um par de botas, dois de chinelos e um frasco de acetona, maravilhoso para tirar pequenos riscos. Também lá estão dois guarda-chuvas. Aprendi isso no 20 de Fevereiro, nunca se sabe quando vem a borrasca. Não sou meteorologista, mas lembro-me da minha avó Lígia ter algumas crenças sobre a lua quando vinha de barquinha, quando tinha o aro branco à volta e quando o joelho da minha avó Antoninha doía era sinal que vinha tempo frio. Nenhuma delas conheceu o Facebook, nem o Prior. Mas acertavam no tempo e não tinham tempo para essas coisas modernas dos modelos americano, europeu e do IPMA. O modelo que seguiam era o de olhar para o céu e ver se tinha nuvens. Se não tivesse, a roupa ia para o estendal, se tivesse, os vasos iam para locais onde apanhassem a chuva que não tardava a cair. De meteorologistas, tinham pouco. Mas a sabedoria que ganharam não as deixaria, hoje, correr para o Facebook antes de sair de casa, para saber se vinha aí desgraça. Ah, não veio, afinal passou a su-sudoeste.

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