Presságio
O ano de 2020 terminou e não deixa saudade. Desconhece-se, se nele se revelava algum presságio bom ou mau, e qual deles valia mais no viver da sociedade ou na humanidade. Certo é que não profere recomendações positivas nem augura para o ano que entra como substituto, um mundo de coisas optimistas. Em suma o ano que findou foi um desastre à semelhança de anos anteriores, em que os de sempre é que retiraram deles grandes lucros e chorudos benefícios. Os ricos mais enriqueceram, os pobres mais empobreceram. Lenga lenga real já sabida que faz doer, e que nada surpreende à excepção dos ingénuos e que por isso continuam a marcar passo sob o comando das vozes e leis dos mandantes que a tempo certo se sentam nos poleiros que são vários, e que dão para a suas famílias todas. Os trabalhadores vão continuar com os salários a que se habituaram a gerir ou espremer, outros nem isso. Os doentes vão continuar a esmolar misericórdia e uma cama mal apoiada nas pernas. Outros, os jovens vão afadigar-se em busca de emprego e os desempregados a tentar vias de sobrevivência, e até o crime pode estalar como castanhas podres. As famílias sentirão o desespero que não os largará e queixas reproduzirão, neste ano de 2021 que é a herança a que têm direito já promulgado e registado em Diário Oficial da democracia actual, que se aguenta sabe-se lá porquê. Mas num povo de cabeça baixa tudo é possível e aceitável. Talvez pela mesma razão que nos faz um povo miserável desde há séculos. Mas como diz o outro, cada povo tem aquilo que merece. Certo é que pelo país vai um choro fúnebre que faz criar bicho e hora de por os oficiais óculos escuros. Ora porque agora morreu um artista, ora um político que viveu da mama governamental, ora por coisa menor que não deixa saudade, excepto aos que à sombra dele tiravam proveito. Dos necessitados a sério é que ninguém quer saber e para esses nunca há dinheiro ou indemnização de jeito para os seus descendentes e viúva, que dinheiro e tribunais a esses não dá apoio nem beijinhos, quer o morto tenha morrido por causas, cujo apuramento nunca chega ao fim, e se chega, Seguradoras e Estado só têm uns míseros cêntimos para uma flor roxa. O velho de agora morre de bolso vazio e roto, e se não é de pandemia é de doença associada da qual já padecia, e assim as estatísticas vão-se equilibrando ou dentro do previsto. Somos um país com várias medidas e métodos de avaliação para casos com gravidade e drama igual. Concluímos assim que o ano que agora tem lugar em tudo quanto vai ser registo, calendário e agenda, mesmo exibindo na capa uma coelhinha da playboy, não nos dará nenhuma esperança de que em cada lar vazio de felicidade, maior folga à mesa e no emprego, há muito obrigado a salário de mendigo desde os nossos avós, irá alterar esta forma de vida, que continuará farta e bela, saudável e protegida de qualquer vírus. Infelizmente tenho a sensação que estou muito perto da verdade, enquanto os governantes vão escrevendo mais uns discursos para entreter o zé, antes e após qualquer funeral de um qualquer vilão que viveu de arranjinhos amigáveis e dos comparsas da seita que lhes cedem uma confortável cadeira, assim que o anterior partiu por causas indecifráveis. A conclusão última, é a de que se queres ser ouvido e falado, vivo ou morto, terás que pertencer a uma seita engravatada que dê espectáculo ou nele entre mesmo que não faças nada de jeito para a posteridade e muito paleio hábil. De pé apenas se manterá a suspeita de tanta solidariedade, como é sabido e prática deste “mui nobre, justo e leal país”. Mas disto Eduardo Lourenço saberia dizê-lo melhor que eu. Afinal o Filósofo era ele, embora esquecido rápidamente!
Joaquim A. Moura