A carismática Senhora União Europeia
Num tempo particularmente difícil que será certamente estudado e recordado por muitas e muitas décadas, em que um vírus democrático e transversal atacou o mundo por inteiro, a exigência e a capacidade de liderar assumem contornos absolutamente decisivos. E na verdade, quando olhamos aos nomes dos políticos que comandam as grandes nações que compõem a União Europeia, vemos pouco que nos descanse e muito menos que seja motivo de orgulho. É talvez por isso ( e porque somos saudosistas ), que passamos a vida a recordar os grandes estadistas que marcaram a criação e o desenvolvimento de uma Comunidade que começou no Carvão e no Aço logo após a Segunda Guerra Mundial e que deu origem à CEE que veio a desaguar no que temos hoje. Mas também os nomes que marcaram os seus Países, os Tratados mais marcantes ou esse passo transformador das nossas vidas que se chama Euro.
Sim, eu ainda sou do tempo em que passar cada fronteira era uma aventura, pela burocracia mas também pelos Escudos que tínhamos que ir trocar ao banco ou a uma casa de câmbios e que eram sempre desvalorizados perante moedas mais fortes. Esse tempo mudou e nos últimos anos assistimos a um definhar das instituições europeias, um aburguesamento nas práticas e uma depreciação da influência à escala mundial espartilhados pela Guerra dos Mundos, Estados Unidos vs China. Passámos a olhar mais para o vizinho do que para nós. A invejar o que os outros construíram e nós não. A medir forças quando a força deveria ser conjunta e que resvalou para a saída britânica da UE e alguns outros ameaços. Falta de pulso, de visão estratégica conjunta aceitando e respeitando as diferenças. Mas como em todas as estórias que marcam a história, emergiu, no meio dos escombros uma senhora de nome Ursula von der Leyen que demonstra querer devolver à União toda a sua razão de ser.
Esta semana de uma forma dura, objectiva e direta fez ver aos grandes laboratórios que os atrasos nas vacinas terão consequências e que a União Europeia terá mão firme se os compromissos não forem cumpridos. Explicou claramente que a Comissão apoiou com biliões de euros e que não admite nada menos do que o acordado, deixando no ar a hipótese das mesmas estarem a ser proteladas às custas da venda mais lucrativa em mercados paralelos. E para quem tem presente o provérbio “ não basta ser, é preciso parecer” neste caso a presidente alemã transmite uma força e uma credibilidade que há muito não se via por estas bandas. Quando a ouvimos temos a nítida sensação de que sente o que diz e que revirará o que for preciso para cumprir com o que se compromete. Isso, nos dias que correm é já um fator aglutinador, de diferenciação. Mas não é só. A agenda que traz consigo é poderosa e faz-nos acreditar na “concretização de uma mudança”.
A forma como fechou o caso Brexit evitando uma saída sem acordo ou a defesa feroz por um acordo histórico sobre o Next Generation EU que permite aos países um plano de recuperação e preparação para o futuro numa onda solidária sem paralelo mas também a forma como pretende gerir em conjunto o tema da migração, adotando uma abordagem mais humana e humanitária. A luta por cidades mais verdes e um ar mais limpo através de um ainda mais exigente Pacto Ecológico Europeu para construir um mundo melhor para viver, sem esquecer um novo projeto cultural para a Europa ( “A cultura é o fruto da associação de mentes brilhantes” )através do espaço Bauhaus, inspirado na escola artística criada há um século e que combinou forma e função. Com a promessa de ser um espaço de co-criação que reunirá arquitetos e artistas, engenheiros e designers, com o objetivo de associar estilo com sustentabilidade. A proposta para a uniformização de um salário mínimo europeu. O reforço da importância da transição digital e um olhar profundo para o reforço no domínio da Saúde ( com a criação de uma agência de investigação e desenvolvimento avançados no domínio biomédico ) fazem dela a esperança numa União mais solidária, forte e construtiva. Com todos e para todos. É nas alturas mais difíceis que emergem os grandes lideres. Aí está ela. A carismática Senhora União Europeia. Ursula von der Leyen.