A negociata da década
Tentaremos mais uma vez demonstrar a rede clientelar onde giram os membros do Governo
O ajuste direto para a exploração e gestão da Zona Franca da Madeira à SDM, publicado na Resolução n.º 46/2017 no JORAM, I série, n.º 25, de 6 de fevereiro de 2017, foi um atos ilegais mais graves cometidos pela governação regional, devidamente censurado pelo Tribunal de Contas em auditoria e alvo de um processo de infração da Comissão Europeia que levou a que o Governo Regional tivesse de tomar medidas drásticas, tomando conta da totalidade do capital dessa sociedade, que passa a ser 100% público.
As razões que levaram o Governo Regional a entregar sem qualquer contrapartida a concessão da Zona Franca a um grupo privado, é algo que o grupo parlamentar do PS Madeira quer ver respondidas em sede de Comissão de Inquérito Parlamentar que já tomou posse, e onde tentaremos mais uma vez demonstrar a rede clientelar onde giram os membros do Governo, e em que este favorecimento é mais uma peça do puzzle.
No Relatório n.º 11/2019-FS/SRMTC da Secção Regional da Madeira do Tribunal de Contas, resulta, entre outras conclusões, que, sem avaliação, ficaram recomendações para que, “no lançamento dos procedimentos destinados à atribuição de concessões acautele todos os aspetos e condições necessárias à normal execução dos contratos, evitando o aparecimento de factos supervenientes imputáveis à concedente que se traduzam em encargos públicos” e para que, “na atribuição de concessões respeite os princípios da concorrência, da igualdade de acesso, da transparência e da publicidade, de harmonia com os quadros legais aplicáveis”, sendo referido que a contratação da SDM para gerir a Zona Franca da Madeira está ferida de ilegalidade, por não observar a disciplina normativa do direito nacional e comunitário quanto às concessões de serviços públicos.
Em 8 de novembro de 2018, a Comissão Europeia, no “Parecer Fundamentado dirigido à República Portuguesa, em conformidade com o artigo 258.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, em razão do ajuste direto de contrato de concessão de serviços relativo à gestão e à exploração da Zona Franca da Madeira em violação das obrigações de publicidade e de abertura de concurso prévias previstas na Diretiva 2014/23/UE” considerou que: em relação à acusação relativa ao ajuste direto à SDM do contrato de concessão de serviços para a gestão e exploração da Zona Franca da Madeira os argumentos avançados pelas autoridades portuguesas para justificar o ajuste direto não são procedentes, mantendo, assim, a integralidade da acusação formulada na sua carta de notificação para cumprir” e “instou as autoridades portuguesas a tomarem as medidas necessárias para dar cumprimento ao presente parecer fundamentado no prazo de dois meses a contar da sua receção”.
A Vice-Presidência do Governo Regional, no dia 7 de setembro de 2018, adquiriu à Ernst & Young serviços de consultadoria à Região Autónoma da Madeira, na vertente tributária/económica, num processo desencadeado pela Comissão Europeia, pelo valor de € 100.000,00.
No dia 15 de maio de 2020, adquiriu à Pricewaterhousecoopers serviços de assessoria económico-financeira, no valor de € 20.000,00, cujos principais objetivos passam:
a) Pela realização dos estudos necessários à demonstração do interesse e viabilidade da aquisição de parte do capital social da Sociedade de Desenvolvimento da Madeira, SA, nos termos e para os efeitos previstos nos n.ºs 1 e 2 do artigo 46.º do DLR 13/2010/M, de 05/08/2010;
b) Confirmando-se o mencionado interesse, pelo desencadeamento da negociação com o atual acionista privado da SDM, visando a aquisição de parte do capital social.
Adquiriu igualmente vários serviços de assessoria jurídica à Sérvulo & Associados – Sociedade de Advogados, e sobre esta matéria especificamente:
1) No dia 14 de junho de 2019, pelo valor de € 75.000,00, elaboração de mapa de projeto ou roadmap para apresentação à Comissão Europeia, análise da viabilidade legal de lançamento de uma PPP para concessão e exploração da Zona Franca da Madeira e elaboração de estudos necessários à preparação do procedimento concursal;
2) No dia 29 de julho de 2020, pelo valor de € 27.000,00, estudos relacionados com a aquisição de capital da sociedade de desenvolvimento da madeira, SA, que é detida por privados e viabilidade da aquisição da totalidade.
Como sabemos, todo este processo veio resultar na compra da totalidade do capital da SDM por mais de 7 Milhões de Euros, depois dos anos em que o concessionário privado gozou de dezenas de milhões de euros de proveitos e lucros no seguimento do ajuste direto do Governo Regional.
A grande questão é: porquê?