Crónicas

Mais igualdade, melhor democracia

Neste congresso espero a reiteração do ADN do partido em que milito: um partido de e pelas pessoas. De uma ação política que aposta clara e inequivocamente em mais igualdade

Acordei tarde para a política partidária. Mas a política sempre me interessou e nunca tive a pretensão de não ser afetada pela política. Subscrevo Aristóteles quando defende que o ser humano «é, por natureza, um ser vivo político.» Porque somos e estamos em comunidade, cidadãos e cidadãs.

Mas em casa a política – ou melhor, o comentário político – nunca foi muito preponderante. Os meus pais sempre foram cumpridores e zelosos relativamente aos direitos e deveres conquistados. A minha mãe recorda as primeiras eleições livres como tendo sido um marco, a alegria e consciência das pessoas para a importância do ato. Nos primeiros anos, ainda recenseado no Continente, o meu pai chegou a viajar exclusivamente para cumprir o seu dever e exercer o direito de voto. Quem viveu numa realidade em que esse direito lhe foi negado tem respeito pelo dever conquistado. Mas, tirando isso, o comentário político sempre foi muito reservado na nossa casa, pelo menos na nossa presença. Hoje, penso que isso deu-me uma liberdade enorme para analisar e escolher sem grandes influências parentais. Coisa que o meu filho não terá, porque nos conhece política e partidariamente envolvidos, e será inevitável que as suas lentes também tenham uma parte das nossas. Apesar desta influência, terá absoluta liberdade para fazer as suas próprias escolhas e decidir sobre como deseja participar na sociedade.

Se despertei tarde (de acordo com alguns cânones) para a política partidária, essa decisão foi consciente, informada, imperativa até. Em termos de influência, a pessoa que mais me inspira é Maria de Lourdes Pintasilgo, uma mulher que nunca deixou de participar na e pela comunidade. Enquanto ativista integrou, desde muito jovem, vários movimentos nacionais e internacionais de cariz católico. Na política ativa, foi a primeira e única mulher a exercer o cargo de Primeira-Ministra em 1979, quando foi nomeada pelo então Presidente Ramalho Eanes, segundo ele «pela sua personalidade, ética e carácter», e foi a primeira mulher a candidatar-se à Presidência da República em 1986, nas primeiras – e muito disputadas – eleições em que os candidatos não eram militares.

Se comecei por expor as razões pelas quais estou na ação política é porque hoje inicia-se um dos momentos mais importantes da vida interna do partido em que milito. O XIX Congresso do PS-Madeira acontece após a eleição de Paulo Cafôfo para a Presidência do partido, e de Mafalda Gonçalves para as Mulheres Socialistas. Umas eleições muito participadas, apesar dos condicionalismos dos tempos difíceis que vivemos, o que espelha bem a vitalidade que atravessamos em termos partidários e que tenho a certeza que se refletirá no trabalho que será desenvolvido nos próximos anos. Creio que Paulo Cafôfo é a pessoa certa para liderar o partido e os desafios que se aproximam, e também creio que a Mafalda Gonçalves levará a bom porto a tarefa de liderar as Mulheres Socialistas da Madeira.

Enquanto militante, o que espero deste congresso?

Que seja um momento importante de trabalho reflexivo sobre o PS-Madeira. Que continuemos a trabalhar e a pensar o futuro que queremos para a Região. A moção global que será apresentada é uma moção de esperança, que traça desafios para o futuro – enormes, tendo em conta o impacto que a COVID e a crise que provocou terá no nosso tecido económico e que terá grande impacto social. Mas traça também objetivos e estratégias para superar os desafios.

O dinamismo do PS-Madeira neste congresso expressa-se também nas moções sectoriais. Para quem não sabe, as moções sectoriais podem ser propostas por qualquer pessoa que pertença ao congresso e por norma expressam visões sobre uma determinada área. Neste congresso serão submetidas a análise, discussão e votação, 10 moções sectoriais sobre diversas áreas: turismo, autarquias, juventude, fundos europeus, cultura e inclusão, Porto Santo, educação, relações externas. Assino a moção intitulada «Mais igualdade maior democracia» que defende mais investimento na igualdade, na coesão e na inclusão, para o PS, mas principalmente para a Região.

Sobre coesão, nem de propósito, esta semana ouvia o «Sinais», (programa diário com apenas um minuto), sobre os territórios deprimidos: «Ide para dentro e tomai alguma vergonha pela persistência de territórios deserdados.» Fernando Alves referia-se ao interior do território continental, mas a expressão também se aplica por cá, nos nossos territórios deprimidos em que as pessoas também poderiam dizer com toda a propriedade que só são iguais ao resto da Região quando se trata de pagar impostos. Tem sido, e deve continuar a ser um propósito do trabalho a desenvolver pelo PS-Madeira, pugnar pelo desenvolvimento de todos os nossos concelhos, propor formas de inovação e diversificação da matriz socioeconómica das diferentes Regiões, nomeadamente as que têm sido deixadas para trás.

Inclusão porque uma comunidade mais justa é uma comunidade que inclui. E nesse sentido, é importante que o PS continue a trabalhar por uma convivência intergrupal baseada no respeito pela diferença e no respeito pela outra pessoa, independentemente das suas características ou grupo de pertença. Mantermos a luta por direitos iguais ao lado dos grupos comunitários percecionados como minoritários ou pouco influentes e que por isso são, muitas das vezes, relegados para segundo plano: as comunidades migrantes, familiares e pessoas com deficiência, as crianças, a comunidade LGBTI+, as vítimas de violência doméstica, as pessoas em situação de sem-abrigo. Pugnar por direitos iguais não é exortar a uma igualdade cega, que não valoriza e não tem em conta as diferenças. Bem pelo contrário, o problema tem sido exatamente esse: punir e retirar direitos a quem não encaixa no modelo vigente do que é ser «gente». O objetivo é, citando Irene Ramalho, «uma igualdade que não descaracterize e uma diferença que não humilhe».

É nesse sentido que a moção também exorta ao investimento na educação – uma inclusiva, equitativa e de qualidade – na medida em que é o principal motor para o empoderamento das pessoas. Conhecimento é poder. Ao capacitarmos as pessoas estamos a investir no desenvolvimento social, económico e ambiental da Região, estamos a investir no progresso.

Neste congresso espero a reiteração do ADN do partido em que milito: um partido de e pelas pessoas. De uma ação política que aposta clara e inequivocamente em mais igualdade. Porque mais igualdade significará sempre melhor democracia. E melhor democracia significará melhor qualidade de vida para mais pessoas.

«Ligar a diferença e a igualdade está no âmago da própria democracia.»
Maria de Lourdes Pintasilgo (2005). Palavras dadas.

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