Artigos

Johnson contra Johnson

Um Brexit sem acordo foi o que Johnson sempre pretendeu, para dessa forma, conseguir total independência nas regras do jogo

Se alguma dúvida havia sobre a honradez e o respeito pela lei da classe política inglesa, essa dúvida foi completamente desfeita por Boris Johnson. O primeiro ministro do Reino Unido, criou um incidente internacional ao apresentar um projeto de lei para o mercado interno, que viola tanto o acordo de saída (Brexit), como o protocolo com a Irlanda do Norte. Note-se, que tanto o acordo de saída como a proposta de lei que o contraria, foram negociados e assinados por ele. É uma manobra política inqualificável, não só por violar um acordo importante assinado pelo próprio no início deste ano, mas por minar a confiança entre ele e os restantes líderes mundiais, numa altura em que qualquer fator de incerteza pode ter consequências muito negativas.

As reações foram rápidas. Dos Estados Unidos da América, já se fez saber que se a proposta de lei avançar, o Congresso não aprovará o tratado comercial que estão a negociar com Boris Johnson. A presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, também ameaçou com ações penais por violação dos direitos internacionais. Estas reações eram expectáveis, porque ao entrar em vigor, este projeto de lei prevê: a anulação da obrigação das empresas preencherem declarações de exportação de mercadorias que vão da Irlanda do Norte para a Grã-Bretanha; e acabaria com a necessidade de cumprimento das regras da União Europeia sobre ajudas estatais que poderiam afetar o comércio entre a Irlanda do Norte e a União Europeia. Foi justamente a questão dos auxílios estatais que fez com que falhasse a última ronda de negociações comerciais entre a União Europeia e o Reino Unido, o que demonstra a força do “loby Irlandês” na Europa e nos Estados Unidos.

As reações também fizeram-se sentir dentro do próprio partido do governo, levando a que 30 deputados tivessem apresentado uma emenda que impossibilitaria o governo anular o acordo de saída sem o apoio do parlamento. Na oposição, como seria de esperar, as reações foram mais que muitas, e todas consideraram se tratar de um golpe sujo para pressionar um acordo comercial básico, que acaba por ser um Brexit sem acordo. No fundo, um Brexit sem acordo foi o que Johnson sempre pretendeu, para dessa forma, conseguir total independência nas regras do jogo relativamente aos subsídios, e conseguir alavancar a indústria tecnológica, tornando-a na nova jóia da coroa da economia britânica. Com esta estratégia, o Reino Unido conseguiria uma situação de vantagem competitiva em relação à União Europeia, através da atribuição de incentivos capazes de atrair massa critica para o país.

Tendo em conta o track record das negociações na União Europeia, o resultado é fácil de prever. A União conseguirá um acordo de mínimos, como os acordos para o livre comércio da OMC, com cotas e tarifas nulas, para incluir uma qualquer formulação que garanta a paz irlandesa e a continuidade das negociações do acordo comercial entre o Reino Unido e os Estados Unidos. Assim todos beneficiam… com a honrosa exceção, claro está, da União Europeia.

Fechar Menu